USP - DH
http://www.direitoshumanos.usp.br/index.php/Direitos-Humanos-no-Brasil/plano-nacional-de-educacao-em-direitos-humanos-2003.html
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Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos - 2003
COMITÊ NACIONAL DE EDUCAÇÃO EM DIREITOS HUMANOS
Introdução
O debate sobre os direitos humanos e a formação para a cidadania no Brasil vem alcançando mais espaço e relevância a partir da Nova República, sob iniciativa da sociedade civil organizada e de proposições governamentais no campo das políticas públicas, visando ao fortalecimento da democracia. Esse movimento é referendado em instrumentos internacionais dos quais o Brasil é signatário, sob a inspiração da Declaração Universal de Direitos Humanos de 1948, bem como da Constituição Federal de 1988, que define o Brasil como um Estado Democrático de Direito, cujos fundamentos são a soberania, a cidadania, a dignidade da pessoa humana, os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa e o pluralismo político. Com o advento da atual Constituição Federal, novos documentos surgem no cenário nacional, como resultado da mobilização dos movimentos sociais, na perspectiva de impulsionar agendas, programas e projetos na materialização da defesa e promoção dos direitos humanos, a exemplo dos Programas Nacional, Estaduais e Municipais de Direitos Humanos, o Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA, as legislações de combate à discriminação racial e à tortura, bem como as recomendações das Conferências Nacionais de Direitos Humanos. No entanto, a despeito dessa mobilização e movimentação para a concretização do Estado Democrático de Direito, per- siste um distanciamento entre os marcos normativos e a realidade da maioria da população brasileira. O contexto nacional, historicamente, tem se caracterizado por desigualdades e pela exclusão econômica, social, racial e cultural, decorrentes de um modelo de Estado fundamentado na concepção neoliberal, no qual as políticas públicas priorizaram os direitos civis e políticos, em detrimento dos direitos econômicos, sociais e coletivos.
Essa realidade reflete uma enorme concentração de riqueza em que o Brasil apresenta-se, hoje, no quadro internacional, uma das maiores desigualdades de renda do mundo. Conseqüentemente, os avanços na área dos direitos humanos são muito tímidos, principalmente no que se refere aos direitos humanos, entendidos como os direitos de todo ser humano, sem distinção de raça, nacionalidade, etnia, gênero, classe social, cultura, religião, opção sexual, opção política, ou qualquer outra forma de discriminação. São os direitos decorrentes da dignidade do ser humano, abrangendo, dentre outros: os direitos à vida com qualidade, à saúde, à educação, à moradia, ao lazer, ao meio ambiente saudável, ao saneamento básico, à segurança, ao trabalho e à diversidade cultural.
Essa concepção de direitos humanos incorpora a compreensão de cidadania democrática, cidadania ativa e cidadania planetária, embasadas nos princípios da liberdade, da igualdade, da diversidade, e na universalidade, indivisibilidade e interdependência dos direitos. A democracia, ao ser entendida como regime alicerçado na soberania popular e no respeito integral aos direitos humanos, é fundamental para o reconhecimento, a ampliação e a concretização dos direitos. Nesse entendimento, o processo de construção da cidadania ativa requer, necessariamente, a formação de cidadãos conscientes dos seus direitos e deveres, e protagonistas da materialidade das normas e pactos que os regulamentam, englobando a solidariedade internacional e o compromisso com outros povos e nações. Nesse processo, a educação é tanto um direito humano em si mesmo, como um meio indispensável para realizar outros direitos, constituindo-se em um processo amplo que ocorre na sociedade. A educação ganha maior importância quando direcionada ao pleno desenvolvimento humano e às suas potencialidades e a elevação da auto-estima dos grupos so- cialmente excluídos, de modo a efetivar a cidadania plena para a construção de conhecimentos, no desenvolvimento de valores, crenças e atitudes em favor dos direitos humanos, na defesa do meio ambiente, dos outros seres vivos e da justiça social.
