segunda-feira, 19 de setembro de 2011

Pedro Casaldáliga - carta pastoral 8/8

Fonte:
http://www.prelaziasaofelixdoaraguaia.org.br/uma-igreja-na-amazonia/umaigrejaparte8.htm
Uma Igreja da Amazônia em conflito com o latifúndio e a marginalização social

(parte VIII/8)



NOSSA ATUAÇÃO

A Prelazia conta 7 sacerdotes. O Bispo e quatro padres são espanhóis e Claretianos. Um deles ordenado na própria sede da Prelazia, no dia 7 de agosto deste ano. O novo ordenado e um companheiro, por motivos de estudo e de assistência à própria Prelazia, dirigem provisoriamente uma paróquia em Goiânia. O Bispo e os outros dois padres residem em São Félix.

Dois padres, franceses, de clero diocesano, pertencentes à antiga Prelazia de Conceição do Araguaia, vicularam-se à Prelazia de São Félix, com motivo da ereção da mesma, e residem em Santa Terezinha, faz dezesseis e cinco anos, respectivamente.

Um dado para não esquecer: o Bispo e os padres somos todos estrangeiros.

Na aldeia dos índios Tapirapé vivem - faz dezessete anos - três Irmãnzinhas de Jesus, plenamente encarnadas na pobreza e na simplicidade agrícola dos Tapirapé; sendo testemunho e fermento de Evangelho. Além da total convivência, as Irmãnzinhas prestam aos índios um discreto serviço de assistência sanitárioa e de enfermagem e de promoção pelo exemplo e diálogo.

No dia 16 de fevereiro de 1971, chegaram a São Félix, para trabalhar na Prelazia, cinco religiosas de São José; e em 18 de junho último incorporou-se à comunidade outra irmã. Elas se dedicaram à catequese, enfermagem, ensino e promoção humana em geral. Todas elas são brasileiras.

Uma Irmãnzinha de Jesus, brasileira também, "em experiência de apostolado direto", colabora nas campanhas missionárias.

Tanto em São Félix, como em Santa Terezinha trabalham, vinculados à Prelazia, leigos brasileiros: No ensino "ginásio, primário e alfabetização", nas Campanhas Missionárias, na catequese e na promoção humana. Em São Félix, este ano, leigos "universitários" são cinco. Em Santa Terezinha são cinco também: um casal, três rapazes.

No primeiro período de nossa chegada à missão, percorremos quase todo o território, em repetidas viagens e visitas, por água com muita freqüência. Sertão, beiras dos rios e povoados. Com as extraordinárias despesas que essas viagens significam. Era continuar, talvez com uma evangelização mais esclarecedora, as tradicionais desobrigas...

Assistíamos alguns povoados e algumas fazendas, com certa regularidade, todo mês.

Em 1970, interrompemos quase todas essas viagens. Por exigências do ginásio e pelo próprio descontentamento de um serviço que era rotineiro, ineficaz e até alienante. Independente das possibilidades que nos deu de conhecermos a região.

Nesse ano, estourou o conflito aberto entre a Prelazia - Igreja, devemos dizer - e as fazendas latifundiárias, que se materializou, no mês de setembro, com o relatório "Feudalismo e Escravidão no Norte do Mato Grosso" (cf. Documentação, nº IV, 1). Não era possível ir às fazendas sem coonestar exteriormente a conduta dos donos, gerentes e capatazes. Nem era possível agir com liberdade. Os peões por outra parte, nunca poderiam ser atingidos pelo padre.

Além disso, era preciso refletir, reformular a pastoral toda. Sentíamos o impasse da situação religioso-pastoral do nosso povo. Faltava tudo: em saúde, em ensino, em comunicações, em administração e em justiça. Faltava no povo a consciência dos próprios direitos humanos e coragem e a possibilidade de os reclamar. E o que não faltava era gritante, acusador.

Contra os nosso primeiros propósitos - fruto da velha experiência educacional da Igreja, fruta da própria experiência pessoal - decidimos enfrentar o problema do ensino: e construímos o "Ginásio Estadual Araguaia", de São Félix. Pago, em oitenta por cento (80%) da importância, com donativos dos nossos amigos da Espanha, e sem nenhuma contribuição oficial da Prefeitura, do Estado ou do Governo Federal. Foi uma aventura quixotesca, necessária porém. (As poucas famílias que antes pretendiam por os filhos no ensino médio, deviam mandá-los a Barra do Garças ou a Goiás. E as forças novas da juventude se distanciavam da família e do lugar, provavelmente para não voltar jamais. E toda a renovação humana-social precisaria tanto dessa juventude, mais maleável, mais aberta e crítica!). O Ginásio é Estadual: não queríamos que fosse nem da Prelazia nem de uma Congregação. Com muitas demoras e irregularidades, o Estado paga os professores bem pobremente. Funcionavam no ginásio as três primeiras séries. Por motivos de suplência inicial, um padre teve que aceitar a diretoria e uma irmã é secretária.

