quinta-feira, 27 de março de 2014

s agriculturas do mundo e o negócio das sementes, fertilizantes e pesticidas

carta maior
http://www.cartamaior.com.br/?/Editoria/Economia/As-agriculturas-do-mundo-e-o-negocio-das-sementes-fertilizantes-e-pesticidas/7/30574


As agriculturas do mundo e o negócio das sementes, fertilizantes e pesticidas

O percurso histórico de agravamento das desigualdades produtivas e da fome, no século XX, é coincidente com o da história das principais multinacionais.


Ricardo Vicente - Esquerda.net
Esquerda.net
Atualmente os discursos políticos e técnicos dominantes nas sociedades ocidentais condicionam brutalmente a opinião de qualquer cidadão sobre o que é hoje a agricultura no mundo. Propagam-se as ideias sobre os avanços tecnológicos da ciência e a sua facilidade de acesso: a mecanização, a comunicação, os processos de automatização, as ferramentas biotecnológicas, a obtenção de novas variedades, etc.
 
A sociedade absorve a ideia de que a população mundial é suportada por uma espécie de agricultura industrializada. Esta ideia é falsa, mas é sobre ela que se desenham e promovem políticas que são aplicadas local e globalmente. A agricultura é muito diversa e bastante desigual. Esta situação é fácil de constatar, não apenas comparando países “desenvolvidos” com países pobres mas também dentro de cada país.

Pensar e desenhar políticas agrícolas significa intervir sobre a vida de todos nós, mas em especial sobre a vida de uma grande fatia da população mundial que depende diretamente da agricultura enquanto atividade económica e de subsistência, cerca de 27% (FAO, 2010). Os dados da FAO relativos à população agrícola do ano 2010 mostram um globo onde a agricultura e a produção de alimentos andam a velocidades muito diferentes: 49% da população africana; 56% da África Central; 39% da Ásia; 47% da Ásia do sul; 16% da América Latina; 1,7% da América do Norte; 5,9% da Europa; 2% da Europa Central; 4,4% em Espanha; 10,3% em Portugal.

Segundo Mazoyer e Roudart (2001), 80% dos agricultores em África e 40 a 60% na América Latina e Ásia apenas dispõem de utensílios manuais e, entre estes, só 15 a 30% têm tração animal. Referem os mesmos autores que a diferença de produtividade do trabalho entre a agricultura manual menos produtiva do mundo e a agricultura motorizada e mecanizada mais produtiva, no espaço de um século (o séc. XX), passou de 1:10 para 1:500. No caso dos cereais, afirmam que um trabalhador isolado, na melhor situação, consegue produzir 2.000 toneladas, enquanto que, na pior situação, uma família produz apenas 1 tonelada, no espaço de um ano. Estas duas realidades encontram-se hoje, frequentemente, separadas não por um oceano mas por um muro ou vedação.

 
É sobre esta realidade desigual que se desenham acordos e políticas internacionais que interferem diretamente nas atividades agrícolas, mas é também neste quadro que atuam as diversas empresas multinacionais produtoras e distribuidoras de fatores de produção. Não por mero acaso, o percurso histórico de agravamento das desigualdades produtivas e da fome, no século XX, é coincidente com o da história das principais multinacionais que ainda hoje atuam no mercado mundial.

Foi no decorrer dos anos 60 e 70 que todo o processo se acelerou, com o surgimento crescente de variedades híbridas, adubos e pesticidas, possibilitando o melhoramento da relação semente-fertilizante e consequentemente o grande aumento das produções. Este processo ficou historicamente conhecido por revolução verde. Nos países e regiões mais pobres, onde eram maiores os riscos de fome consequentes do aumento da população e da fraca capacidade produtiva dos sistemas agrários, as consequências foram desastrosas. A maioria dos novos saberes e tecnologias não chegaram aos agricultores locais e as poucas que chegaram retiraram-lhes a autonomia, criando dependências entre agricultores e empresas fornecedoras de fatores. Na história destas empresas abundam as situações fraudulentas que provocaram a destruição de recursos endógenos e criaram dependências dos seus negócios. Surgiram diferenciais de produtividade brutais com a entrada em funcionamento de unidades produtivas modernas, os preços dos alimentos caíram, muitos agricultores abandonaram a atividade, destruíram-se redes de distribuição locais e surgiram novas dependências alimentares que espalharam a fome e o desespero. Iniciou-se uma mudança de paradigma, passou a haver produção de alimentos suficiente para alimentar a população mas a fome agravou-se devido à impossibilidade de acesso aos alimentos.
 

