domingo, 28 de setembro de 2014

Sema retoma plano de liberar garimpos

diário cba
http://www.diariodecuiaba.com.br/detalhe.php?cod=459195

Sema retoma plano de liberar garimpos

Nova investida da Secretaria Estadual do Meio Ambiente (Sema) para abrir mineração no entorno do Parque Estadual surpreende promotor 


Na sua redação atual, o Plano de Manejo da unidade veda expressamente as atividades de mineração dentro da chamada zona de amortecimento
RODRIGO VARGAS
Da Reportagem

A proposta que prevê a liberação de garimpos no entorno do Parque Estadual do Cristalino (entre Alta Floresta e Novo Mundo, no extremo-norte do Estado) foi retomada por iniciativa da Secretaria Estadual do Meio Ambiente (Sema).

Derrubada em junho após intervenção do Ministério Público Estadual, a medida foi reapresentada na semana passada pela secretaria, em reunião do Conselho Consultivo da unidade, na Câmara Municipal de Novo Mundo.

De acordo com a ata da reunião, à qual o Diário teve acesso, a defesa da alteração do Plano de Manejo da unidade, uma das mais ricas em biodiversidade da Amazônia, coube principalmente ao Secretário Adjunto de Mudanças Climáticas, Wilson Gambogi Pinheiro Taques.

Segundo ele, a liberação dos garimpos atende a uma deliberação das prefeituras de Alta Floresta, Novo Mundo e Carlinda. Não foi a Sema quem propôs a abertura para a mineração (...) e sim uma demanda apresentada pelos órgãos públicos, disse o secretário, segundo trecho da ata.

Na sua redação atual, o Plano de Manejo da unidade veda expressamente as atividades de mineração dentro da chamada zona de amortecimento. Na nova redação defendida pela Sema, os garimpos e outras atividades de mineração passam a ser permitidos, após licenciamento.

Qualquer tipo de atividade que atinja negativamente o parque, não será feito o licenciamento, disse o secretário, na ata.

Em abril, pouco antes da primeira tentativa de levar adiante a alteração, o conselho consultivo da unidade sofreu uma intervenção direta do governo do Estado. Entidades que se notabilizaram internacionalmente pela defesa do parque, como a ONG ICV (Instituto Centro de Vida) e a Fundação Cristalino, ficaram de fora da nova composição.

A convocação para a reunião na qual foi eleito o Conselho Consultivo do Parque Estadual do Cristalino foi realizada com base em uma lista fechada de representantes, definida sem qualquer critério aparente, avaliou o promotor Domingos Sávio Barros de Arruda, à ocasião.

Para Barros de Arruda, a decisão de permitir garimpos no entorno do parque havia sido tomada sem estudos técnicos e aprovada por um conselho constituído de forma restritiva e discriminatória e, portanto, sem legitimidade.

Ao adotar esta estratégia de convocação, o secretário [Wilson Gambogi Pinheiro Taques, Adjunto de Mudanças Climáticas] privilegiou algumas entidades e impediu a livre participação de outras tantas que teriam direito, avaliou o promotor.

Em junho, a secretaria acatou uma recomendação do MP, suspendeu a alteração e ainda anulou o ato que deu posse a uma nova composição do Conselho Consultivo do parque.

DEDICAÇÃO

Ontem, ao ser questionado a respeito da nova investida da Sema, o promotor se disse surpreso com a notícia. Eu não fui informado desta reunião e muito menos a respeito de uma nova tentativa de alterar o plano de manejo, disse.

Segundo ele, a insistência oficial no tema revela uma distorção no papel atualmente exercido pelo órgão de proteção ambiental.

É incrível a dedicação da Sema em liberar atividades impactantes, em vez de zelar pela preservação. A situação é mais absurda quando o que está em jogo é o futuro de áreas de grande riqueza biológica, como é o caso do Cristalino.