A educação, nessa perspectiva, contribui também para a criação de uma cultura universal dos direitos humanos direcionada:
• ao fortalecimento do respeito aos direitos e liberdades fundamentais do ser humano; • ao pleno desenvolvimento da personalidade humana e senso de dignidade; • à prática da tolerância, do respeito à diversidade de gênero e cultura, da amizade entre todas as nações, povos indígenas e grupos raciais, étnicos, religiosos e lingüísticos; • à possibilidade de todas as pessoas participarem efetivamente de uma sociedade livre. Esse direcionamento é referendado na Declaração Universal dos Direitos Humanos e no Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, ao afirmarem que toda pessoa tem direito à educação, orientada para o pleno desenvolvimento da personalidade humana, e fortalecimento do respeito aos direitos humanos e às liberdades fundamentais. No âmbito nacional, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação estabelece que educar em direitos humanos é fomentar uma prática educativa “inspirada nos princípios de liberdade e nos ideais de solidariedade humana, com a finalidade do pleno de- senvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho”. A partir desses pressupostos, o PNEDH foi concebido com o objetivo de contribuir para a vigência de um Estado Brasileiro realmente democrático, embasado em uma proposta de go- verno que prioriza as políticas públicas em busca da melhoria das condições de vida da população. O PNEDH, na condição de política pública, apresenta-se como um instrumento orientador e fomentador de ações educativas, no campo da educação formal e não-formal, nas esferas pública e privada. O PNEDH reflete as ações que estão em desenvolvimento no país, envolvendo iniciativas de instituições públicas, organizações da sociedade civil e contribuições recebidas por meio de consulta pública e das recomendações do documento da UNESCO que estabelece a Década das Nações Unidas para a Educação em Direitos Humanos e para uma Cultura de Paz (1995-2004). O Relatório Jacques Delors, da Comissão Internacional sobre Educação para o Século XXI (1996), considerando o papel fundamental da educação para os princípios da liberdade, da paz e da justiça social, estabelece sua presença ao longo da vida humana, de modo a contribuir para o enfrentamento dos riscos e desafios de um mundo em transformação. Esta proposta se consolida por meio do “aprender a conhecer”, “aprender a fazer”, “aprender a ser” e “aprender a viver juntos”, de modo a fomentar, com políticas educativas, um compromisso com a democracia e a cidadania, garantindo a participação ativa de cada um no projeto da sociedade em construção. Esta nova perspectiva educacional de interpretação dos fenômenos sociais, culturais e políticos proposta é um estímulo à configuração de sociedades democráticas abertas, pautadas em uma nova consciência capaz de compreender a condição do mundo humano, definindo novos caminhos para a construção da cidadania. Este processo resgata as duas esferas do ser humano: o conhecimento racional, empírico e técnico de um lado, e o simbólico, poético, mágico e mítico de outro. É no entrelaçamento destas duas dimensões que a educação para a cidadania encontra seu ancoradouro e sua potencialidade em relação ao futuro. Como estratégia de elaboração do PNEDH, foram criadas Comissões Temáticas formadas por integrantes do Comitê Nacional, incorporando novos atores e parceiros no sentido de enriquecer e contribuir com a sua elaboração, tornando-se estes agentes co-autores desse documento. As cinco Comissões Temáticas trataram dos seguintes assuntos:
• Educação Básica: Educação Infantil, Ensino Fundamental e Médio
• Ensino Superior
• Educação Não-Formal
• Educação dos Profissionais dos Sistemas de Justiça e Segurança
• Educação e Mídia
O presente documento é apresentado à sociedade brasileira e está aberto à participação das instituições públicas, privadas, organizações da sociedade civil e da população, com a expectativa de coletar novas proposições, sugestões e críticas que contribuam para enriquecê-lo, bem como para a sua implantação e implementação.
Esse esforço da Secretaria Especial dos Direitos Humanos, do Ministério da Educação e do Comitê Nacional de Educação em Direitos Humanos, para incorporar novos interlocutores durante todo o processo de elaboração do PNEDH, fundamenta-se no entendimento de que uma sociedade democrática exige a participação ativa dos seus cidadãos(ãs) na definição, elaboração, implementação e avaliação das políticas públicas. Na seqüência, o Plano apresenta seus objetivos gerais, os princípios orientadores das áreas temáticas e as linhas de ação a serem desenvolvidas, contendo os responsáveis, os parceiros e o público destinatário dessas ações.