Todas as atuais principais empresas de produção e distribuição de sementes, adubos e pesticidas têm um histórico de atividade que iniciou antes ou durante a revolução verde e quase todas já tiveram reestruturações decorrentes da fusão com outras empresas. Há quase um século que atuam numa área de atividade onde o negócio é garantido e ainda não parou de crescer. Se analisarmos as suas histórias, facilmente constatamos que os seus negócios cresceram sem regras nem princípios, ao lado dos interesses financeiros e políticos das maiores potencias mundiais.

Alguns fatos históricos sobre as principais empresas multinacionais que operam no mercado se sementes, pesticidas e adubos:

Monsanto:

Surge em 1901 com a produção de sacarina. Produz vários equipamentos para a 2ª guerra mundial; em 1945 entra no negócio dos pesticidas; em 1960 é uma das principais produtoras de agente laranja, herbicida com efeito desfolhante aplicado na guerra do Vietname e que provocou sequelas brutais nos soldados e na população local; em 1964 lança o primeiro herbicida seletivo pré-emergência para a cultura do milho.

Syngenta:

Surge apenas em 1999, mas resultou de uma fusão empresarial onde se destacava a Geigy, que se fundou em 1935 e produzia inseticidas; em 1974 entrou no negócio das sementes.

Bayer:

Surge em 1863 como produtora de corantes e mais tarde dedica-se à indústria farmacêutica. Prestou serviços à Alemanha de produção de equipamentos necessários às duas guerras mundiais; Em 1956, Fritz ter Meer, depois de sete anos de prisão consequentes de colaboração em ensaios em seres humanos e tráfego de escravos provenientes de um campo de concentração em Aushwitz, foi nomeado presidente do conselho de supervisão da Bayer.

DuPont:

Iniciou em 1802 com a produção de pólvora; Produziu equipamentos para as duas guerras mundiais; Em 1943 participa no Manhattan Project e no desenvolvimento de uma bomba nuclear; Entre 1997 e 1999 comprou absorveu a empresa Pioneer, uma das maiores empresas que atuava no mercado mundial de sementes (desde 1926), altura em que lançou o primeiro milho híbrido comercializado. Em 1960 lança o inseticida Lanate.

Limagrain:

Surge em 1942 com a produção e venda de sementes.

BASF:

Fundada em 1865 iniciou atividade com a produção de corantes. Em 1913 sintetizaram amónio pela primeira vez. Produziram diversos equipamentos para as duas guerras mundiais. Em 1949 lançam um novo negócio com o herbicida U46.

DOW:

Foi criada em 1897 com um negócio de venda de descolorantes e sais. Forneceu materiais diversos para as duas guerras mundiais; nas primeiras duas décadas do século XX assumiu-se como um dos maiores produtores de pesticidas; entre 1951 e 1975 desenvolveu armas nucleares; entre 1965 e 1969 forneceu napalm e agente laranja para a guerra do Vietname.

Potash Corp

O histórico da empresa remonta a 1975, quando o Governo de Saskatchewan, Canadá, decidiu nacionalizar e agrupar o negócio de um conjunto de empresas estratégicas que operavam pelo menos desde 1950 na extração e venda de potássio e derivados. Em 1989 o grupo foi privatizado.

Mosaic Company

Foi lançada em 2004, nos Estados Unidos, e resultou da fusão de duas empresas, a Cargill e a IMC-Global que tinha histórico de atividade desde 1909.