Depois de cooperarmos, com pressões e suplências, ao ensino primário de toda a região, este ano uma irmã é diretora do Grupo Escolar de São Félix; e a equipe de Santa Terezinha leva totalmente - "economia, matéria e professorado" - um Grupo Primário particular, e um Curso de Madureza Ginasial Noturno, vencendo as manobras da Prefeitura de Luciara.

Uma irmã enfermeira e outra auxiliar dirigem, a partir do mês de março deste ano, o ambulatório, criado e financiado pela Prelazia de São Félix. Ultimamente recebemos a promessa de uma ajuda econômica da Secretaria de Saúde Estadual de Cuiabá. No primeiro semestre de atuação o ambulatório atendeu 1995 casos. Em Santa Terezinha trabalha há quatro anos, no pequeno ambulatório da missão, uma enfermeira francesa, leiga, (este ano em férias, na França, e ajudada por uma moça do lugar, auxiliar de enfermagem). A partir de julho toma conta do ambulatório um laboratorista. Desde o início da missão - antes mesmo de ser criada a Prelazia - temos dado grande quantidades de remédios gratuitos, com mais ou menos paternalismo, por necessidade vital, na impossibilidade de fazer outra coisa, às vezes.

Na liturgua e na catequese agimos sempre com bastante liberdade, no intuito de adaptarmos ao povo e de traduzir para ele o culto oficial e a palavra tradicional. Demos sempre particular importância, na missa, à Liturgia da Palavra. Celebramos missas com "Liturgias das palavras" preparatórias, tidas no dia anterior. Missas por grupo. "Missas de rua": nos barracões abertos, em âmbito de bairro ou de vizinhança.

Na pastoral dos Sacramentos, depois de ter que "agüentar", nos primeiro meses, os batizados em massa e sem preparação, e os casamentos de gente muito nova e improvisadamente, viemos a exigir preparação e certas condições indispensáveis para os pais e padrinhos dos batizandos, e para os noivos - dos quais exigimos também o casamento civil. Atrasamos a idade para a Primeira Eucaristia e preparamos os candidatos durante tempo prolongado. Nestes três anos de missão, ainda não houve administração de Crisma. Achamos que o povo não está preparado, e queremos que este ao seja precedido de um autêntico catecumenato a posteriori, para possibilitar com isto um compromisso cristão adulto.

No intuito sério de superar a pastoral das desobrigas, iniciamos este anos as "Campanhas Missionárias". Realizamos já a primeira em Pontinópolis, e estamos realizando a segunda em Serra Nova.

A Campanha Missionária é um "tempo forte" de pastoral - três meses - num lugar, e com trabalho em equipe - Padre, Irmãs e Leigo. A equipe missionária se instala numa casa do povo, e procura compartilhar, simplesmente, a vida do lugar, em tudo. Durante a campanha se dão aulas de alfabetização ou Círculos de Cultura; aulas de complementação para adultos e crianças. Acompanha-se o trabalho das professoras locais. Dá-se assistência de enfermagem e se promove uma ação permanente por todos os meios e em toda ocasião de higiene e saúde. Faz-se uma ação intensa de conscientização. E se tem palestras por grupo, sobre os temas vitais do povo do lugar. Três vezes por semana se celebra a eucaristia, em termos bem acessíveis, e com uma temática apropriada na liturgia da palavra e nas orações. Prepara-se os sacramentos do batismo, da penitência, da eucaristia e do matrimônio, com especial dedicação. Com o povo enfrentando-se os problemas e os riscos - às vezes graves - dos direitos dos posseiros frete ao latifúndio (cf. Documentação, nº II, 3. A, B). E tenta-se assentar a vida dos patrimônios numa organização popular básica, humana. Criam-se ou os "Conselhos de Vizinhança" - autoridade popular de uma equipe livremente eleita (que em Pontinópolis, junto com o povo, elaborou a "Lei do Posseiro") (Documentação nº VI) - ou os "Grupos de Liderança". Finalmente organiza-se a "Oração Comunitária dos Domingos", que um grupo do próprio povo dirigirá toda semana, com a sistêmica mensal de algum membro da equipe da Campanha. (Futuramente, nasceriam aí uma "comunidade de base" e umas diaconias locais e, talvez, um sacerdote "indígena...").

