sexta-feira, 30 de setembro de 2011

Zoneamento socioeconômico e ecológico de Mato Grosso é analisado em Brasília

30/09/2011
Da Agência Brasil

Brasília - Representantes de organizações defensoras do meio ambiente, de povos indígenas, da agricultura familiar e de movimentos sociais chegam hoje (30) a Brasília para uma reunião com a Comissão Nacional de Zoneamento, do Ministério do Meio Ambiente. Participam ainda representantes do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama). A reunião visa a analisar o projeto de zoneamento socioeconômico e ecológico de Mato Grosso.

As falhas do projeto - aprovado pela Assembleia Legislativa e pelo governo do estado - e os impactos socioambientais que podem ser gerados por conta do zoneamento foram discutidos pela sociedade mato-grossense em maio, durante seminário que contou com a participação de indígenas, movimentos sociais, pesquisadores e parlamentares. O resultado dessa discussão foi uma carta contendo os pontos levantados e que será entregue aos representantes dos órgãos federais.

Entre os problemas destacados, estão a eliminação de terras indígenas, a redução de áreas voltadas à conservação e à proteção de recursos hidrícos, a falta de reconhecimento das áreas de agricultura familiar e a expansão de zonas destinadas à agricultura e à pecuária de alto impacto.

Os problemas com o zoneamento levaram representantes do Ministério Público no estado a entrar com ação pública, com pedido de liminar. A ação diz que "o zoneamento revela-se um instrumento com enorme potencial de ser propulsor de graves prejuízos ambientais e econômicos ao estado de Mato Grosso, merecendo assim a pronta intervenção do Poder Judiciário para anulá-la, em nome da higidez do ambiente, da sustentabilidade econômica, da qualidade de vida e do bem-estar da sociedade mato-grossense".

Participam da reunião, às 9h no Ministério da Agricultura, organizações como o Instituto Centro de Vida (ICV), Instituto Socioambiental (ISA), Instituto de Pesquisa Ambiental da Amâzonia (Ipam), a Operação Amzônia Nativa (Opan), o Fórum Mato-Grossense de Meio Ambiente e Desenvolvimento (Formad) e o Grupo de Trabalho e Mobilização Social (GTMS), integrado por mais de 130 instituições e movimentos sociais.

Edição: Graça Adjuto

quinta-feira, 29 de setembro de 2011

Agrotóxico é nova faceta da violência no campo

http://brasildefato.com.br/content/agrot%C3%B3xico-%C3%A9-nova-faceta-da-viol%C3%AAncia-no-campo

Pesquisadora analisa dados das intoxicações e mortes decorrentes do uso do veneno e explica como o modelo do agronegócio subordina os trabalhadores e a pequena agricultura

27/09/2011

Joana Tavares

da Redação


O modelo não é novo: grandes extensões de terra, monocultura, mecanização do trabalho. O uso de agrotóxicos para garantir a produção em larga escala também não. Mas seus efeitos sobre a saúde têm estado cada vez mais em discussão. Desde 2009, o Brasil é o maior consumidor desses agroquímicos, o que mostra a cara do agronegócio: intoxicações, concentração de renda, transferência de recursos para empresas transnacionais, empobrecimento dos camponeses, produção de alimentos contaminados. A professora doutora do Departamento de Geografia da Universidade de São Paulo (USP) Larissa Mies Bombardi realizou uma pesquisa sobre os casos de intoxicações e mortes por agrotóxicos no Brasil, com dados de 1999 a 2009.

O uso de agrotóxicos afeta a todos expostos

diretamente ao veneno e

consumidores de alimentos - Foto: João Zinclar

Ela levantou que foram notificadas 25.350 tentativas de suicídio através do uso de agrotóxicos no período, e 1876 mortes foram registradas. “Uma grande parte dessas é suicídio, o que é mais assustador ainda. A escolha desse caminho é significativa, o trabalhador usa para causar sua própria morte o instrumento que o subordina, que o deixa doente, que pode levar ao endividamento”, aponta.

Larissa considera a situação dos agrotóxicos mais uma faceta da violência no campo, que afeta a todos: os pequenos produtores, os trabalhadores expostos diretamente ao veneno, os consumidores de alimentos. Ela explica que há alternativas, mas que elas passam necessariamente por uma mudança de modelo.

Brasil de Fato - O Brasil se tornou o maior consumidor de agrotóxicos em 2009. De onde vêm esses produtos?

Larissa Mies Bombardi - São seis grandes empresas estrangeiras – Monsanto, Syngenta/Astra Zeneca/Novartis, Bayer, Dupont, Basf e Dow – controlando mais de 70% do mercado de agrotóxicos no Brasil. Em poucos anos, elas tomaram pra si 127 outras empresas, isso é chocante. E essas empresas são de três países, Estados Unidos, Suíça e Alemanha. Segundo o Anuário do Agronegócio de 2010, as empresas que vendem veneno tiveram uma receita líquida de R$ 15 bilhões.

Com esse processo, aumenta ainda mais a transferência de renda do pequeno produtor para as empresas. Como é essa questão da subordinação da renda da terra?

Esse é um dos grandes dramas da agricultura camponesa hoje. Quando o produtor depende de um adubo químico, de um inseticida, de um herbicida, enfim, uma parte da renda que ficaria no bolso dele vai para o capital industrial. Muitas vezes o preço desses produtos é pautado pelo dólar. Há momentos em que o dólar aumenta, o pesticida aumenta. Mas o que acontece: todo produto agrícola, com exceção da cana, é determinado pela oferta e demanda. Então você não sabe quanto vai valer seu produto até a hora da venda, e ainda assim você recebe 30, 60 dias depois. Às vezes você pagou um valor muito alto pelo insumo e a produção não compensou. Então eles acabam recorrendo ao mercado financeiro para conseguir saldar dívidas. Acabam entrando num círculo vicioso por conta da dependência desses insumos. Aí a renda deles fica subordinada ao capital industrial, às indústrias de agroquímicos, e ao capital financeiro, muitas vezes juntos. Às vezes os bancos, inclusive o Banco do Brasil, emprestam o dinheiro, faz o sistema de crédito rural direto com as empresas que comercializam esses produtos. Então uma parte da renda, ao invés de ficar no controle do produtor – como fica quando ele investe em outros processos de adubação – é transferida para o capital.

Por que o agricultor não pode agregar esse custo no preço final do produto?

Ele não tem controle sobre o preço. Diferente de outros setores da economia, o agricultor não tem controle do preço do produto final, que é determinado pela oferta. Quando tem muito produto no mercado, o preço vai lá embaixo. Mas o preço dos agroquímicos não depende disso. Então a renda dos pequenos produtores muitas vezes fica reduzida, e eles trabalham muitos anos no prejuízo. Eles permanecem na terra porque a lógica é outra. E até porque eles não produzem apenas para o mercado.

Você coloca que 80% dos agrotóxicos da América Latina são consumidos no Brasil. Por que isso ocorre? A produção agrícola justificaria esse uso intensivo?