Comitê Nacional de Educação em Direitos Humanos
OBJETIVOS GERAIS 1. Fortalecer o Estado Democrático de Direito. 2. Enfatizar o papel dos direitos humanos no desenvolvimento nacional. 3. Contribuir para a efetivação dos compromissos assumidos com relação à educação em direitos humanos no âmbito dos instrumentos e programas internacionais e nacionais. 4. Avançar nas ações e propostas do Programa Nacional deDireitos Humanos. 5. Orientar políticas educacionais direcionadas para o respeito aos direitos humanos. 6. Estabelecer concepções, objetivos, princípios e ações para a elaboração de programas e projetos na área de educação em direitos humanos. 7. Incentivar a criação e o fortalecimento de instituições e organizações nacionais, estaduais e municipais de direitoshumanos.
Linhas Gerais de Ação:
Educação Básica: Educação Infantil, Ensino Fundamental e Médio
A universalização da educação básica, com indicadores precisos de qualidade, é uma condição fundamental para o desenvolvimento de processos de democratização na sociedade.
As instituições de educação formal não são as únicas responsáveis pela formação para a cidadania e para a democracia; outros agentes e instituições sociais intervêm neste processo. No entanto, essas instituições têm uma responsabilidade específica na formação das pessoas, durante longos e importantes anos de suas vidas. A formação de personalidades e construção de saberes, valores, práticas e visões de mundo constituem um processo permanente. Constituem exigências fundamentais para a educação básica: favorecer desde a infância a formação de sujeitos de direito e priorizar pessoas e grupos excluídos, marginalizados e discriminados pela sociedade. É neste sentido que a educação em direitos humanos se situa, tendo como referenciais os seguintes princípios: • a educação básica, como um primeiro momento do processo educativo ao longo de toda a vida, é um direito social inalienável da pessoa humana e dos grupos sócio-culturais; • a educação básica exige a promoção de políticas públicas que garantam a sua qualidade; • a construção de uma cultura de direitos humanos é de especial importância em todos os espaços sociais. A escola tem um papel fundamental na construção dessa cultura, con- tribuindo na formação de sujeitos de direito, mentalidades e identidades individuais e coletivas; • a educação em direitos humanos, sobretudo no âmbito escolar, deve ser concebida de forma articulada ao combate do racismo, sexismo, discriminação social, cultural, religiosa e outras formas de discriminação presentes na sociedade brasileira; • a promoção da educação intercultural e de diálogo inter- religioso constitui componente inerente à educação em direitos humanos;
• a educação em direitos humanos deve ser um dos eixos norteadores da educação básica e permear todo o currículo, não devendo ser reduzida à disciplina ou à área curricular específica.
Linhas Gerais de Ação:
Ensino Superior
As universidades brasileiras exerceram na sua trajetória histórica importante papel educativo e político em prol da conquista da democracia. Esta participação foi concretizada no engajamento de ações junto às lutas sociais e de resistência cultural. Nas décadas de 1960 e 1970, elas congregaram es- forços pelo retorno das liberdades civis e políticas, sendo estas um dos espaços públicos que conviveu por muito tempo com processos de perseguição política de seus alunos, funcionários e docentes.
A conquista do Estado Democrático de Direito delineou para as universidades a co-responsabilidade com a construção de uma cultura de promoção, proteção e defesa dos direitos humanos, por meio de ações multi e interdisciplinares, envolvendo diferentes saberes, áreas e práticas. No que concerne à educação superior, sua missão é ofertar à sociedade uma reflexão relevante sobre a situação dos direitos humanos no país, incentivando e realizando debates capazes de garantir seu exercício e zelo. Entre as condições de implementação mais operativas que a universidade pode oferecer, está a formação de profissionais e acadêmicos sensibilizados para uma atuação cidadã, eticamente comprometida com o fortalecimen- to dos direitos e das liberdades fundamentais. Esta dimensão faz-se ainda mais crítica se considerarmos o contexto em que a universidade atua e que exibe os de- ploráveis índices de falta de acesso a direitos, característicos das sociedades do hemisfério sul. Neste sentido, qualquer formação universitária na graduação e na pós-graduação deve apresentar um perfil pedagógico que contemple uma postura democratizante e emancipadora. As atribuições constitucionais da universidade nas áreas de ensino, pesquisa e extensão delineiam sua missão de ordem educacional, social e institucional. A produção do conhecimento é o motor do desenvolvimento científico e tecnológico, e, também cabe à universidade um compromisso com o futuro da sociedade brasileira, tendo em vista a promoção do desenvolvimento, da justiça social, da democracia, da cidadania e da paz. Neste sentido, a contribuição do ensino superior na área da educação em direitos humanos implica a consideração dos seguintes princípios: • a universidade enquanto depositária e criadora de conhecimento é uma instituição social com vocação republicana, diferenciada e autônoma, comprometida com a democracia e com a cidadania; • o papel do ensino superior em uma sociedade pautada pela desigualdade e pela exclusão da maioria da população deve ser o de garantir um compromisso cívico e ético de contribuir para a implementação de políticas públicas voltadas para as suas necessidades básicas; • na área do ensino, as atividades acadêmicas devem estar vol- tadas para a formação de uma cultura nacional baseada nos direitos humanos como tema transversal, criando programas interdisciplinares específicos nos cursos de graduação e de pós- graduação; • ao nível da pesquisa, deve ser incentivada a criação de linhas interdisciplinares e interinstitucionais relacionadas ao tema dos direitos humanos, com apoio dos organismos de fomento; • no campo da extensão universitária, devem ser desenvolvidos programas para a formação de professores de diferentes redes de ensino, assim como demais agentes de educação em direitos humanos em nível local, regional e nacional, de modo a configurar uma cultura educativa nesta área.