Yara

Fundada em 1905, 10 anos depois, durante a primeira guerra mundial, fornecia nitratos de cálcio e de amónio à Alemanha e aos Aliados.

OCP Group

Formado em 1920, em Marrocos, na extração e comercialização de fósforo e derivados.
 
(*) Ricardo Vicente é engenheiro agrônomo. Publicado em Esquerda.net

terça-feira, 25 de março de 2014

Cem vezes Cláudia

OP
http://outraspalavras.net/blog/2014/03/21/cem-vezes-claudia/


Cem vezes Cláudia

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Série de memes artísticos homenageia Cláudia Silva Ferreira, a mulher de sonhos, coragem e dores assassinada e arrastada pela PM do Rio esta semana
A mulher arrastada pela Polícia Militar tinha nome – Cláudia Silva Ferreira. Cláudia também tinha família. E sonhos, coragem, dores e medos como qualquer ser humano. As denúncias da barbárie ocorrida são importantes e elas não devem cessar. Mas fugir do sensacionalismo e humanizar esse momento também é. Por isso, nos propusemos a retratar Cláudia com mais carinho do que o visto nos últimos dias.
A convite da OLGA, alguns artistas gentilmente criaram imagens sensíveis, que se dispõe a resgatar a dignidade roubada por criminosos. Este projeto se chama 100 VEZES CLÁUDIA e é aberto para que qualquer um possa enviar suas homenagens. Ou seja, esperamos publicar aqui novas artes com frequência. Quem sabe não chegamos a 100? Por fim, gostaríamos de imprimir algumas das ilustrações e enviar à família de Cláudia. Quer participar? Escreva para olga@thinkolga.com. Veja a seguir mais imagens
36) SOUEID
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35) GRUPO CRIOLOS
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34) CAIO VITOR
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33) ALINE ALBUQUERQUE
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Com toda a revolta e ternura. 
31) FERNANDA OZILAK
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30) DAIANY DANTAS
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Também não sou artista. Sou apenas uma pessoa que busca lidar com esse sentimento de perda e de desesperança diante da irracionalidade desta execução. Meu desenho me ajudou a respirar e a abraçar Cláudia, que partiu inocente e despreocupada, rumo à fila do pão. 

29) CARINE SUDER FERNANDES 
Cláudia da Silva Ferreira 1

28) VANESSA PREZOTO
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27) MURILO ROMEIRO
100 CLAUDIA DA SILVA FERREIRA

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25) LUISA AIDAR
Sketches
Oração
Não pode ser em vão
Toda essa violência, essa dor
Tantos bons que se vão
Não é justo ser em vão meu Deus, não!
E vão Cláudia, Amarildo, Severino, João…

24) LUCAS SOUTO
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Sempre que me deparo com situações como essas, que quebram nosso coração e que, infelizmente, são tão corriqueiros em nossos dias, só consigo me lembrar de uma das tantas verdades cantadas pelos menestréis da periferia do Facção Central: “Que porra de país é esse, que mata e prende as vítimas de seu desinteresse?”. Cláudia é a porta-bandeira dessa luta que não pode se calar! Em sua memória uma ilustração de um – também – não ilustrador.

23) ALESSANDRA MOURA
claudia da silva.aLESSANDRA

22) CLÁUDIO RODRIGUES
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21) PAULO GIL
Claudia, esse mundo nao te mereceu!
20) BIANCA BANZATO
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19) MICHELLE MORAES
Claudia da Silva Ferreira
Não sou artista e também não sei se o meu desenho será escolhido, mas isso pouco importa, porque sei que esse movimento é uma acalento e uma alerta.

18) NICE LOPES
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Envio minha singela homenagem à esta mulher, vítima do descaso, da falta de amor, da falta de respeito pela vida humana.

17) KEKS PUCCI
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Eu estou um pouco envergonhada de mandar meu desenho porque não sou artista e nunca desenho nada, mas a história de Cláudia me toca demais para não participar. Somos Cláudia da Silva Ferreira. PRECISAMOS ser Cláudia da Silva Ferreira para exigir que se faça justiça.