Na verdade, 84% dos agrotóxicos da América Latina são consumidos no Brasil. E a gente não tem controle da quantidade, do tipo de produtos que são usados. O Brasil é muito permissivo, tem produtos que são proibidos na União Europeia e nos Estados Unidos há 20 anos e aqui eles podem ser usados. Tem um caso relatado por Wanderley Pignati, da UFMT, em Lucas do Rio Verde, de uma chuva de agrotóxicos que contaminou a população e os poços artesianos, e a prefeitura comunga com os grandes fazendeiros. O caso foi escondido, escamoteado...

Por que aumentou tanto o uso de agrotóxicos de 1999 a 2009?

Porque aumentou muito a produção de soja e de cana-de-açúcar. Agora o Brasil exporta etanol para mais de 40 países. Além do carro flex – que é dos anos 2000 pra cá e aumentou extraordinariamente a produção de cana – tem um consumo externo grande também. O que acontece é que o agronegócio está se expandindo. Pelo mapa em que se mede a utilização de agrotóxicos por município, dá pra ver que o agronegócio caminha em direção à Amazônia. Aumentou muito a área plantada com cana e soja. Individualmente, o algodão demanda mais agrotóxicos, mas se pensarmos na quantidade de soja plantada, ela congrega grande parte do que se consome de agrotóxico no Brasil, muito mais que a cana. É importante ressaltar que quase todos os produtos industrializados alimentícios que a gente come contêm soja. Além dos óleos, os biscoitos, vários tipos de farináceos, levam soja, então isso chega até a alimentação.

Seria possível produzir o mesmo tanto sem utilizar agrotóxicos?

Não nos moldes em que está organizada a produção hoje. Quando se tem uma monocultura, uma plantação de uma espécie só, fica muito fácil para os insetos virem e consumirem. Qual a diferença de uma monocultura e de uma agricultura que chamamos agroecológica? A agroecológica “imita” a natureza, há uma infinidade de espécies juntas, então não há um foco direto para o inseto se alimentar. Na monocultura, isso é impossível. Não dá pra pensar a monocultura sem o pacote agroquímico, essa é a verdade. Seria possível produzir isso tudo, mas não nesses moldes. Não dá pra ter grandes propriedades, não dá pra ser mecanizado, enfim, é um pacote que anda junto. Não dá pra produzir em larga escala nesses moldes sem agrotóxicos.

A maior parte dos alimentos consumidos no Brasil, cerca de 70%, vem da pequena agricultura. Eles estão livres dos venenos?

Cerca de um terço dos pequenos agricultores utilizam agrotóxicos. Eles são em alguma medida empurrados pra isso. O que acontece quando vamos comprar uma verdura, um legume, no mercado? Procuramos o maior e o mais vistoso. Assim os produtores são empurrados para produzir numa vistosidade em quantidade, que os leva ao uso de agrotóxicos. Quando falamos de pequena agricultura, falamos de bairro rural. É uma forma de organização no campo, são pequenos sítios em que as pessoas acabam plantando as mesmas coisas, por pura sociabilidade, por troca de informação. Um vizinho fala pro outro o que está rendendo e assim vai. Como as propriedades são pequenas e uma encostada na outra, se o vizinho usa agrotóxicos e você não usa, os insetos que atacariam a plantação dele vão atacar a sua. Por isso a agroecologia precisa ser pensada em conjunto com os vizinhos, não tem como manter um procedimento desse se quem está próximo não mantém, é muito complicado. Mas o grosso dos produtos com que nos alimentamos, os alimentos frescos, vem das pequenas propriedades.

Por que o agronegócio coloca que é ele que garante a produção de comida no mundo? O argumento deles é que é preciso produzir mais para alimentar as pessoas, para acabar com a fome, não é?

Esse é um argumento mentiroso. O problema de acesso ao alimento não é questão de produção, de quantidade de alimento, é questão de acesso à renda. A gente pode pensar na quantidade de desperdício, na quantidade de pessoas que têm problema de super alimentação. Seria possível produzir para todos, claro. Há propriedades agroecológicas em que a produtividade – medida pela produção por área – é maior que nos moldes tradicionais. Mas o problema é que nas propriedades agroecológicas a demanda de trabalho é muito intensa. E o capitalismo consegue avançar no campo quando o trabalho é mínimo, por isso mecanizam, para ter lucro. Quando o capital não produz diretamente, justamente porque algumas produções demandam muito trabalho, ele subordina a produção. É o exemplo da questão da uva: por que as indústrias vinícolas não produzem uva elas mesmas? Porque é uma quantidade de trabalho extrema. José Vicente Tavares dos Santos mostra que 80, 90% do preço do vinho é a uva. Como é o camponês que a produz, procura salvar a produção da geada de madrugada, ele arca com isso porque faz parte da vida cotidiana dele. Agora imagina uma empresa remunerar um funcionário para fazer isso? Não compensa para eles, é vantajoso para o capital se apropriar da renda ao invés de produzir alguns produtos.

Como é feita a mensuração da intoxicação por agrotóxicos hoje?

Tem o Sistema Nacional de Informações Tóxico-Farmacológicas, o Sinitox, que é um instituto da Fiocruz, do Rio de Janeiro. A função do Sinitox é orientar as famílias, os agentes de saúde na forma de lidar com intoxicações. Eles são organizados em centros, não tem em todos os estados, que remetem as informações para o Rio de Janeiro. Mas eles não têm função de fazer um banco de dados. Já o Sistema de Informação de Agravos de Notificação, Sinan, é vinculado diretamente ao Ministério da Saúde, com o intuito de cadastrar os dados de intoxicações. Mas os dados são diferentes, esse é o problema. Não dá pra saber se um dado é o mesmo que está no outro, não há como cruzar os dados. Há números discrepantes, às vezes tem o dobro de intoxicações no Sinitox para o mesmo ano medido pelo Sinan. Apenas a partir de 2005 a notificação passou a ser compulsória, em 13 estados. Em janeiro deste ano a notificação de intoxicação por agrotóxicos passou a ser obrigatória, através do Sinan. Mas no período que analisei, de 1999 a 2009, pude perceber que os números não batem, essa compulsoriedade não era obedecida.

O que você observou em relação aos dados de intoxicação?

O que chama atenção é que em todos os estados, a não ser nos que o Sinitox não disponibiliza dados, há casos de intoxicação por agrotóxicos. É uma quantidade assustadora: 62 mil intoxicações por agrotóxicos de uso agrícola. Se você pensar que há uma subnotificação – o próprio Ministério da Saúde indica que talvez os casos sejam 50 vezes maiores que os notificados – o número fica maior ainda. E isso levando em conta que são casos de intoxicação aguda, quer dizer, de casos em que a pessoa entrou em contato com agrotóxico e passou mal. Não estamos falando de doenças crônicas, como o câncer.

Os efeitos agudos podem chegar inclusive à morte?