Linhas Gerais de Ação:
Educação Não-Formal Todos os cidadãos estão em permanente processo de reflexão e aprendizado. Este ocorre durante toda a vida, pois a aqui- sição de conhecimento não acontece somente nas escolas e universidades, mas nos locais de trabalho, nas cidades, nos movimentos sociais, nas associações civis, nas organizações não-governamentais, dentre outros. A educação não-formal, enquanto modalidade de ensino/ aprendizagem implementada durante a trajetória de vida das pessoas, pode ser compreendida em seis dimensões: a qualificação dos indivíduos para o trabalho; a adoção e exercício de práticas voltadas para a comunidade; a aprendizagem política de direitos através da participação em grupos sociais; a educação realizada na e pela mídia; a aprendizagem de conteúdos da escolarização formal em modalidades e esferas diversificadas; e, finalmente, a educação para a vida, no sentido de garantir a qualidade de vida. Os espaços das atividades de educação não-formal distribuem-se em inúmeros campos, incluindo desde as ações das comunidades, dos movimentos e organizações sociais e políticas até as organizações não-governamentais e esferas da educação e da cultura. Podemos identificar duas esferas principais de desenvolvimento dessas atividades: a transmissão e construção do conhecimento em educação popular e o processo de participação em ações coletivas, tendo a cidadania como objetivo principal. Neste sentido, os movimentos sociais, entidades civis e partidos políticos praticam educação não-formal quando estimulam os grupos sociais a refletirem sobre as suas próprias condições de vida, os processos históricos onde estão inseridos e o papel que desempenham na sociedade contemporânea. Muitas práticas educativas não-formais enfatizam a reflexão e o conhecimento das pessoas sobre os direitos civis, políticos, econômicos, sociais e culturais. Também estimulam os grupos sociais e as comunidades a se organizarem e proporem a interlocução com as autoridades públicas, principalmente no que se refere ao encaminhamento das suas principais reivindicações e na formulação de propostas para as políticas públicas. Esta sensibilização e esta conscientização das pessoas parecem contribuir para que os conflitos interpessoais e cotidianos não progridam ou resultem em violências maiores. Além disso, eleva-se a capacidade das pessoas identificarem uma violação de direito e de recorrer à autoridade responsável pela sua reparação
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As experiências educativas não-formais estão sendo aperfeiçoadas conforme o contexto histórico e a realidade em que estão inseridas. Resultados mais recentes têm sido as alternativas para o avanço da democracia, a ampliação da participação política e popular e o processo de qualificação dos grupos sociais e comunidades para intervir na definição de políticas garantidoras da cidadania. Foi desenvolvida a noção de empoderamento dos grupos sociais, entendida como um conhecimento experimentado sobre os mecanismos que podem melhor defender e garantir os direitos humanos. Dentro desta perspectiva, cabe assinalar um conjunto de princípios que orientam as linhas de ação desta área temática: • a educação não-formal deve contribuir para a igualdade social, o desenvolvimento pessoal e favorecer melhor qualidade de vida e elevação da auto-estima dos grupos socialmente excluídos; • a educação não-formal deve se tornar um instrumento eficaz no processo de construção da democracia, da cidadania, da paz, do desenvolvimento e da justiça social, de modo a garantir a inclusão social e a dignidade humana; • os programas de educação não-formal devem possibilitar o respeito à igualdade e à diferença, fomentar valores éticos e cívicos, além de contribuir para o combate ao racismo, à discriminação, à intolerância e à xenofobia; • as estratégias e metodologias devem ser trabalhadas em uma perspectiva interdisciplinar e no confronto com a realidade, permitindo mudanças nas atitudes, valores e práticas dos participantes de programas de educação não-formal, de modo que estes possam adotar valores vinculados à solidariedade e ao respeito aos direitos humanos; • a educação não-formal em direitos humanos deve articular o conhecimento popular ao conhecimento acumulado historicamente pela humanidade.