Mesmo assim sentimos que a liturgia e a pastoral toda - aqui como em outras partes, certamente - se ressentem de desencarnação, de intelectualismo, de conteúdo e ritmo urbanos e de um europeísmo dominante. Na própria estruturação, na formação que nos condiciona, no "preceito tradicionalista do povo" e na falta eclesial de corajosa criatividade.

Não podemos aceitar a dicotomia entre evangelização e promoção humana, porque acreditamos no Cristo, como o Senhor Ressuscitado que liberta o homem todo e o mundo todo e nos salva em plenitude: progressivamente e dolorosamente aqui na terra, definitivamente e com glória no céu. "Cristo veio ao mundo para libertar o homem de toda escravidão. A comunidade cristã, deve ser para todos os homens um sinal eficaz na realização da justiça, na libertação de toda forma de escravidão e na esperança para cada uma das gerações" (Esquema "A Justiça no Mundo", Synodus Episcoporum, 6).

Para nós, evangelizar é promover o homem concreto - o próximo - e libertá-lo, sempre com aquele "plus" que a encarnação e a Páscoa trazem à pessoa e à historia humanas.

Por causa disso, bem ou mal, com tateios e em conflitos, sempre temos enfrentado a defesa dos direitos humanos e a promoção do povo ao qual fomos enviados. Nas campanhas higiênicas; no ensino - alfabetização em São Félix, em Santa Terezinha. E um conflito declarado da Prelazia com os latifundiários e dos núcleos políticos e de controle econômico da região, fazia de nós todos "subversivos" e "comunistas". E "estrangeiros!"

Os dois primeiros qualificativos da acusação não merecem uma resposta séria, por excessivamente gratuitos e gastos.

Estrangeiros somos, certamente, o Bispo e os padres. Talvez, porém, bastante mais dedicados ao bem do Brasil do que nossos acusadores. E mais desinteressante. Além de que não há homem estrangeiro na terra dos homens, e a Igreja no mundo é em todo lugar nossa pátria.

Depois de vários meses de boatos e calúnias, de ameaças de prisão, de morte, de "descida" da polícia federal e do exército, com prognósticos sucessivamente datados depois de várias tentativas de convencer-nos ou de intimidar-nos por meio de várias tentativas de convencer-nos ou de intimidar-nos por meio de mensageiros pessoais, na primeira semana do mês de setembro último, o Sr. Ariosto da Riva - pai e mentor de latifundiários - acompanhado de um sacerdote religioso, se apresentou ao Senhor Núncio, no Rio, para tentar impedir a minha sagração...


O GRITO DESTA IGREJA

A Igreja é, por natureza, tão católica como local. "A fim de poder oferecer a todos o ministério da salvação e a vida trazida por Deus, a Igreja deve inserir-se em todos esses agrupamentos (humanos), impelida pelo mesmo movimento que levou o próprio Cristo, na encarnação, a sujeitar-se às condições sociais e culturais dos homens como quem conviveu". (Ad Gentes, 10). Cristo continua se encarnando, por ela e com Ela, no mundo concreto dos homens de cada tempo, de cada lugar. Deus ama em singular e com eficácia. A Salvação faz-se presente no dia-a-dia e atinge o homem real, principalmente por meio de sua Igreja - "sacramento universal de salvação" (ID. 1) - na medida em que esta se aproxima do homem - com seu testemunho, com a Palavra "traduzida" e com os Sacramentos vivenciados - e o convida e provoca nele - pela força do Espírito que sempre está pronto para agir - a resposta da Fé que transforma e liberta.

Nós - bispo, padres, irmãs, leigos engajados - estamos aqui, entre o Araguaia e o Xingu, neste mundo, real e concreto, marginalizado e acusador, que acabo de apresentar sumariamente. E somo aqui a Igreja "visível" e "reconhecida". Ou possibilitamos a encarnação salvadora de Cristo neste meio, ao qual fomos enviados, ou negamos nossa Fé, nos envergonhamos do Evangelho e traímos os direitos e a esperança agônica de um povo de gente que é também povo de Deus: os sertanejos, os posseiros, os peões; este pedaço brasileiro da Amazônia.