No período analisado, foram notificadas 25.350 tentativas de suicídio através do uso de agrotóxicos, e 1876 mortes foram registradas. É um escândalo. Dá quase 180 mortes por ano. E uma grande parte dessas é suicídio, o que é mais assustador ainda. Cerca de 75% das mortes ocorrem por suicídio, em praticamente todos os estados. Há hipóteses ainda preliminares para entender isso. Toda a literatura que discute intoxicações por agrotóxicos mostra que a exposição ao veneno leva a alterações neurológicas, a neuropatologias. Depressão e ansiedade são as mais leves. Isso são estudos não só no Brasil, tem também pesquisas no Canadá, Estados Unidos e Espanha que indicam isso. É indecente pensar nessa quantidade de pessoas que se matam usando os agrotóxicos. Por que o agrotóxico para se envenenar, por que usar ele como arma? É uma morte agonizante, os relatos mostram isso. A escolha desse caminho para mim é significativa, o trabalhador usar para causar sua própria morte o instrumento que o subordina, que o deixa doente, que pode levar ao endividamento. Parece aquela história da Índia em que os camponeses se matavam usando o veneno da própria Monsanto, no processo de envenenamento com o algodão transgênico.

São notificações dos trabalhadores ou incluem também suas famílias?

São dos trabalhadores que tiveram contato direto com o veneno. Na verdade, são notificados aqueles que foram levados a um serviço de saúde. Se ele sentiu enjoo, náusea, vermelhidão na pele e nos olhos e não foi para um serviço público, não foi sequer notificado. Mas é possível que os familiares sejam também intoxicados. Isso é uma coisa que se leva pra dentro de casa.

Quem são esses trabalhadores atingidos pelos agrotóxicos?

Desde o camponês pequeno proprietário até um trabalhador contratado por empresas. Desde um piloto de avião que vai pulverizar agrotóxicos até um pequeno produtor, todos estão expostos aos agrotóxicos. E há uma questão nisso: eles conhecem pouco os procedimentos para se proteger. Além disso, os equipamentos são super desconfortáveis, incomodam muito no calor. Mesmo os equipamentos de proteção indicados para a aplicação de agrotóxicos já não são mais plenamente suficientes. Precisamos tomar cuidado com o discurso de culpabilização do trabalhador pelo acidente. Nos boletins de ocorrência que relatam acidentes de trabalho sempre há referências à distração do trabalhador como causa do acidente, como se fosse culpa dele. Como se ele fosse uma máquina de trabalho, que pudesse ficar atento 100% do tempo. Tem muito acidente da construção civil, em que o trabalhar cai, e aparece como descuido. Esse é um discurso que está presente nas indústrias de agrotóxicos. Não está no controle do trabalhador evitar o acidente.

É possível saber como o consumo indireto de agrotóxicos, pela alimentação, pode ter impactos na saúde?

O Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos em Alimentos (Para), ligado à Anvisa e ao Ministério da Saúde, identifica os tipos de agrotóxicos presentes nos alimentos e os efeitos disso. Mas por exemplo, o agrotóxico que na Monsanto eles chamam de “Roundup”, é um herdeiro do agente laranja, que é um desfolhante químico que foi usado na guerra do Vietnã. Ele é absorvido pela pele e se instala na gordura. Ele passa inclusive pela placenta. Tem gente até hoje que nasce, no Vietnã, com má formação por causa disso. Mas precisamos de mais pesquisas para saber como a gente se contamina ingerindo esses alimentos intoxicados.

A senadora Kátia Abreu disse, em cena registrada no filme O veneno está na mesa, de Sílvio Tendler, que os pobres devem comer com agrotóxico e quem tem opção pode comer orgânico. Como contornar essa lógica?

Por que o orgânico é mais caro ainda hoje? Não é porque é mais caro produzir orgânico, nem sempre sua produção é mais cara. O que acontece é que ele é mais raro. Tem um conceito que vem de Marx que é a renda de monopólio. Ele utiliza o exemplo do vinho do Porto: por que se paga caro por ele? Porque Porto só existe em Portugal, só lá produz vinho do Porto. Quando o produto é raro, o preço dele é elevado. Quando surgiram as verduras hidropônicas o preço era alto, havia pouco, depois foi sendo mais produzida e o preço baixou. Os orgânicos ainda são produzidos em menor quantidade do que a agricultura convencional, por isso os produtos são mais caros. Não necessariamente porque demanda mais investimentos para produzir. Mas se chegamos num nível ótimo de segurança alimentar, isso não vai existir.

O que é possível para diminuir o uso de agrotóxicos?

A primeira coisa é a regulamentação. Outra coisa é a necessidade de repensar o padrão. Pensar o que a gente quer para o Brasil, inclusive no padrão de energia. Por exemplo, quando há a transformação da cana em energia, eles chamam de biocombustível, que é um nome bonito, “bio” é vida. Mas não se trata disso: é a transformação de terra e alimento em energia. Temos que mudar o padrão energético. Não podemos ficar pensando alimento como commodity. O problema é aquilo que temos por alimento hoje é mercadoria, negociada na bolsa de mercadoria e futuros, é trocada como qualquer outra coisa. Perdeu o sentido de alimento. O agronegócio tanto é negócio que a Cosan está junto com a Shell agora. Não interessa se é um combustível limpo, interessa é o lucro. O etanol não substitui o combustível fóssil, nem potencialmente. Ou seja, não é alternativa real. Para se ter uma ideia, se os Estados Unidos fossem mudar seu modelo para um tipo de energia gerada através de produtos agrícolas, precisaria de uma área e meia do país. Então na verdade esse tipo de coisa beneficia a um grupo social, os usineiros, os grandes fazendeiros. É um nó para a humanidade. Teria que ter a transformação de todo o modelo. Essa produção agropecuária em larga escala só é vantajosa para um grupo. A grande produção de soja também beneficia apenas um grupo, para nossa alimentação isso é nefasto, para as crianças mais ainda. É uma escolha de caminho. Ainda que seja difícil controlar a situação do agronegócio, tem coisas que são permissivas demais. Para mim, esse caso dos agrotóxicos é assassinato no campo, uma forma de violência indireta, silenciosa e que nos ataca a todos. E quem pode se livrar disso? Quem tem dinheiro pra comprar outra coisa. É uma indecência, um descontrole total. É uma conversa que está começando agora, muito em função dos movimentos sociais organizados que estão puxando isso.

É como se os agrotóxicos fossem uma pontinha pela qual podemos puxar o modelo do agronegócio?

Quando analisamos o mapa dos agrotóxicos no Brasil vemos uma fotografia do agronegócio, do modo como o capitalismo se expande na agricultura. Que recoloca o Brasil numa posição de agroexportador e consumidor de produtos que são inventados em outros países, e a gente fica pagando royalties e sustentando essas mega transnacionais. A utilização vem de muito tempo, mas a atenção vem mais de agora, infelizmente é atual. Isso sem falar nos transgênicos, que enredam o agricultor numa forma sem fim, é quase uma forca. Na medida em que ele compra o transgênico num ano, tem que comprar no ano seguinte, tem que comprar o veneno que adapta a ele e entra num círculo vicioso. E a produtividade do transgênico é grande no primeiro e segundo ano e depois diminui.

Esse pacote ainda é herança da “revolução verde”?