A reportagem não conseguiu contato com o secretário-adjunto Wilson Taques.

sexta-feira, 26 de setembro de 2014

Agricultura familiar e meio ambiente

adital
http://site.adital.com.br/site/noticia.php?boletim=1&lang=PT&cod=82671

Agricultura familiar e meio ambiente

Selvino Heck
Adital
Sou, com orgulho, filho de agricultores familiares. Meus irmãos mais novos, Elma e Marino, junto com mamãe Lúcia, trabalham na roça. Todas as quartas-feiras e sábados vendem o que plantam e produzem na Feira do Produtor. Fui criado cercado por árvores e natureza desde sempre. Ao lado de casa, Vila Santa Emília, Venâncio Aires, interior do interior do Rio Grande do Sul, um bosque enfeita o ambiente. Lá, crianças, íamos fazer piqueniques, quando tios, tias e suas enormes famílias visitavam a avó Gertrudes. Fazíamos uma limpeza geral, abrindo corredores até o centro do bosque, onde um taquaral imponente dava sombra. Um pinheiro, que infelizmente morreu de velho, servia seus pinhões no inverno, que cozíamos ou assávamos na chapa quente do fogão a lenha. Nos fundos do bosque, uma fonte fornecia a água para os animais. A cisterna recolhia a água da chuva e provia os humanos.
Em 2014, estou Secretário Executivo da Comissão Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica (CNAPO). Leio a manchete de um jornal do sul: "USO DE VENENO CRESCE TRÊS VEZES MAIS DO QUE LAVOURA – Em cinco anos, área plantada aumentou 6%, enquanto venda de agrotóxicos subiu 22%. Gaúchos usam quase o dobro da média nacional.” Segue a matéria: "O alerta de ambientalistas e entidades ligadas à saúde sobre o risco maior de químicos na agricultura é sustentado por dados. Segundo estatísticas de safra do IBGE e de comercialização do Sindicato Nacional da Indústria de Produtos para Defesa Vegetal (SINDIVEG), nos últimos cinco anos a venda de agrotóxicos subiu 22,1%, três vezes acima do crescimento da área cultivada. Se comparado ao avanço da produtividade, é quatro vezes maior, indicando abuso na aplicação dos produtos” (Zero Hora, 25.11.2013).
O Brasil é o segundo maior consumidor de agrotóxicos do planeta, um pouco atrás dos EUA. Entre os 50 tipos de agrotóxicos mais utilizados nas lavouras brasileiras, 22 são proibidos na União Europeia. Segundo o Observatório da indústria de agrotóxicos da Universidade Federal (UFPR), na última década o consumo de defensivos disparou no país. De 2001 a 2010, o faturamento da indústria do setor aumentou 215%, enquanto a área plantada subiu 30%. Para Victor Pelaez Alvarez, coordenador do observatório, "estão usando de forma preventiva. É como fazer quimioterapia para prevenir o câncer”.
2014 é o Ano Internacional da Agricultura Familiar, Camponesa e Indígena (AIAF). O Comitê Brasileiro do AIAF fez um plano de trabalho, com objetivos, avanços e desafios:
- Difusão e implementação das Diretrizes Voluntárias sobre Governança responsável da Posse da Terra, dos Recursos Pesqueiros e Florestais no Brasil;
- Elaboração, em diálogo com os movimentos sociais e órgãos relacionados, um Plano Safra para os Biomas Amazônia e Cerrado, adequando os instrumentos e políticas às características ao padrão de uso e gestão dos recursos naturais pelos extrativistas, povos e comunidades tradicionais e à consolidação da produção sustentável;
- Elaborar e implementar um programa dirigido ao desenvolvimento do extrativismo com a adequação dos instrumentos às especificidades de cada bioma;
- Aprofundar e implementar o Plano Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica - Brasil Agroecológico -, lançado pela presidenta Dilma Rousseff em outubro de 2013;
- Criação e efetivação de um Programa Nacional de Redução de Uso dos Agrotóxicos, como previsto no Brasil Agroecológico (Aprovado em agosto pela Comissão Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica e em apreciação pelo governo federal).