Porque estamos aqui, aqui devemos comprometer-nos. Claramente. Até o fim. (Somente há uma prova sincera, definitiva, do amor, segundo a palavra e o exemplo do Cristo). Eu, como bispo, nesta hora de minha sagração recebo como dirigidas a mim as palavras de Paulo a Timóteo: "Não te envergonhes do testemunho de Nosso Senhor, nem de mim, seu prisioneiro, mas sofre comigo pelo Evangelho, fortificado pelo poder de Deus" (II Tim 1,8).

Não queremos bancar heróis, nem originais. Nem pretendemos dar lição a ninguém. Pedimos só a compreensão comprometida dos que compartilham conosco uma mesma Esperança.

Olhamos com bastante amor a terra e os homens da Prelazia. Nada dessa terra ou desses homens nos é indiferente. Denunciamos fatos vividos e documentados. Quem achar infantil, distorcida, imprudente, agressiva, dramatizante, publicitária, a nossa atitude, entre na sua consciência e leia com simplicidade o Evangelho; e venha morar aqui, neste sertão, três anos, com um mínimo de sensibilidade humana e de responsabilidade pastoral.

O Vaticano II, Medellín, o Sínodo; a voz das Conferências Episcopais do Terceiro Mundo; o Evangelho - antes e sempre -, não só coonestam como também reclamam essa ação abertamente comprometida. Já passou a hora das palavras (não certamente a hora da palavra), das conivências e das esperas conciliadoras. (Será que alguma vez foi essa hora?). "Quem não está comigo, está contra mim; quem não recolhe comigo, espalha" (Lc 11, 23). "Não basta refletir, obter maior clareza e falar. É preciso agir. Esta não deixou de ser a hora da palavra, mas tornou-se, com dramática urgência, a hora da ação." (Medellín, introdução).

Queremos e devemos apoiar o nosso povo, pôr-nos ao seu lado, sofrer com ele e com ele agir. Apelamos à sua dignidade de filho de Deus e ao seu poder de teimosia e de Esperança.

Chamamos angustiosamente a toda a Igreja do Brasil, à qual pertencemos. Pedimos, exigimos fraternalmente, sua decisão, e a corresponsabilidade plena na oração, no testemunho, no compromisso, na colaboração de agentes e meios pastoral. (Na mente de quase todos os que ainda lutam desinteressadamente, somente a Igreja parece ter uma possibilidade decisiva nesta hora). Da CNBB - na qual agora mais confiamos - pedimos o cumprimento, pronto e eficaz, de um programa decididamente realista no compromisso que ela publicamente assumiu sobre a Amazônia, com caráter de prioridade.

Aos "católicos" latifundiários que escravizam o povo de nossa região - eles mesmos alienados, muitas vezes pela conivência interesada ou cômoda de certos elementos eclesiáticos - pediríamos, se nos quisessem ouvir, um simples pronunciamento entre sua Fé e o seu egoísmo. "Não se pode servir a dois Senhores" (Mt 6, 24). Não lhe adiantará "dar Cursilhos" em São Paulo ou patrocinar o "Natal do pobre" e entregar esmolas para as "Missões", se fecham os olhos e o coração para os peões escravizados ou mortos nas suas fazendas e para a famílias de posseiros que os seus latifundiários deslocam num êxodo eterno ou cercam sadicamente fora da terra necessária para viver. Leiam o Evangelho, leiam a primeira carta de São João e a carta de São Tiago...

É fácil, com muito dinheiro, encobrir com páginas inteiras de jornais, a verdade dos fatos, a realidade. Deus vê. E o povo sabe cada dia mais o que sofre, e não esquece.

Mais uma vez, com maior premência, publicamente, apelamos às supremas Autoridades Federais - Presidência da Republica, Ministérios da Justiça, do Interior, da Agricultura, do Trabalho, INCRA, FUNAI... (nota 10) - para que escutem o clamor abafado deste povo; para que subordinem os interesses dos particulares ao bem comum, a "política da pata do boi" à política do homem, os grandes empreendimentos - sempre mais publicitários - das estradas, ocupação da Amazônia, a Mesopotâmia do gado", a mal chamada "integração nacional do índio" (nota 11), }às necessidades concretas e aos direitos primordiais, anteriores, do homem nordestino, do retirante sem futuro, do homem da Amazônia, do índio, do posseiro, do peão...

Se os incentivos dados - e com fiscalização? - às oligarquias e trutes do sul do país que "ocuparam" esta região, tivessem sido investidos em favor do povo que a desbravou e a habita, a situação conflitiva que " revelamos" aos ingênuos ou interesseiros estaria voltada para um futuro de esperança e desenvolvimento "do homem todo e de todos os homens" deste interior.