O discurso da revolução verde é que precisamos de maior produção, com pacote tecnológico e químico para ter mais comida para a humanidade. Faz quantos anos isso? 40, 50, 60? Não diminuiu a forme no mundo por causa disso. O Brasil é um dos países que mais tem terra ociosa. Ainda tem muito latifúndio improdutivo. Não é produção o problema, é distribuição de renda. Se pensarmos nas terras agricultáveis do mundo, temos capacidade para alimentar a humanidade. Atualmente, não é a lógica do atendimento das necessidades internas. O Brasil é maior exportador de carne, tem quase a mesma quantidade de bois e de pessoas no Brasil – não é mais, como tem um mito por aí – mas é quase mesma proporção, e mesmo assim a carne é muito cara aqui. É o modelo, baseado em um mercado internacionalizado, que não prioriza a soberania alimentar. Dá para compararmos com a indústria automobilística: foi dada uma grande força para ela se desenvolver nos anos 50 e 60 para poder sustentar a indústria petroleira e de carros e agora vemos seus reflexos. É o mesmo modelo subordinado, de inserção subordinada no mercado internacional e que atinge diretamente a todos. Essa forma de o capitalismo se reproduzir vai acontecer de forma cruel nos países em que tem possibilidade de isso acontecer. Uma agricultura nesse modelo não acontece na Europa.

NOTA DE ESCLARECIMENTO

Brasília, 21 de setembro de 2011

Em relação à audiência sobre demarcação de terras indígenas no estado do Mato Grosso no dia 15 de setembro e às notícias veiculadas na mídia regional, o Ministério da Justiça esclarece:

  • O governador Silval Barbosa e representantes do Estado se comprometeram em formalizar representação ao Ministério da Justiça sobre os problemas alegados em processos de demarcação de terras indígenas;
  • A representação formal do Mato Grosso, assim que recebida, será analisada pela Consultoria Jurídica do Ministério da Justiça;
  • A criação de grupo de trabalho no estado do Mato Grosso sobre o assunto não foi objeto da reunião;
  • A competência legal sobre a demarcação de terras indígenas é da União.

Assessoria de Comunicação Social

Ministério da Justiça

comitês populares da copa

fonte: a copa passa por aqui
http://comitepopularcopapoa2014.blogspot.com/2011/09/comites-populares-da-copa-fortalecem.html


Comitês Populares da Copa fortalecem sua organização nacional


Por Katia Marko – GT Comunicação do Comitê Popular da Copa em Porto Alegre


No final de semana passado (dias 27 e 28/8), representantes de 10 cidades-sedes participaram de uma Plenária Nacional dos Comitês Populares da Copa e das Olimpíadas, em Brasília.

O
 encontro no Centro Cultural Brasília definiu os próximos passos para o fortalecimento da articulação nacional. Além de uma coordenação nacional, com dois representantes por comitê, serão criados grupos de trabalho de comunicação, formação, finanças e jurídico, com um indicado de cada comitê das 12 cidades-sedes. Cada GT terá a tarefa de encaminhar as propostas aprovadas na plenária.

No debate da manhã de sábado, o professor do IPPUR/UFRJ (Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional da Universidade Federal do Rio de Janeiro), Carlos Vainer falou sobre a formação do Estado de Exceção para e após os megaeventos. Segundo ele, os megaeventos esportivos estão relacionados a um novo modelo de planejamento urbano em que a realização de negócios prevalece aos interesses do conjunto da população. Com isso, poucos grupos privados se apropriam do recurso público, enquanto a pobreza é criminalizada.

O que é cidade de exceção?

Conforme explicou Vainer, a chegada, nos anos 1990, dos modelos competitivos empresariais de cidade, colocou como formato ideal de cidade aquela que é capaz de atrair capitais e turistas. Ou seja, uma cidade que funciona como uma empresa, que opera num mercado internacional de cidades-empresas, também concorrendo umas com as outras para se vender no mercado. Esse modelo chegou ao Rio de Janeiro no primeiro Plano Diretor da cidade, na gestão do prefeito César Maia, com a consultoria catalã — porque Barcelona é considerada um exemplo desse tipo de cidade.

O que uma cidade-empresa faz? Ela concorre, por isso tem ser ágil. Como eles dizem, ela tem que aproveitar as oportunidades de negócio. Um plano diretor, que estabelece o que se pode e o que não se pode fazer numa cidade, é um obstáculo a essa flexibilidade, que é condição para se aproveitarem as oportunidades de negócios. Tudo que é regra aparece como obstáculo. Na verdade, o modelo de planejamento é o que, no Banco Mundial, se chama de ‘planejamento amigável ao mercado’ ou ‘planejamento orientado ao mercado’. Não se trata de, como nos anos 50, 60, fazer um planejamento porque o mercado gera imperfeições. O mercado passa a ser a melhor forma de organizar a cidade.

Além disso, com o objetivo de dar visibilidade à luta dos comitês populares da copa,Vainer apresentou a proposta do Portal Popular da Copa 2014 e Olimpíadas 2016 que está sendo desenvolvida pelo IPPUR. Este será um espaço para o debate nacional e um portal de acesso e reunião dos blogs dos estados.

Veja documento da Articulação Nacional Popular sobre os Megaeventos
A realização da Copa do Mundo em 2014 e das Olimpíadas em 2016 é a oportunidade de gerar investimentos que reduzam as desigualdades sociais, com a promoção de melhoria das condições de vida da população brasileira. Mas o que assistimos em nome da realização destes Megaeventos Esportivos é a violação de direitos humanos e sociais. Enquanto os governos, organizações internacionais (FIFA, COI) e empresas envolvidas na promoção dos eventos anunciam os possíveis benefícios, a experiência internacional das cidades e países onde já houve a realização de megaeventos demonstrou que os impactos gerados não significaram melhorias reais nas condições de vida e na ampliação dos direitos de  toda a população, sobretudo das pessoas mais pobres e vulneráveis.

Em muitos casos, estes megaeventos têm gerado efeitos negativos sobre diversos segmentos sociais, especialmente sobre aqueles que historicamente são excluídos/as, como: moradores/as de assentamentos informais, migrantes, moradores em situação de rua, trabalhadores/as sexuais, mulheres, crianças e adolescentes, comunidades indígenas e afrodescendentes, vendedores/as ambulantes e outros trabalhadores/as informais, inclusive da construção civil. As remoções e os despejos forçados destes grupos sociais são as violações mais comuns no Brasil e em outros países sede de megaeventos.

Seus efeitos perversos são particularmente ampliados através da imposição do Poder Público e comitês promotores dos eventos, de um verdadeiro “estado de exceção”, instituído especialmente no contexto dos jogos, que permite a flexibilização das leis e suspensão de direitos antes e durante os jogos, ameaçando, assim, os mecanismos de defesa, proteção social, garantia e promoção de Direitos Humanos.