Linhas Gerais de Ação:
Educação dos Profisionais dos Sistemas de Justiça e Segurança
O funcionamento do sistema de justiça e segurança voltado para a promoção e para o fortalecimento dos direitos humanos
é um dever do Estado Democrático de Direito. O Brasil apresenta altas taxas de criminalidade, sendo que os autores e vítimas, na sua maioria, são jovens, do sexo masculino, de cor negra ou parda e, pobres. As instituições públicas se mostram pouco eficientes para conter o crescimento dessa criminalidade, e se faz necessária e urgente uma política pública permanente com caráter preventivo e educativo no combate à violência e ao crime organizado. A certeza de que o crime vai ficar impune encoraja delinqüentes a continuarem na escalada da criminalidade. O crime dá prestígio, poder econômico e liderança aos criminosos. O sistema penal repressivo não tem sido capaz de inibir a ação cada vez mais organizada e audaciosa das organizações criminosas e o resultado tem sido o pior de todos, gerando um clima de insegurança generalizado na sociedade brasileira. As nossas polícias são ineficazes para o combate ao crime comum, despreparadas para enfrentar o crime organizado e são violentas, arbitrárias, incapazes de assegurar aos cidadãos seus direitos mais fundamentais. Ainda estamos longe de ver concretizada uma polícia técnica, investigativa e eficiente para combater a especialização crescente dos crimes. A justiça é lenta quando o tema é processar e julgar réus que possuem influência econômica ou política. A legislação penal brasileira é cheia de falhas e possibilita atos processuais que visam unicamente a demora injustificada dos processos criminais. Penas alternativas ou restritivas de direito e pecuniárias são pouco utilizadas no sistema penal brasileiro. A grande maioria dos crimes ficam sem receber, por parte do Estado, a devida sanção penal. Devido a esse quadro, o PNEDH indica que a educação em direitos humanos é fundamental para as categorias profissionais ligadas à segurança e à justiça. Integram o Sistema de Justiça e Segurança diversas categorias profissionais entre as quais se destacam agentes e técnicos do sistema penitenciário; policiais civis; policiais militares; policiais federais; policiais rodoviários; guardas municipais; ouvidores de polícias; peritos legais; magistrados; defensores públicos; membros dos Ministérios Públicos e agentes de segurança privada. Esse amplo e diversificado conjunto de categorias é formado por profissionais com atribuições, formações e experiências bastante diferenciadas. Portanto, torna-se necessário, no desenvolvimento das ações de educação em direitos humanos, a adoção de enfoques e a realização de capacitações também diferenciadas para atender a cada uma delas. No entanto, mesmo reconhecendo a diversidade acima apontada, é necessário destacar e respeitar o papel essencial que cada uma dessas categorias profissionais exerce junto à sociedade, orientando as ações educacionais a elas direcionadas para incluírem valores e procedimentos que possibilitem tornar os profissionais dessas categorias como promotores de direitos humanos, o que significa ir além do papel de apenas defensores dos direitos humanos. A educação em direitos humanos para esses setores pro- fissionais deve considerar os seguintes princípios: • a necessidade de construção de uma nova mentalidade junto aos agentes das áreas de justiça e segurança em seus procedimentos e ações no trato com as pessoas e com os movimentos sociais, respeitando os direitos de todos, juridicamente assegurados; • o resgate da auto-estima dos profissionais da área de justiça e segurança pública, particularmente das corporações policiais, incentivando o protagonismo que exercem na construção de uma cultura de paz e defesa dos direitos humanos; • garantia de interdisciplinaridade nas ações de educação em direitos humanos para além da abordagem segmentada, realizada unicamente através de matérias isoladas. O objetivo é a inserção de conteúdos de direitos humanos em todas as matérias da formação dos profissionais da área; • abordagem regionalizada nas ações educativas, respeitando saberes, práticas e culturas locais, desde que não agridam os direitos humanos e que garantam um núcleo básico mínimo de conhecimentos; • os conteúdos e temas de direitos humanos a serem de- senvolvidos na formação e capacitação desses profissionais devem ser permanentemente atualizados, de modo a garantir os princípios e valores dos documentos internacionais dos quais o Brasil é signatário, bem como os diplomas nacionais de direitos humanos; • as atividades de educação em direitos humanos para os profissionais da área de justiça e segurança devem envolver todos os níveis hierárquicos, bem como a participação de cidadãos não policiais, nas ações de educação em direitos humanos direcionadas a policiais e entidades de direitos humanos; • a formação desses profissionais deve reconhecer e explicitar as contradições e conflitos próprios de cada categoria, de modo a abordá-los sob a ótica dos direitos humanos.