A agricultura familiar, camponesa e indígena é parte fundamental na construção de um Brasil Agroecológico. A Agroecologia é ou pode ser a base, o fundamento de uma nova utopia real. Utopia que aponta horizontes a serem alcançados. Real porque com os pés no chão da vida e da realidade.
Leonardo Boff, falando da ecoteologia da libertação, ecologia como grito da terra e grito dos pobres, disse no Congresso Brasileiro de Agroecologia: "Estamos num momento crítico da história da Terra e da Humanidade. Precisamos fazer uma escolha. Ou cuidar de nós e dos outros, ou arriscar em destruir a humanidade. A agroecologia é um novo começo com outro olhar: ver a Terra como nossa Mãe. A centralidade é a vida humana. A economia e a política devem estar a serviço do sistema vida. Somos chamados a irradiar como estrelas.”
A agricultura familiar, camponesa, indígena, extrativista, ribeirinha, quilombola é responsável por 70% dos alimentos que chegam à mesa de brasileiras e brasileiros. O cineasta Sílvio Tendler, autor dos filmes O Veneno está na Mesa 1 e 2, disse, quando do lançamento do segundo filme: "Não tem sentido você construir uma economia baseada na destruição da natureza. Isso não é economia. Isso é catástrofe. Você criar um modelo econômico perverso, isso não é o país que a gente está construindo. Eu acho a agroecologia fundamental como forma de produção econômica, social e de desenvolvimento.”
Estamos em tempos de pensar a vida, o futuro, o planeta terra, a humanidade. O papa Francisco está preparando uma encíclica sobre ecologia e meio ambiente, sobre o tema da Terra como casa da humanidade, uma ecologia centrada no ser humano. "A Amazônia deve ser desenvolvida, sem dúvida, mas sem perder sua vocação de ser um grande presente da natureza para toda a humanidade.”
O sociólogo Pedro Ribeiro aponta que "a consciência planetária é um fenômeno recente. Começa a ganhar forma no final do século XX. Este tipo de consciência é algo novo e diferente no pensamento, da cultura, da ciência e dos valores, o que aponta para um novo paradigma de civilização ocidental. A consciência planetária propõe uma relação de igualdade entre os humanos e a totalidade dos componentes do planeta Terra, e visa a repensar a relação entre o ser humano e a natureza, e para isso torna-se necessário ir além da ciência produzida pelo Ocidente, sem, contudo, menosprezá-la”.
No lançamento do Brasil Agroecológico, a presidenta Dilma Rousseff falou: "Em todo mundo há uma coisa acontecendo: a consciência cada vez maior da importância da agroecologia, da agricultura orgânica e do acesso e proteção, não só dos alimentos, mas também da água. Tem a ver com aquela consciência que encontramos na Rio+20, que levou a gente a construir a frase: é possível um país crescer, distribuir renda e incluir. E é possível que esse país seja um país que conserva e protege o meio ambiente. Por isso, vamos trabalhando juntos, vamos lutar por uma agricultura sustentável e garantir que esse projeto, o Brasil Agroecológico, seja uma conquista e uma vitória nossa.”
Estou com D. Guilherme Werlang, bispo de Ipameri, Goiás, que disse numa Romaria da Terra no Rio Grande do Sul: "Tem gente que, quando mexe na terra, diz que sujou as mãos. A terra não suja as mãos de ninguém porque ela é santa, como Deus afirmou a Moisés. A terra só será suja quando nós, seres humanos gananciosos, a sujarmos com veneno, agrotóxicos, plásticos, poluições das mais diversas. Nós, infelizmente, temos o poder de sujá-la, de prostituí-la e mesmo de matá-la. A palavra hoje é: coragem, sonho, esperança. O mundo poderá ser o Paraíso sonhado por Deus no ato da criação.”
*Publicado em Amazônia, nº44, 2014.