Já está prevista a quantia de R$ 24 bilhões de recursos públicos (10 vezes o orçamento do Ministério dos Esportes em 2011) nas obras das 12 cidades sedes: Fortaleza, Recife, Natal, Salvador, Manaus, Cuiabá, Rio de Janeiro, São Paulo, Curitiba, Belo Horizonte, Brasília e Porto Alegre. Além deste dinheiro, foi aprovada isenção de impostos para as construtoras dos estádios e dos campos de treinos nas outras cidades que atuarão como apoio à Copa, recebendo as seleções. Ora, por que não isentar de impostos a cesta básica dos/as trabalhadores/as?

Até agora não é evidente que o legado da Copa e das Olimpíadas contribua minimamente para a inclusão social e ampliação de direitos sociais, econômicos, culturais e ambientais. Ao contrário, a falta de diálogo e transparência dos investimentos aponta para a repetição do que ocorreu no período dos Jogos Panamericanos de 2007, quando assistimos ao desperdício de recursos públicos (de acordo com o TCU, mais de R$ 3,4 bilhões foram gastos de forma indevida, mas ninguém foi punido) em obras superfaturadas que se transformaram em elefantes brancos e, tão ou mais grave, o abandono de todas as “promessas” que geraram na sociedade, expectativas de algum “legado social”.

Se forem contabilizados os recursos investidos para a construção de equipamentos para Copa e Olimpíadas, o país poderia diminuir o déficit habitacional, ampliar o acesso aos serviços urbanos básicos, promover melhorias socioambientais, programas de trabalho e renda, investir na saúde pública e na educação. Além disso, poderia construir uma política esportiva que promovesse o esporte amador, além do esporte de alto rendimento e não beneficiar quem faz do esporte,fonte de acumulação de poder e de riquezas.
Neste sentido, apontamos a urgência de mobilizar uma ampla rede de organizações sociais e movimentos populares, sindicatos, órgãos de defesa de direitos e controle do orçamento público, com protagonismo das comunidades direta e indiretamente afetadas para monitorar as intervenções públicas e privadas e  articular ações integradas em torno das seguintes pautas e agendas:

1. Participação / Consultas Públicas: As ações e obras propostas no âmbito dos megaeventos devem ser objeto de amplas consultas e audiências públicas, e os posicionamentos e recomendações definidos nesses espaços devem orientar as ações, garantindo a efetiva participação popular.

2. Transparência e acesso à informação: Os planos, projetos, cronogramas, convênios, contratos e ações promovidas no âmbito da Copa e Olimpíada devem ser de domínio público.

3. Orçamento: Os orçamentos devem ser publicizados e sua execução acompanhada pela sociedade civil. Nenhuma política social, urbana e ambiental pode sofrer cortes em função da necessidade de direcionar recursos para as obras relacionados aos Jogos.

4. Direitos trabalhistas: A construção das infraestruturas e equipamentos, bem como todos os serviços relacionados aos jogos devem respeitar os direitos trabalhistas, possibilitar a inclusão na formalidade do maior número possível de trabalhadores e não perseguir ou criminalizar ambulantes e trabalhadores/as informais, camelos e artesãos.

5. Despejo ZERO na realização da Copa e Olimpíada: Para a realização das obras e dos eventos não devem ocorrer remoções e despejos forçados. Os megaeventos devem realizar obras que prioritariamente proporcionem melhoria na qualidade de vida das pessoas, principalmente, daquelas que se encontram em situação de desigualdade social, garantindo o direito à moradia e o direito à cidade a todos e todas, respeitando a legislação nacional e as recomendações e tratados internacionais.

6.  Não a outras violações de Direitos Humanos: As ações de segurança e intervenção urbanística devem respeitar os direitos humanos, com a intenção de melhorar a realidade urbana e as condições de vida de populações vulneráveis como moradores/as de assentamentos informais e cortiços, mulheres, crianças e adolescentes, trabalhadores/as informais, comunidades indígenas e afrodescendentes, população em situação de rua, artistas populares, dentre outros.

7. Legado social e Ampliação de direitos: O saldo final dos investimentos e políticas de incentivos praticados para viabilizar os megaeventos deve ser de um legado socio-urbano e socioambiantal positivo para toda a sociedade de modo que sejam ampliados os direitos humanos, civis, políticos, sociais, econômicos, culturais e ambientais Para tanto, deve ser construído um Plano de Compromisso em diálogo com as organizações não governamentais, movimentos sociais e comunidades afetadas.

8. Repúdio à “cidade de exceção”: A realização das obras deve observar e aplicar os princípios que constam no Estatuto da Cidade, na Constituição Federal e nos tratados e acordos internacionais, permitindo, assim, a construção de cidades justas, democráticas, sustentáveis e inclusivas e a garantia de direitos historicamente conquistados, além de evitar o endividamento externo e o subsídio às grandes empresas.

9. Em Defesa de uma política esportiva e cultural: Cultura e esporte são elementos essenciais na formação das pessoas. Toda cidade deve ter um amplo projeto de incentivo à cultura popular e ao esporte comunitário. Buscar a integração da saúde, educação e lazer. Defendemos projetos populares e de longo prazo, com investimentos na base em todas as áreas do esporte e da cultura.

Copa e Olimpíadas: vamos jogar limpo.
Participação, transparência, controle social e conquista de direitos.

copa na áfrica do sul

fonte: world de
http://www.dw-world.de/dw/article/0,,15416721,00.html


Sul-africanos relatam a brasileiros desilusões e prejuízos da Copa

 

Um ano depois de terem sediado o Mundial de Futebol, sul-africanos contam como sociedade não se beneficiou do evento. Diálogo entre movimentos sociais quer alertar brasileiros para os riscos.