Linhas Gerais de Ação:
Educação e Mídia
A mídia compreende um conjunto de instituições, organizações e negócios voltados para a produção e difusão de informações para públicos diversos. Abrange veículos impressos (revistas, boletins, jornais, cartazes, folhetos etc), audiovisuais (outdoors, televisão em canais abertos e em diversas modalidades pagas, filmes, vídeo, rádio etc), mídia computadorizada on line e mídia interativa via computador, dentre outros. Esse conjunto de meios tem a função de transmitir informação, opinião, entretenimento, publicidade e propaganda. Nesse sentido, é um espaço de força, poder e sociabilidade capaz de atuar na formação da opinião pública em relação a valores, crenças e atitudes.
Na sociedade do conhecimento e da comunicação de massas em que vivemos, a mídia tornou-se instrumento indispensável do processo educativo. O emprego dos órgãos de comunicação social pode contribuir nos processos pedagógicos, por meio da difusão de conteúdos cívicos e éticos, complementando a educação formal e não-formal.
Os veículos de comunicação são capazes de atingir praticamente todos os segmentos sociais, tendo em vista os amplos e flexíveis meios de linguagem utilizados na propagação de idéias, valores e conhecimentos. Nesse sentido, seu potencial é de grande importância para a educação em direitos humanos. Entretanto, a contribuição prestada pela mídia no Brasil tem sido pouco expressiva e muito aquém das suas potencialidades para a formação e difusão dos valores da cidadania e do respeito aos direitos humanos.
Pelas características de integração e capacidade de chegar a grandes contingentes de pessoas, a mídia é reconhecida como um patrimônio social, vital para que o direito à livre expressão e acesso à informação seja exercido, tanto que as emissoras de televisão e de rádio atuam por meio de concessões públicas.
A legislação que orienta a prestação desses serviços ressalta a necessidade dos instrumentos de comunicação afirmarem compromissos previstos na Constituição Federal, em tratados e convenções internacionais, como a cultura de paz, tolerância e respeito às diferenças de etnia, raça, cultura e gênero, orientação sexual, política e religiosa. Assim, a mídia deve adotar uma postura favorável à não-violência e o respeito aos direitos humanos, não só pela força da lei, mas também pelo seu engajamento na melhoria da qualidade de vida da população. Os princípios que fundamentam a busca de colaboração dos diversos agentes da sociedade que atuam na mídia são os seguintes: • os veículos de comunicação e informação, por meio de suas programações e imagens, assumem um papel fundamental na educação para os direitos humanos, na medida em que se comprometem com a difusão de valores éticos e de cidadania; • como formadores de opinião pública, os meios de comunicação e informação são fontes de veiculação de conteúdos específicos de respeito à tolerância, às diferenças múltiplas e às diversidades constituintes de uma cultura de paz; • os profissionais da área de comunicação e formação são atores parceiros para o exercício da responsabilidade social das empresas de mídia, fomentando ações de educação em direitos humanos;
• as novas tecnologias utilizadas na área da comunicação e informação devem ter um papel cada vez mais relevante no processo de educação em direitos humanos.
Linhas Gerais de Ação:
Plano nacional de 2002: http://www.direitoshumanos.usp.br/index.php/Direitos-Humanos-no-Brasil/ii-programa-nacional-de-direitos-humanos-pndh-2002.html Plano nacional de 2001 (Lei 10.172): http://www.direitoshumanos.usp.br/index.php/Direitos-Humanos-no-Brasil/plano-nacional-de-educacao-lei-n-10172-2001.html Plano estadual de SP - 1997: |
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