16) EUGÊNIA SOUZA
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15) MARCELO MESQUITA
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“Não se trata de saudade de alguma coisa que acabou ou pessoa que morreu. É saudade do que está aí vivo, solto e nunca deixou de existir. Se não temos acesso a isso, é por falta de uma batalha maior.” – Elis Regina
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13) GABRIELA CAMPANER
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12) MARÍLIA NOBRE
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11) TÂNIA RIBEIRO SOARES
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Não sou artista. Sou arquiteta. Desenhar pessoas não é o meu forte. Mas quando vi o post achei importante enviar minha singela contribuição para homenagear Claudia da Silva Ferreira, mesmo que não se publique. Por razões tantas somos diferentes, mas temos o mais importante em comum. 
Somos pessoas. E a vida de uma pessoa é sempre preciosa.

10) LEILA RANGEL DA SILVA
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9) EMERSON DIAS
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8) JÚLIA BORGES
Brilhará

7) VERA LIRA
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Claúdia Flor Criola, serenidade e força.
Claudia

5) SARA STORRER
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Nesse desenho, Cláudia é Iansã. Porque no fim das contas, é assim que ela tem que ser lembrada, como Guerreira. Como a força de tantas e tantas pessoas, de tantas mulheres, de quem o mundo parece ter esquecido.
4) TAILOR
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3) CONFEITARIA (criação de Fabiane Secches + Thiago Thomé)
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A gente gostaria de contribuir, ainda que de uma maneira simbólica e muito pequena, para que a Cláudia fosse enxergada e tratada como uma mulher. Como um ser humano. Com respeito. Não como uma coisa, para ser atingida num tiroteio e colocada em um porta-malas, do qual ela ficou dependurada e foi arrastada por 250m.
Embora a gente defenda que seja muito importante que a mídia divulgue essas imagens cruéis e violentas — a gravidade do crime não permite eufemismos, também gostaríamos que, ao menos aqui, neste espaço desta homenagem, Claudia fosse lembrada como a mulher que foi, e tratada com a humanidade que merecia. Gostaríamos que seus filhos se lembrassem sempre de que merecem nada menos do que este tratamento: o de seres humanos. Para isso, nossa inspiração foi o depoimento do seu marido em uma entrevista, que dizia: “Extrovertida, guerreira para caramba, determinada no que queria”.
Claudia
Fiz algo bem simples, na verdade. Queria fazer algo que representasse a humanidade que não viram e continuam não vendo nela.
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Ucrânia: o fantasma de um país dividido

OP
http://outraspalavras.net/blog/2014/03/25/ucrania-o-fantasma-de-um-pais-dividido/