 
Um ano depois da Copa do Mundo na África do Sul, movimentos de classe sul-africanos têm um parecer sobre como será o evento no Brasil, em 2014: "Os problemas no Brasil deverão ser muito piores. No caso brasileiro, há despejo em massa, muito dinheiro público sendo gasto. Haverá implicações sérias para a sociedade brasileira em termos econômicos". A advertência é de Eddie Cottle, do Building and Wood Worker´s International (BWI), federação internacional que reúne trabalhadores da construção civil.
Isso não quer dizer, no entanto, que a experiência sul-africana tenha sido livre de incidentes. Cottle, que está lançando um livro sobre o legado da Copa 2010, diz que, embora ainda haja o sentimento de orgulho, a população vive uma grande desilusão. "Sediar um evento esportivo dessa magnitude fez com que as pessoas tivessem expectativas altas. Mas um ano depois, ficou claro que não houve ganhos econômicos de verdade."
No fim das contas, a Copa do Mundo somou apenas 0,3% ao Produto Interno Bruto da África do Sul no ano passado, bem inferior à projeção inicial de 3%. Quando o evento acabou, os trabalhadores sul-africanos voltaram à vida de antes, sem sentir melhorias no cotidiano e sem terem mais oportunidades de emprego. "Ficou claro que a Copa do Mundo era um veículo para o setor privado lucrar", completa Cottle.
Perda de oportunidades
A troca de experiência entre os dois países emergentes acontece em níveis diferentes. Enquanto os governos dialogam numa esfera própria, os movimentos civis dos dois países tentam articular estratégias para que a sociedade também desfrute de benefícios duradouros.
Nesta semana, representantes da BWI, da rede internacional StreetNet (que reúne vendedores ambulantes), brasileiros da Central Única dos Trabalhadores (CUT) e da Fase (Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional) além de acadêmicos, se encontram na Alemanha para discutir os ganhos sociais que um acontecimento como o Mundial de Futebol pode trazer.
Nos dois casos, o planejamento para abrigar o evento esportivo terá "custos econômicos inacreditáveis que não são estimados", aponta Norbert Kersting, da Universidade de Münster, que estuda as implicações dos megaeventos. O especialista lembra que os governos sempre colocam muita expectativa de retorno no turismo. "Mas o turismo sozinho não segura uma economia, nós vemos agora os exemplos da Grécia e da Espanha. É preciso ter outros setores produtivos."
Segundo um estudo do governo brasileiro, o país deve receber 600 mil turistas internacionais e arrecadar 3,9 bilhões de reais só com esses visitantes durante o evento. Em 2010, a África do Sul recebeu 373 mil turistas estrangeiros – por outro lado, 483 mil visitantes internacionais estiveram no país em 2007.
Ainda há mais um agravante no caso da África, ressalta Kersting: o potencial de áreas que poderiam se desenvolver, como a têxtil, foi desperdiçado. "Toda a produção de camisas para a Copa 2010 foi feita na China, e não na África do Sul, por exemplo. O país-sede do evento poderia ter produzido os uniformes e a indústria poderia ter usado essa chance para seguir no mercado."
Rumo a 2014
Para dar lugar aos estádios e expansão do sistema de transporte nas cidades-sede no Brasil, famílias estão sendo retiradas de comunidades carentes sem saberem exatamente que futuro as aguarda. "No Morro da Providência, no Rio de Janeiro, antes de as famílias serem despejadas, elas recebem um papel do governo que não tem sequer caráter oficial, dizendo a quantia que irão receber, ou a inclusão de um benefício", conta Rossana Tavares, da Fase.
A arquiteta e técnica da entidade comenta que os atingidos pertencem à classe mais pobre e que, na maioria dos casos, as famílias são despejadas na calada da noite, não sabem a quem recorrer e o caso não aparece na mídia. "Ainda não sabemos exatamente o número de famílias deslocadas. Mas, só no Rio de Janeiro, estimamos que até agora 300 tenham sido despejadas", comentou Tavares.
Ao mesmo tempo, comitês populares se formam nas cidades atingidas e tentam levar suas reivindicações até os governos. "É esse o caminho. E ganha a briga quem gritar mais forte", comentou Leonardo Vieira, da CUT, dizendo que os trabalhadores estão em constante negociação com setores privados e o governo em busca de melhores condições.
Conta a pagar
As reclamações dos sul-africanos, diz Cottle, não foram ouvidas a tempo. No caso dos custos dos estádios, por exemplo, a população sabia que se tratava de uma bomba-relógio. "Há poucas semanas, o ex-presidente da organização da Copa do Mundo na África do Sul pediu desculpas ao país porque os estádios não são sustentáveis como ele havia previsto no planejamento original", revelou Cottle.
Como resultado, conta o líder da BWI, a administração federal planeja aumentar os impostos para arcar com os custos de manutenção de arenas esportivas. A de Cape Town custou aproximadamente 1 bilhão de reais. "Havia um estádio numa comunidade pobre de trabalhadores. Mas a Fifa não queria uma arena esportiva numa área pobre habitada por trabalhadores. Então um novo estádio foi construído do zero", adicionou Cottle, lembrando que história semelhante foi vista no Brasil.
Autora: Nádia Pontes
Revisão: Roselaine Wandscheer

copa e mata nativa

fonte: ihu
http://www.ihu.unisinos.br/index.php?option=com_noticias&Itemid=18&task=detalhe&id=46928


Copa justifica corte de mata nativa, prevê Código
 
A "urgência" das obras da Copa do Mundo foi o motivo apontado para a proposta de autorizar o corte de vegetação nativa em áreas de preservação permanente (APPs) para a construção de estádios e "demais instalações necessárias", segundo a nova proposta de reforma do Código Florestal em debate no Congresso Nacional.

A reportagem é de Marta Salomon e publicada pelo jornal O Estado de S. Paulo, 01-09-2011.

A nova versão da legislação ambiental foi apresentada pelo senador Luiz Henrique(PMDB-SC), relator nas próximas três comissões pelas quais a reforma de Código Florestal será analisada: Constituição e Justiça, Agricultura e Ciência e Tecnologia. A primeira votação foi adiada para o dia 14.

O relatório reverte a principal derrota sofrida pelo governo Dilma Rousseff durante a votação da reforma do Código Florestal na Câmara. A possibilidade de novos cortes de vegetação nativa em áreas de preservação permanente para atividades agropecuárias foi aprovada pela oposição e parte da base governista, no final de maio, diante das ameaças de veto da presidente da República.

A mudança sugerida pelo senador Luiz Henrique impedirá novos cortes de vegetação nativa em remanescentes de áreas de preservação permanentes estimadas em 600 mil quilômetros quadrados - ou mais de duas vezes a área do Estado de São Paulo. As APPsestão localizadas às margens dos rios, a partir da sua largura, e também nas encostas dos morros. O objetivo de sua preservação é assegurar a qualidade dos solos e da água.

A nova versão da reforma do Código Florestal também dispensa os produtores rurais da exigência de recuperar as áreas desmatadas até julho de 2008, data da edição de um decreto, pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva, com punição a quem descumprisse as regras de proteção ao meio ambiente nas propriedades rurais do País.

Segundo cálculo do professor Gerd Sparovek, da Universidade de São Paulo (USP), cerca de 400 mil quilômetros de áreas de preservação permanentes já teriam sido desmatadas. Parte disso seria considerada área consolidada para uso do agronegócio, conforme já previa o relatório aprovado na Câmara, de autoria do deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP).

A regularização ambiental da ocupação de APPs por atividades do agronegócio será feita por meio de programas feitos não apenas pela União, mas por Estados e municípios, como defende o agronegócio, e não a partir de uma regra única, federal.

"Santa Catarina tem áreas de culturas agrícolas alagadas, convivendo com a segunda maior bacia leiteira do País, instalada em área de morros e montanhas. Imagine-se, então, a sua distinção com as peculiaridades dos Estados localizados na Amazônia, nas regiões pantaneiras, nos Pampas e na Serra Geral?", justifica o relator, governador de Santa Catarina na época em que o Estado reduziu as áreas de proteção às margens dos rios. A polêmica ainda está no Supremo Tribunal Federal.

Cortes no futuro

Uma das principais novidades apresentadas pelo relatório de Luiz Henrique é a definição de 20 situações em que poderá haver corte de vegetação nativa em áreas de preservação permanente no futuro.

Na versão anterior, aprovada na Câmara, eram vagas as hipóteses de utilidade pública, interesse social e atividades de baixo impacto ambiental em que a intervenção ou corte de vegetação poderia ser autorizada a partir da reforma do Código Florestal.

Além de obras de infraestrutura destinadas à Copa do Mundo de Futebol, poderão justificar o desmatamento de áreas de preservação permanente os empreendimentos apontados pelo presidente da República ou pelos governadores.