Selvino Heck


Diretor do Departamento de Educação Popular e Mobilização Cidadã e Secretaria Geral da Presidência da República. Membro da Coordenação Nacional do Movimento Fé e Política e Secretário Executivo da Comissão Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica (CNAPO)

Após resultado positivo, movimento pela reforma política luta por plebiscito oficial

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http://site.adital.com.br/site/noticia.php?lang=PT&cod=82673

Artigos - Opinião
26.09.2014
Após resultado positivo, movimento pela reforma política luta por plebiscito oficial

Marcela Belchior
Adital
Após o resultado positivo doPlebiscito Popular por Constituinte Exclusiva e Soberana do Sistema Político, no qual 7,7 milhões de brasileiros votaram em favor da proposta, o movimento deve, agora, encaminhar a escolha da população aos três poderes do Estado do Brasil: Executivo, Legislativo e Judiciário. Em entrevista à Adital, o advogado Ricardo Gebrim, membro da coordenação nacional da campanha pelo Plebiscito, afirma que o próximo passo é pressionar o Congresso Nacional a possibilitar que uma consulta oficial seja realizada no país.
"Nós queremos a aprovação de um plebiscito oficial com a mesma pergunta do popular. Isto somente pode ser aprovado pelo Congresso Nacional, por meio de Decreto Legislativo. Então, vamos exigir da Câmara dos Deputados que discuta e o aprove”, aponta Gebrim. De acordo com ele, a entrega do resultado aos três poderes que estruturam a política brasileira será realizada nos próximos dias 14 e 15 de outubro, em Brasília, capital do país, dirigida à Presidenta da República, Dilma Rousseff; ao presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Ricardo Lewandowski; e ao presidente do Congresso Nacional, Renan Calheiros.
Na mesma ocasião, acontecerá a Plenária Nacional (a 5ª plenária da campanha), que pretende reunir entre 1,5 mil e 2 mil participantes dos comitês de campanha de todo o Brasil para discutirem os próximos passos do movimento. O Plebiscito Popular foi realizado entre os dias 1° e 08 de setembro deste ano, levantando quase 8 milhões de votos em todo o país. Um total de 97,05% dos participantes votaram "sim” à proposta, enquanto 2,57% disseram "não” à Constituinte. Brancos (0,2%) e nulos (0,17%) não chegaram a 0,5%.
Os números foram divulgados nesta quarta-feira, 24 de setembro, em entrevista coletiva, que reuniu Vagner Freitas, presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT), João Paulo Rodrigues, um dos coordenadores nacionais do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), e Paola Estrada, integrante da Secretaria Operativa Nacional do movimento.
Avaliação da organização
Ainda que o objetivo inicial fosse atingir a marca dos 10 milhões de votantes em todo o país, a organização da consulta popular avalia o Plebiscito como vitorioso, superando as expectativas de participação nos vários estados brasileiros. "É um resultado extraordinário, principalmente por ter sido ignorado pela mídia”, afirmou Vagner Freitas, durante a coletiva.
"O (governador Geraldo) Alckmin [do Estado de São Paulo] come um pastelzinho ou toma um cafezinho e vira notícia na mídia. E sobre o plebiscito, que foi apoiado por vários candidatos a Presidente da República, não saiu nada”, acrescentou Paola, criticando a agenda da mídia hegemônica.
João Paulo Rodrigues ressaltou três conquistas da consulta: a demonstração da sociedade de que quer mudanças no sistema político, a grande mobilização em torno do tema e a geração de incentivo para a continuidade da articulação dos movimentos sociais pela reforma política. Apesar da convocação de um plebiscito ser atribuição do Congresso Nacional, Rodrigues diz acreditar que seja possível.
"Nossa disputa será juntamente com a sociedade. Com as forças organizadas e mobilizadas vamos criar um clima e um debate por um novo processo constituinte e não deixar a questão só com o Congresso”, explicou o dirigente do MST.
Leia também:
Milhões de brasileiros e brasileiras já votaram no Plebiscito Popular pela reforma política
Coalizão pela Reforma Política: fim do financiamento de campanha por empresas será a grande conquista
Millones de brasileros y brasileras votaron en el Plebiscito Popular por la reforma política
Coalición por la Reforma Política: el fin del financiamiento de campaña por parte de empresas será la gran conquista

Marcela Belchior

Jornalista da ADITAL

Educação, alegres estatísticas e impasses reais

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http://outraspalavras.net/brasil/educacao-alegres-estatisticas-e-impasses-reais/