Ucrânia: o fantasma de um país dividido

Enquanto pessoas comemoram o resultado do referendo na Praça Lênin, em Simferopol, capital da Crimeia, Washington e seus aliados condenam realização de referendo na Crimeia
Enquanto população comemora resultado do referendo na Crimeia, Washington e aliados condenam consulta
Após referendo na Crimeia, seis cidades querem decidir seu futuro. Embora ameacem com sanções, EUA consideram, nos bastidores, solução conciliadora
Por Cauê Seignermartin Ameni
A Crimeia, pequena região ucraniana, polarizou o debate político nas últimas semanas. Fragmentou o país, colocando nacionalistas pró-ocidente de um lado, federalistas pró-Rússia de outro, desestabilizando a mais recente empreitada ocidental no leste europeu.
Ao contrário do que dizem muitos “analistas”, não foi apenas a maioria russa na Crimeia que votou pela incorporação a Moscou. Dos eleitores, 83,10% foram às urnas. Entre estes, 96,77% votaram a favor da Crimeia unir-se à Russia, enquanto 2,51% foram contra e 0,72% dos votos foram anulados. A formação étnica na Crimeia, segundo o censo de 2001 revela que 58,32% são russos, 24,32% ucranianos e 12,10% tártaros. Uma matemática simples demonstra que também ucranianos e tártaros posicionaram-se majoritariamente a favor do novo status para a região.
Há razões para isso. O movimento ultra-nacionalista em Kiev, que ocupa postos destacados no novo governo interino, não é aceito por considerável parte da população, sobretudo no sul-leste do país, onde se desencadearam movimentos separatistas. Em meio a tensões, as regiões de Donetsk, Carcóvia e outras quatro cidades não reconheceram a mudança do regime. Estão surgindo grupos de auto-defesa para defender suas instituições públicas de grupos ultra-nacionalistas. Reivindica-se separação das regiões.
crimeiraAlém disso, para muitos russos, a Crimeia e outras cidades do leste, que no passado foram sitiada pelos invasores nazistas, têm grande importância histórica-emocional.
Em Donetsk, há divisão étnica (48% são russos e 46% ucranianos), mas a cultura e a língua russa são predominantes. Por conta disso, os protestos pró-Russia somam maior forças nas ruas. Como relata a reportagem na CNN, grandes manifestação na praça Lenin, recolhem petições todos os dias, e voluntários em abriram tendas para que os manifestantes se inscrevam nos pelotões de auto-defesa. Petr Bogomol, um mineiro da região, disse à Time, ”Nós não queremos viver em um país com fascistas”, referindo-se ao governo interino em Kiev, que governa o país desde a derrubada do presidente 22 de fevereiro. “Nós queremos uma união com a Rússia e queremos federalização”.
“Há dois meses, eu daria a vida pela Ucrânia”, diz uma Ana Ivanova, 60, professora, “Mas o que aconteceu em Maidan matou o meu amor pela Ucrânia.”  Isto não quer dizer que não seja patriota, explica “Sou mais patriota do que os fascistas de Maidan.”
O mesmo cenário se desenha em Carcóvia, segunda maior cidade do país, onde enormes mobilizações embaladas por musicas russas, clamam por independência através de referendo. Manifestante da assembleia de Kharkov, pedem ao Kremlin, que “garanta seus direitos e liberdades” para que o referendo planejado para 27 de abril, possa ser realizado.
Outras cidades, como Dnepropetrovsk, Lugansk, Odessa e Nikolaev também foram palco de massivas manifestações pró-Rússia. Vídeos e fotos podem ser vistos aqui. O Kremlin defende, astutamente, que esses estados escrevam suas próprias regras através do referendo, oferecendo uma solução federativa para as regiões.
Impotência ocidental: A impotência do Ocidente diante da reação russa na Ucrânia ficou evidente quando vieram as “sanções”. Washington decidiu “punir”… 21 personalidade envolvidas no referendo. Treze russos e oito ucranianos sofrerão, durante seis meses, restrições de viagens e bloqueio de bens. Já as cartas nas mãos de Moscou são mais potentes. A Ucrânia, que não se recupera, da queda de quase 15% do PIB em 2009, sofreu outro golpe na sua cambaleante economia. O governo russo permitiu, no começo de março que a Comgaz, subsidiária da companhia russa Gazprom, retirasse o desconto de 30% de no preço gás fornecido a Kiev, o que elevou a dívida da Ucrânia para US$ 2 bilhões.