VETO AO CORTE

Na Câmara

A proposta aprovada pela Câmara permitia novos cortes em APPs para atividades agrossilvopastoris, ecoturismo e turismo rural, além de liberar os produtores rurais da recuperação de áreas já desmatadas. Isso colocava em risco mais de 600 mil quilômetros quadrados de áreas preservadas.

No Senado

Relator prevê que o corte de vegetação nativa em APPs só será autorizado em caso de utilidade pública, interesse social ou baixo impacto ambiental. Não será exigida a recuperação de áreas desmatadas até julho de 2008. Libera a recomposição de cerca de 400 mil quilômetros quadrados de áreas desmatadas à beira dos rios ou em encostas de morros. 
 

amazônia

fonte:
http://www.ihu.unisinos.br/index.php?option=com_entrevistas&Itemid=29&task=entrevista&id=47709



29/9/2011



Um quarto da Amazônia sem proteção legal. Entrevista especial com Ennio Candotti e José Antonio de Aleixo da Silva


A ciência e a tecnologia disponíveis atualmente são fundamentais no processo de elaboração de um Código Florestal eficiente, afirmam os pesquisadores da Sociedade Brasileira Para o Progresso da Ciência – SBPC e da Academia Brasileira de Ciências – ABC.

Confira a entrevista.



A mudança em uma expressão no projeto do novo Código Florestal pode deixar 25% da Amazônia sem proteção legal. O alerta é da equipe coordenada pelo Museu da Amazônia – Musa e de pesquisadores do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia – Inpa. Os cientistas solicitam que as áreas sujeitas a inundações da Amazônia e do Pantanal sejam tratadas por uma legislação específica. Em agosto, o grupo entregou um pedido de emenda no Projeto de Lei 30/2011, que trata da revisão doCódigo Florestal.

“A mudança no termo ‘margem média dos rios’, contida no artigo 4º da nova lei, pode deixar até 400 mil km² de floresta sem proteção”, diz Ennio Candotti à IHU On-Lineem entrevista concedida por e-mail. Segundo ele, caso as áreas de florestas alagáveis não sejam incluídas nos dispositivos legais que protegem as florestas, “os ecossistemas ficarão fragilizados com graves consequências para as funções biológicas e climáticas das florestas”.

José Antonio de Aleixo da Silva, membro da diretoria da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência – SBPC, também concedeu entrevista à IHU On-Line sobre as mudanças propostas pelo novo texto do Código Florestal. Para ele, “as dificuldades encontradas nessa discussão são decorrentes da disputa entre agronegócio e ambientalismo. Mesmo com apresentações de nossos resultados realizadas no Congresso (Câmara e Senado), têm prevalecido interesses setoriais que tentam desqualificar nosso trabalho, principalmente com argumentos de que chegamos tarde”.

Ennio Candotti é físico formado pela Universidade de São Paulo – USP e atualmente é professor da Universidade Federal do Espírito Santo e atual presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência – SBPC.

José Antonio de Aleixo da Silva é graduado em Agronomia pela Universidade Federal Rural de Pernambuco – UFRPE, mestre em Ciência Florestal pela Universidade Federal de Viçosa – UFV-MG e Ph.D em Biometria e Manejo Florestal pela University of Georgia. Atualmente é professor do Departamento de Ciência Florestal da UFRPE.

Confira a entrevista.

IHU On-Line – A mudança no termo "margem média dos rios", contida no artigo 4º da nova lei, pode deixar até 400 mil km² de floresta sem proteção. Quais prejuízos para a fauna e flora da Amazônia isso pode acarretar?

Ennio Candotti – O Código Florestal em vigor faz referência às margens altas para definir o leito dos rios. O projeto em tramitação desloca essa margem (art 3º inciso IV) para as margens do leito "regular" não definindo o que seria regular. A Secretaria do Patrimônio da União utiliza a margem alta como referência. Isso significa que o deslocamento dessa margem e redução da extensão das propriedades (e responsabilidades) da União (o leito dos rios pertence à União segundo a Constituição Art. 20) reduzirá o Patrimônio da União em muitos bilhões de reais, fragilizará a proteção e a responsabilidade da União sobre essas áreas e, além disso, propiciará movimentos de ocupação e posse de terras que não mais pertenceriam à União.

Na Amazônia, a extensão dessas terras é da ordem de 300 000 km². Trata-se de uma área de floresta alagada de 400 000 km² (que corresponde às áreas entre as margens altas) menos a área entre as margens "regulares", que se estima ser de 100 000 km²). Nem todas as áreas alagadas correspondem a áreas de floresta como, por exemplo, no Pantanal, que são áreas de cerrados. No Rio Grande do Sul há os dois casos: áreas alagadas de floresta e outras correspondentes a biomas diferentes.

IHU On-Line – Quais resguardos essa área, que equivale ao dobro do tamanho do estado de São Paulo, teria caso fosse garantida a proteção legal?

Ennio Candotti – A proteção ambiental no caso das áreas do Patrimônio da União estaria garantida pela própria propriedade da área de floresta alagável. A essa área deve-se acrescentar uma pequena faixa de 15 metros às margens dos rios, que também é da União. As Áreas de Preservação Permanente deveriam ser medidas a partir dessa faixa marginal aos rios. Não resta dúvida de que o leito do rio deve ser medido entre as margens altas, uma vez que não podemos ter duas linhas de demarcação para o Patrimônio da União: uma para a cheia outra para a vazante. Novamente enfatizo: a questão é muito importante na Amazônia porque a diferença de nível dos rios entre a cheia e a vazante chega a ser de mais de 10 metros na vertical. Em outras partes, essa diferença não chega a ser tão significativa e a margem alta e a "regular" podem estar próximas.

IHU On-Line – Para quando espera a aprovação da emenda no Projeto de Lei 30/2011 encaminhada em agosto? Que embargos políticos o senhor acredita que podem comprometer essa aprovação e por quê?

Ennio Candotti – Não tenho sinal que a emenda tenha sido considerada pela Comissão de Justiça, onde deveria receber a devida atenção por envolver questões de caráter constitucional. Se isso acontecer, temos ainda a possibilidade de submetê-la à Comissão de Ciência e Tecnologia, uma vez que o termo “margem regular” carece do rigor que se exige em uma linha de referência dessa importância. Por outro lado, consultas técnicas poderão confirmar que boa parte da floresta Amazônica se encontra em áreas alagadas periodicamente. Deve-se lembrar que as árvores, quanto têm suas raízes submersas, pausam a respiração, isto é, deixam de absorver e emitir CO². Por essa razão se acredita que, na Amazônia, as emissões e sequestros de CO² estão em equilíbrio.

IHU On-Line – O senhor destaca a importância de um tratamento diferenciado para as áreas úmidas do Brasil. Nesse contexto, partindo do princípio de que o Código Florestal é uma instância federal, como restringir o uso dessas áreas às comunidades tradicionais?