Educação, alegres estatísticas e impasses reais

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Em duas décadas, Brasil multiplicou acesso ao ensino e recursos para financiá-lo. De nada adiantará, se não enfrentarmos desafios da inovação e qualidade
Por Cleomar Manhas
A política de educação no Brasil avançou significativamente, nas duas últimas décadas. O acesso à escola foi praticamente universalizado, na faixa etária compreendida entre 6 e 14  anos (ensino fundamental). Ampliou-se, também, entre 15 e 17 anos a partir da vigência do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento  da Educação Básica e Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb), em 2006. E com a aprovação da Emenda Constitucional 59, de 2009, que torna obrigatória a etapa da educação infantil intitulada de pré-escola, a demanda por matrículas entre 4 e 5 anos de idade terá de ser integralmente atendidas até 2016.
Apesar de ainda termos cerca de 3% de crianças fora da escola, na faixa etária compreendida entre 6 e 14 anos e um número maior entre 4 e  6 e entre 15 e 17 anos, pode-se dizer que o direito à educação tem sido contemplado, mas também é preciso perguntar como este direito é atendido.
Precisa-se, então, qualificar o direito à educação, para atingir o que se denomina por educação de qualidade, que, de acordo com estudantes de ensino médio do Distrito Federal significa: “Aquela que fortalece a identidade e estima dos/das estudantes; que é participativa e coletiva; com pluralismo étnico-racial e combate às discriminações; que estimula a diversidade de corpos, amores, solidariedade; que ao invés de conservar, liberta”.
E disseram mais, que para se ter educação de qualidade necessita-se de “direito à cidade”; ataque aos preconceitos; “educação para além das escolas”; “ser direito e não ser comercializada”; “estímulo à cidadania”; “consciência ambiental”. E que educação de qualidade não existe hoje. Apesar de avanços educacionais, precisa-se de uma reforma ampla nas formas de ensino e aprendizagem para que se possa atingir este objetivo.
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Para entender os motivos que levam cerca de 50% dos estudantes que ingressam na escola não acessarem o ensino médio ou abandonarem esta etapa antes de concluída, o Inesc — Instituto de Estudos Sócio-Econômicos — realizou, em parceria com o Unicef, oficinas em quatro escolas de Brasília com o intuito de escutar os próprios adolescentes. E o que se ouve o tempo todo é que se faz necessária uma reforma do ensino, outras metodologias, outros currículos, outras abordagens, pois a escola está ficando na estrada. Há novas maneiras de ver e fazer coisas, novas visões de mundo e a instituição escola se dá ao direito de não percebê-las.
Nas oficinas, foram utilizados materiais produzidos pela campanha realizada pelo Unicef, em parceria com a Campanha Nacional pelo Direito à Educação, “Fora da Escola Não Pode e na Escola sem Aprender Também Não”. Com base em dados do IBGE, constatou que o perfil de quem está excluído ou com risco de abandonar a escola é formado majoritariamente por jovens do sexo masculino, negros, que  vivem em famílias de baixa renda e tem pais ou responsáveis com pouca escolaridade.
O mais curioso, ou corroborador desse relatório, é que as pesquisas realizadas nas quatro escolas de ensino médio do DF encontraram dados semelhantes, com base na percepção de parte da comunidade escolar das quatro diferentes regiões de Brasília: Plano Piloto, Gama, Guará (que atende em maioria alunos da Cidade Estrutural) e Paranoá.
E como se pode verificar, os achados de pesquisa dialogam com as desigualdades brasileiras, de renda, de raça/cor, de escolaridade, sem falar que quando se olha mais detidamente veem-se estampadas também as desigualdades regionais. Seja com relação às diferentes regiões do Brasil, seja nas diferentes regiões das áreas metropolitanas. Por exemplo, na pequena amostra brasiliense percebe-se as maiores dificuldades de aprendizagem entre os estudantes da Estrutural, por ser a região que abriga o lixão do Distrito Federal e sua população ser formada por maioria de catadores de materiais recicláveis, quase todos negros, com baixíssima ou nenhuma escolaridade e renda.
Portanto, sem medo das generalizações, o que ficou claro no processo de formação e pesquisa com os adolescentes, constatado no relatório gerado, é que o necessário para promover uma revolução na educação pública, além dos recursos pelos quais se mobilizou durante o processo de votação do Plano Nacional de Educação no Congresso Nacional, é leveza de alma para mudar. Propor novos currículos, repensar o que se acredita ser disciplina e a que e a quem ela serve, perceber as mudanças culturais que estão acontecendo em velocidade máxima e discuti-las no âmbito das mudanças curriculares.
Além de dialogar com a sociedade sobre as desigualdades. Ou, assumir as desigualdades para resolvê-las. Para isso, não bastam ações governamentais, mas algo no âmbito da própria educação e da cultura. Já há várias iniciativas em curso, como as cotas raciais, a proposta de criminalização da homofobia (que ainda não se conseguiu), as cotas universitárias para alunos de escolas públicas, programas como Prouni, por exemplo. No entanto, isso não basta, é preciso, acima de tudo, que governos e sociedade, como um todo, revejam princípios e saiam para além de suas cercanias. Reflitam sobre anos de violações de direitos e queiram outros modelos e outras práticas.
É preciso tirar o véu que encobre fatores promotores e reforçadores de novas e velhas formas de desigualdades, que passam pela manutenção de privilégios para poucos iluminados, que continuam resolvendo processos eleitorais por meio de financiamento de campanhas políticas, por exemplo. Ou a coleção de impostos regressivos, que faz com que aqueles que ganham até três salários mínimos comprometam 50% da renda com tributação indireta. Com opções de políticas culturais que continuam a favorecer os mesmos em detrimento das manifestações locais. Ou quando pensam em dar acesso à cultura  propõem levar cultura até a favela e não em contribuir para que a cultura da favela se mantenha viva.
Para que a educação se realize como educação de qualidade é preciso, de fato e não apenas no discurso, que parte da sociedade que perpetua preconceitos e agudiza desigualdades, se conscientize de que direitos são para todas as pessoas e não apenas para os “humanos direitos”.

