quinta-feira, 16 de agosto de 2012

Caso Alyne: Entidades denunciam inércia do Brasil e exigem que assuma responsabilidade e indenize família

DHESCA
http://www.dhescbrasil.org.br/index.php?option=com_content&view=article&id=626:caso-alyne-entidades-denunciam-inercia&catid=69:antiga-rok-stories


Caso Alyne: Entidades denunciam inércia do Brasil e exigem que assuma responsabilidade e indenize família

Há exatamente 1 ano o Cedaw (entidade que monitora o cumprimento da Convenção para a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher) condenou o Brasil pela morte de Alyne da Silva Pimentel Teixeira, 28 anos, negra, de Belfort Roxo, na Baixada Fluminense (denunciamos o caso aqui aqui). O Brasil nem assumiu sua responsabilidade pública pelo caso nem cumpriu as penas estabelidas.
Em 2002, grávida de 27 semanas, Alyne procurou uma casa de saúde particular com vômitos e fortes dores abdominais. Foram-lhe prescritos remédios para náuseas, vitamina B12 e infecção vaginal.
Dois dias depois piorou, voltou à casa de saúde, fez ultra-sonografia. O feto estava morto. Os médicos induziram o parto. Mas só fizeram a cirurgia para retirar a placenta 14 horas depois. Alyne teve hemorragia, vomitou sangue, a pressão arterial caiu. Decidiram transferi-la para um hospital público.
O único que a aceitou foi o Hospital Geral de Nova Iguaçu. Alyne esperou oito horas por ambulância. Como a casa de saúde não encaminhou junto qualquer documento que indicasse o seu estado clínico, ficou horas no hall da emergência, pois não havia leito disponível. Aí, entrou em coma e morreu devido à má qualidade do atendimento e à falta de organização das redes de serviços. Entre o mal-estar inicial e o óbito se passaram cinco dias. Uma morte perfeitamente evitável.
O Comitê Cedaw condenou então o Estado brasileiro reparar a família de Alyne, inclusive financeiramente, e a implementar uma série de recomendações.  Como até agora, nada foi feito, entidades de sociedade civil enviaram carta (íntegra, ao final deste post) à presidenta Dilma Rousseff, aos ministros Alexandre Padilha (Saúde), Eleonora Menicucci (Secretaria de Políticas para as Mulheres) e Maria do Rosário (Secretaria de Direitos da Pessoa Humana), pedindo providências urgentes.
A INDIGNAÇÃO DE BEATRIZ GALLI, SONIA CORRÊA E FÁTIMA OLIVEIRA
Anualmente cerca de 1.800 brasileiras morrem antes, durante ou poucos dias após o parto. O caso Alyne é emblemático. Ilustra um padrão sistemático de violações aos direitos humanos das mulheres relacionados à mortalidade materna por causa evitáveis.
Por isso, o Viomundo ouviu três representantes históricas dos movimentos de mulheres, todas respeitadíssimas aqui e no exterior. A indignação é geral.
“Na mesma semana em que são feitas comemorações oficiais da Lei Maria da Penha, o Caso Alyne completa um ano, sem resposta efetiva do Estado”, revolta-se Sonia Corrêa, do Observatório de Sexualidade e Política (SPW) e da Associação Brasileira Interdisciplinar de Aids (Abia).  “É significativo, para não dizer irônico.”
Pilar da política prioritária dos direitos das mulheres no país, a Lei Maria da Penha, aprovada em 2006, foi resultado direto da condenação do Brasil pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos, em 2001. Foram necessários, portanto, cinco anos para o Brasil adotar uma medida de política efetiva de prevenção e punição da violência de gênero. E ainda mais algum tempo para que Maria da Penha recebesse a compensação financeira que lhe era devida como reparação pela violação sofrida.
“Supúnhamos que, devido ao ‘sucesso’ do caso Maria da Penha, esses prazos seriam reduzidos nos  subseqüentes. Lamentavelmente isso não ocorreu no Caso Alyne”, critica Sonia. Por que tanta procrastinação?”
“Esperamos que os governos federal e do Estado do Rio de Janeiro cumpram o seu papel e implementem as recomendações do Comitê Cedaw para prevenir novas mortes maternas e melhorar a qualidade da assistência”, reivindica a advogada Beatriz Galli, relatora do Direito a Saúde Sexual e Reprodutiva da Plataforma Dhesca e assessora de políticas para a América Latina do Ipas. “Mas, primeiro, são necessários o reconhecimento público da responsabilidade internacional e o pagamento da indenização à mãe e à filha da Alyne. É uma medida de Justiça!”
Fátima Oliveira, médica, escritora e feminista, põe ainda mais o dedo na ferida: “Eu realmente não consigo atinar por que o Estado brasileiro resolveu fazer cara de paisagem no caso da condenação pela morte de Alyne. Não admitir a responsabilidade e não assumir a condenação depõe contra o governo da primeira presidenta do Brasil, que deveria já ter adotado o gesto exemplar de não se escusar da pena a que o Brasil foi condenado. É assim que querem que acreditemos nas intenções, se não fazem o gesto? Ou a Rede Cegonha é só um discurso, ainda que enviesado?”
Fátima propõe: “Em minha opinião a ministra da Mulher, Eleonora Meniccucci, deveria buscar uma ‘concertação’ no âmbito do governo para que a presidenta faça um pronunciamento à Nação assumindo a culpa, assumindo a dívida e pedindo perdão à família de Alyne. No mínimo!”


Por Conceição Lemes, Viomundo.



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