Ennio Candotti – A sua atuação deveria ser regulamentada através de Portarias elaboradas pelos organismos competentes, de acordo com o conhecimento científico à disposição. Em todo caso, deve-se garantir às comunidades tradicionais e aos pequenos agricultores que seja permitido o plantio e a colheita nessas áreas. Elas têm sido dadas em concessão a estas comunidades, preservando à União a propriedade.

IHU On-Line – Caso as áreas de florestas alagáveis não sejam incluídas nos dispositivos legais que protegem as florestas, que reflexos ecológicos, biológicos e econômicos isso pode acarretar?

Ennio Candotti – Creio que os ecossistemas ficarão fragilizados com graves consequências para as funções biológicas e climáticas das florestas. A precipitação é a principal fonte de água na bacia amazônica; cerca de 50% dessa precipitação depende da evaporação e da transpiração da cobertura vegetal. Por outro lado, cerca da metade da precipitação incidindo na bacia é transformada em descarga, indo primeiramente para os pequenos riachos, os igarapés. A trama de pequenos igarapés da bacia amazônica alimenta os grandes rios com seu fluxo de água de diferentes propriedades químicas. Por sua vez, esses igarapés são margeados por florestas que alimentam os organismos aquáticos, mostrando a íntima relação e mútua dependência entre água, floresta eorganismos na Amazônia. Devido a diferenças ao longo do ano no volume da precipitação, o nível dos grandes rios flutua sazonalmente com uma amplitude da ordem de 10 metros na Amazônia Central, podendo chegar a quase 15 metros em outras áreas, implicando uma expansão da cheia de quilômetros nas planícies alagáveis marginais e suas florestas.

No pico da fase de águas baixas, as áreas alagáveis podem ser reduzidas a apenas 20% da área total inundada durante o pico das cheias. Contudo, elas contribuem com 30% do balanço total de água do canal principal do rio, pois a capacidade de estocagem das áreas alagáveis, desde que mantidas com suas florestas associadas, é bem superior à do canal principal. Em nenhum outro lugar do planeta são encontradas florestas que toleram períodos de inundação tão longos, de até 270 dias ao ano, como aquelas encontradas nas áreas alagáveis ao longo dos grandes rios amazônicos. Todos os anos, durante as cheias, quando a água invade as margens laterais, as árvores passam a fazer parte dos corpos de água por vários meses, tendo suas raízes, troncos ou mesmo as copas inteiramente recobertas pela água dos rios associados. Essa vegetação é adaptada a tal situação de inundação, compondo florestas únicas no mundo, com a maior biodiversidade registrada para esses ambientes (mais de 1000 espécies).

A vegetação das florestas alagáveis é também de capital importância para o desenvolvimento e manutenção da biodiversidade amazônica, oferecendo alimento e habitat para vários animais, como peixes, macacos e pássaros. Além disso, um número muito grande de invertebrados terrestres vive permanentemente nas copas das árvores da floresta ou migra para elas no intuito de escapar às inundações. As áreas de florestas alagáveis devem ser incluídas nos dispositivos legais que protegem as florestas, uma vez que a sua devastação ou sua retirada massiva trarão reflexos negativos imediatos à estrutura física e integridade dos processos ecológicos dos ambientes alagáveis, como também à diversidade biológica de toda a região amazônica. As implicações de alterações dessa natureza irão se refletir diretamente nos ciclos climáticos e na redução dos múltiplos recursos naturais explorados pelas populações humanas locais, com reflexos negativos na economia e no abastecimento dos maiores centros urbanos na Amazônia.

IHU On-Line – Qual o papel político da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência – SBPC e da Academia Brasileira de Ciências – ABC em relação ao Código Florestal?

José Antonio de Aleixo da Silva – O papel político da SBPC e da ABC nessa discussão do Código Florestal é, fundamentalmente, mostrar ao Congresso Nacionalque a ciência e tecnologia disponíveis na atualidade devem ser consideradas na elaboração de um instrumento legal eficiente, pois um código que trata das relações entre economia, meio ambiente e sociedade não pode ser tendencioso. Isto é, se não houver equilíbrio entre as partes consideradas, o grande perdedor será o país, pois poderá ser um grande produtor de alimentos causando sérios danos ambientais, ou um país relativamente protegido ambientalmente, mas com falta de alimentos para a população. O equilíbrio é fundamental e a ciência e a tecnologia mostram onde é possível encontrar esse equilíbrio, mantendo-se o elevado nível de produtividade agrícola com sustentabilidade ambiental e social.

IHU On-Line – A comunidade científica se omitiu em relação à discussão atual do Código Florestal? Quais dificuldades encontradas nessa discussão, uma vez que ela abrange diversos setores da sociedade e do governo?

José Antonio de Aleixo da Silva – Desde o primeiro Código Florestal, promulgado pelo decreto 23.793, de 23 de janeiro de 1934 e, posteriormente, a lei 4.771 de 15 de setembro de 1965, houve participação da comunidade científica, que usou o que se tinha disponível nas épocas em termos de ciência e tecnologia. O país cresceu, a ciência e tecnologia avançaram muito e a reformulação do Código Florestal se faz necessária, para se ajustar às condições atuais.

No processo de discussão da reformulação do Código Florestal, as entidades científicas SBPC e ABC não foram consultadas. A organização de um grupo de trabalho foi uma demanda da própria comunidade científica, e como resultado houve a formação de tal grupo em junho de 2010. Após estudos profundos, foi publicado o livro O Código Florestal e a ciência. Contribuição para o diálogo”, lançado em Brasília e entregue a todos os congressistas.

As dificuldades encontradas nessa discussão são decorrentes da disputa entreagronegócio e ambientalismo. Mesmo com apresentações de nossos resultados realizadas no Congresso (Câmara e Senado), têm prevalecido interesses setoriais que tentam desqualificar nosso trabalho, principalmente com argumentos de que chegamos tarde. O fato é que não fomos convidados. Não estamos defendendo o ambientalismo nem o agronegócio, como algumas pessoas afirmam. Achamos que, para se construir um instrumento legal que possa ser Código Florestal, ambiental ou da biodiversidade como muitos defendem, há necessidade de mais tempo para incluir toda a ciência e tecnologia no documento. Infelizmente são poucos representantes no Congresso que concordam com essa posição. A disputa é mais forte do que a racionalidade e isto é muito ruim para o país.

IHU On-Line – Quais são os pontos do Código Florestal que mais geram divergências para aprovação da mudança?

José Antonio de Aleixo da Silva – Na realidade, os pontos que mais geram disputas são de caráter jurídico no que diz respeito à ilegalidade de muitos produtores agrícolas ou da utilização de áreas com produção agrícola em Áreas de Preservação Permanente. Também a possibilidade dos estados terem legislações próprias tem gerado muita controvérsia. Anistia a quem desmatou ilegalmente também é muito criticada pelos movimentos ambientalistas, embora o setor do agronegócio fale que tal anistia não existe. O que realmente falta é bom senso para um acordo entre as partes. Se ambas cederem nos limites possíveis, o Brasil vai construir um instrumento legal equilibrado. Se o acordo não ocorrer, todos sairão perdendo.

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