Operários mortos e desaparecidos em obras das usinas de Jirau e Santo Antônio

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http://www.correiocidadania.com.br/index.php?option=com_content&view=article&id=10090:submanchete260914&catid=72:imagens-rolantes

 Operários mortos e desaparecidos em obras das usinas de Jirau e Santo Antônio


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ESCRITO POR JULIO CESAR DE CASTRO   
SEXTA, 26 DE SETEMBRO DE 2014

Nos canteiros de obras das usinas de Jirau e Santo Antônio, no Rio Madeira, em Rondônia, e na obra de instalação do linhão de transmissão de energia elétrica (Porto Velho-Araraquara), 41 operários tiveram suas vidas ceifadas no período de 2010 a 2014, e dez operários estão desaparecidos desde a brutal repressão à greve de abril de 2012. Ressalte-se que essas 41 mortes são as que foram noticiadas. Os operários denunciam a ocorrência de muitos outros casos de acidentes, desaparecimentos, mutilações e mortes que são encobertas nas obras das usinas do Madeira e do linhão. Relatam também que muitas mortes por malária não vieram a público.

Os 10 trabalhadores da obra de Jirau que estão desaparecidos desde abril de 2012 constam na denúncia do promotor Rodrigo Leventi Guimarães – (ação penal nº 0004388.89-2012-822-0501 – TJRO) – como “recolhidos no Pandinha” (presídio em Porto Velho) e integram uma lista de 24 operários injustamente acusados, após a greve, dos supostos crimes de “incêndio”, “dano”, “extorsão”, “constrangimento ilegal” e até de “formação de quadrilha ou bando” e de “furto qualificado”.

Audiência de instrução e julgamento ocorreu no dia 25 de setembro de 2014 na 1ª Vara Criminal do Fórum de Porto Velho, às 11h:30m, enquanto permanecem desaparecidos (e sem qualquer esclarecimento por parte do Estado) os operários: José Ribamar dos Santos, Leonilson Macedo Farais, Herbert da Conceição Nilo, Sebastião da Silva Lima, Antônio da Silva Almeida, Lucivaldo Batista Moraes Castro, Ismael Carlos Silva Freitas, Antônio Luis Soares Silva, Cícero Furtado da Silva e João de Lima Fontinele.

No tendencioso processo que visa transformar vítimas em réus e criminalizar a justa greve dos operários, o Judiciário de Rondônia cerceia a convocação e audiência de testemunhas de defesa, enquanto aceita todo tipo de gestão da Camargo Corrêa para enquadrar os operários como “vândalos e criminosos”.

A Camargo Corrêa e o consórcio ESBR são quem deveriam ser investigados pela autoria e execução do incêndio que, estranhamente, só destruiu os alojamentos e pertences dos operários. A Camargo Corrêa tinha interesse no incêndio para acabar com a greve, açular a polícia contra os operários, caracterizá-los como “bandidos e vândalos” para assim retirar o cunho trabalhista dos eventos, justificar a repressão e também agregar argumentos na demanda judicial, que trava pelo pagamento de seguro em cortes internacionais. A Camargo Corrêa pede R$ 400 milhões, mais perdas alegadas pelo atraso da obra, que podem totalizar cerca de R$ 1 bilhão; e só caracterizando a situação como de origem criminosa que teria direito ao recebimento dos valores.