As soluções isoladas não resolvem os problemas gerais. E a esmola nunca é solução em sociologia. O conflito Codeara/Santa Terezinha, põe exemplo, depois de 4 anos de titânicos esforços por parte do povo e da "Missão", tentou-se resolver com uma esmola de 5.582 hectares, para o povo dos posseiros, dentro de um latifúndio de mais de 196.000 hectares, e continuando toda a zona urbana do povoado em poder da Companhia.

O que vivemos nos deu a evidência da iniqüidade do latifúndio capitalista, como pré-estrutura social radicalmente injusta; e nos confirmou na clara opção de repudiá-lo.

Sentimos, por consciência, que também nós devemos cooperar para a desmitificação da propriedade privada. E que devemos urgir - com tantos outros homens sensibilizados - uma Reforma Agrária justa, radical, sociologicamente inspirada e realizada tecnicamente, sem demoras exasperantes, sem intoleráveis camuflagens. "Cristo quer que bens e a terra tenham uma função social, e nenhum homem tem direito a possuir mais que o necessário, quando existem outros que nem sequer tem o necessário, quando existem outros que nem tem o necessário para viver. Por isso o Papa Paulo VI, disse: "A propriedade não é um direito absoluto e inalienável" (Popularum Progressio)" (José Manuel Santos Ascarza, Bispo de Valdivia, Presidente da Conferência Episcopal do Chile, em carta à Organização dos Camponeses de Linares, em 19/5/70).

A injustiça tem um nome neste terra: o Latifúndio. É o único nome certo do Desenvolvimento aqui é a Reforma Agrária. (E segundo Paulo VI, na "Populorum Progressio", "o Desenvolvimento é o novo nome da paz"...).

Esperamos que nenhum cristão com vergonha caia no cinismo de qualificar este documento como subversivo. Nos reportamos, mais uma vez, ao Evangelho. E também ao Vaticano II, a Medellín e ao último Sínodo. "O testemunho (função profética) da Igreja frente ao mundo, terá bem pouca ou nenhuma validade se não der, ao mesmo tempo, a prova de sua eficácia no seu compromisso pela libertação dos homens mesmo neste mundo. Por outra parte, a Igreja poderá fazer os maiores esforços para defender a verdade de sua mensagem, mas se ela não a identificar com um amor comprometido na ação, esta mensagem cristã corre o risco de não mais oferecer ao homem de hoje nenhum sinal de crediabilidade" (Esquema "A Justiça no Mundo", Synodus Episcoporum, pág. 46).

Estas páginas são simplesmente o grito de uma Igreja da Amazônia - a Prelazia de São Félix, no noroeste de Mato Grosso - em conflito com o Latifúndio e sob a marginalização social, institucionalizada de fato.

Não deixamos de ver o que é belo na natureza ou no progresso da Amazônia, nem subestimamos o que o Governo do Brasil ou os particulares fazem de bom nesta região infinita. Há poesia publicidade em abundância para cantar tudo isso. O que nesta nossa Amazônia é trágico, o que nela se faz erradamente, ou se omite, o que já não se pode mais tolerar, isso é que nós - Por dever pastorear e por solidariedade humana - devíamos publicar. Dizer a verdade é um serviço. E o propósito de dizer a verdade nos faz livres.

Nossa amargura não é falta de Esperança. (Só a alienação ou o egoísmo podem viver comodamente felizes - no meio da injustiça estabelecida). Sabemos de Quem nos fiamos (II Tim. 1, 12). Sabemos que "lá onde o pecado ameaça a libertação e a humanização da vida, Deus nos envia seu Filho Único com o fim de libertar o coração humano do egoísmo e do orgulho" e que "é precisamente aqui, na encarnação, onde se encontra o fundamento máximo da esperança para o homem e seu universo". "... É no seu Espírito e na sua Igreja que Ele (o Cristo) oferece aos homens esta luz de que precisam, esta confirmação dos valores humanos de dignidade e fraternidade, esta coragem para praticar mais, sabemos que "a justiça que os homens realizam neste mundo chega a ser uma antecipação da esperança final" (Esquema "A Justiça no Mundo", 56 e 57).

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Notas:

10- À SUDAM, infelizmente, não podemos apelar, pois até o momento mostrou-se exclusivamente a serviço do latifundiário.

11- Somos os primeiros a reconhecer a necessidade das estradas, do desenvolvimento da Amazônia, e da verdadeira integração do índio. Sabemos, também, valorizar, em termos nacionais e internacionais, a pecuária. O que não podemos admitir á a inversão dos valores.


~ Gregory Colbert

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