Uma retaliação ocidental séria teria um custo muito alto. Hoje, 58% do gás natural usado na Ucrânia vem da Rússia, que alimenta também Europa e tropas americanas no Afeganistão. Washington paga anualmente cerca de UR$ 1 bilhão a Moscou pelo fornecimento.
Sabendo disso, e temendo maiores reações pós-Crimeia, Obama recuou: ”Há um caminho melhor, mas acho que mesmo os ucranianos reconheceriam que se envolver militarmente com a Rússia não seria apropriado e não seria bom nem para a Ucrânia”.
O compromisso que se tenta costurar…: Haveria um acordo possível? O ex-embaixador dos EUA à URSS de 1987 a 1991, John Matlock, tenta soprar alguma solução em editorial para a revista Times: ”Embora talvez seja difícil para as partes relevantes aceitarem, as premissas de uma solução para a confusão ucraniana são claras: 1) a nova Constituição deve oferecer uma estrutura federal de governo, dando às províncias ucranianas, no mínimo, tantos direitos quantos têm os estados norte-americanos; 2) o idioma russo deve ter assegurado status idêntico ao do idioma ucraniano; e 3) a Ucrânia deve oferecer garantias de que não se tornará membro da OTAN nem de qualquer outra aliança militar que exclua a Rússia. “
Há sinais de que os políticos em Washington começam lentamente a frear os falcões da Casa Branca. Mas talvez agora seja tarde demais.
… e as pressões dos ultra-nacionalistas em Kiev: Estreitando as relações econômicas da Ucrânia com a União Europeia, o primeiro ministro interino, Arseniy Yatsenyuk, assinou em 21/03, em Bruxelas, o mesmo documento rejeitado por Yanukovitch que o levou à sua queda. Ao mesmo tempo, pede para que o mundo não reconheça o referendo na Crimeia e imponha sanções econômicas contra a Russia. O Parlamento em Kiev que aprovou a dissolução da assembleia regional da Crimeia, promete intimidar futuros movimentos separatistas no sul-leste do país.
Os lideres nacionalistas mais exaltados em Kiev, reconhecidos pelos seus traços neonazistas, espalharam-se pelo governo interino que durará até maio, quando haverá novas eleições. Porém, compõem hoje as chamadas posições das estruturas do poder; Vice-Primeiro Ministro: Alexandr Sych (Partido Svoboda); Ministro da Defesa: Igor Teniukh  (Partido Svoboda); Ministro do Interior: Arsen Avakov (oficialmente, é membro do Partido da Pátria, mas tem forte relação com o Setor Direita): Presidente do Conselho de Defesa e Segurança Nacional: Andrei Paribii (do partido Nacional-Social da Ucrânia): Vice-presidente do Conselho de Defesa e Segurança Nacional: Dmitri Iarosh (Setor Direita).
Para se ter uma ideia mais clara do que se trata, basta ver o posicionamento público do líder Oleh Tyahnybok do ultra-nacionalista Svoboda (cujo nome original era Partido Nacional-Socialista), que clama pela “libertação” de seu país da “máfia judaico-moscovita”. Já o Setor Direita é descrito pelo repórter Max Blumenthal, do New York Times, como “grupo nebuloso, que se auto-intitula ‘nacionalista autônomo’. Seus membros são identificados pelo jeito skinhead de trajar, estilo de vida ascético e fascínio pela violência nas ruas”.
O novo parlamento também decidiu construir uma Guarda Nacional de 60 mil membros. “Aqueles que querem defender o seu país com um rifle em suas mãos, sejam bem-vindo à Guarda Nacional”, disse o primeiro-ministro Iatsenyuk. Quem dirigirá a Guarda, é o novo chefe de segurança, Andrei Paribii, um dos fundadores do Partido Nacional-Social, junto com seu vice Dmitri Iarosh, líder do Right Sector.
Por que o recém empossado primeiro-ministro Arseni Iatseniuk, colocou esse facção política no poder? Será que foi porque eles – os neofascistas – foram decisivos para colocar Iatseniuk no lugar onde hoje esta, com ajuda das forças ocidentais?
Por isso pode-se concluir, da mesma forma que o escritor russo Aleksandr Solzhenitsyn concluiu quando o ex-conselheiro de Segurança Nacional dos EUA Zbigniew Brzezinski disse que os EUA deveriam defender a independência da Ucrânia no referendo que resultou sua independência em 1991: “Por que o Departamento de Estado [dos EUA] decidiria quem devia ficar com Sevastopol? Se alguém se lembra das declarações, absolutamente sem qualquer tato, do presidente Bush, sobre apoiar a soberania da Ucrânia, mesmo antes do referendo sobre o assunto, pode-se concluir que tudo isso só tem a ver com um único objetivo comum: usar todos os meios, não importam as consequências, para enfraquecer a Rússia”.
Só que dessa vez os russos podem mais.