O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) é o maior financiador dessas obras das UHEs de Jirau, Santo Antônio e do linhão, combinando financiamento direto com repasses através de outras instituições financeiras, sobretudo Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal.

O proprietário da UHE de Jirau é o consórcio “Energia Sustentável do Brasil (ESBR)”, formado majoritariamente pelas empresas transnacionais, a francesa GDF SUEZ (40%) e a japonesa Mitsui (20%), mais as brasileiras Eletrosul (20%) e a Companhia Hidroelétrica do São Francisco – Chesf (20%). A construção está a cargo das empresas Construções e Comércio Camargo Correa S/A, Enesa Engenharia S/A, J. Maclucelli e várias subcontratadas. O custo de R$ 8,7 bilhões, previsto inicialmente, já ultrapassou R$ 17,4 bilhões.

O proprietário da UHE de Santo Antônio é o consórcio “Santo Antônio Energia”, formado pelas empresas Furnas Centrais Elétricas (39%), Caixa FIP Amazônia Energia (20%), Odebrecht Energia do Brasil (18,6%), SAAG Investimentos (12,4%) e Cemig Geração e Transmissão (10%). A construção está a cargo das construtoras Odebrecht, Andrade Gutierrez e outras mais de 50 subcontratadas. O custo saltou de R$ 9,5 bilhões, previsto inicialmente, para R$ 19,2 bilhões em fevereiro de 2014.

Os acidentes, desaparecimentos e mortes ocorridas nas obras das usinas hidrelétricas do Rio Madeira são tratados com total falta de transparência pelas empresas dos consórcios construtores e pelo governo. Denúncias de torturas, tráfico de pessoas, maus tratos e mortes já foram levadas à Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados, CPI do Tráfico de Pessoas e a Secretaria Nacional de Direitos Humanos do governo federal. A Liga Operária acompanhou um dos operários torturados, Raimundo Braga, que fez contundente revelação sobre tortura, tráfico de pessoas e trabalho escravo, em depoimento à CPI do Tráfico de Pessoas e a Comissão de Direitos Humanos da Câmara Federal.

Nas obras das usinas hidrelétricas de Jirau, construídas no Rio Madeira, em Rondônia, e de Belo Monte, no Rio Xingu, no Pará, os operários trabalham como mão de obra cativa sob vigilância e ameaça velada dos fuzis da Força Nacional de Segurança Pública (FNSP). Um contingente da FNSP ocupa estes dois canteiros de obras desde as grandes revoltas operárias que irromperam em 2012. Operativos da Polícia Militar, frequentemente, também se deslocam para essas e outras obras do PAC, acionados pelas direções dos consórcios de empreiteiras, para auxiliar na coação e repressão aos trabalhadores.

O Exército também participa na coação aos operários realizando exercícios dentro dos canteiros de obras como forma de intimidar os trabalhadores, visando impedir greves e manifestações de protestos operários. Cerca de 270 homens do 6º Batalhão de Infantaria de Selva, subordinados à 17ª Brigada de Infantaria de Selva, realizaram nos dias 4, 5 e 6 de junho de 2014 o exercício militar denominado “tomada e proteção” das Usinas Hidrelétricas de Jirau e Santo Antônio.

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O processo criminal em andamento contra 24 operários visa cercear e criminalizar o legítimo direito de greve. Ele não inclui a morte do operário Francisco Sousa Lima, 63 anos, pedreiro, natural do estado do Amazonas, funcionário da Camargo Corrêa, que foi morto dia 03/04/2012, após truculenta invasão policial ao canteiro de obras da UHE Jirau, e o incêndio que irrompeu nos alojamentos dos operários. Segundo testemunho de trabalhadores da obra, o operário Francisco Lima foi muito espancado por policiais da Força Nacional de Segurança.

Em julho de 2012, o Ministério Público do Trabalho de Rondônia autuou 198 vezes as empresas que atuam na construção da Usina de Jirau e 143 vezes as empresas que atuam na Usina de Santo Antônio. São irregularidades como jornadas de trabalho excessivas, ausência do descanso obrigatório, falta de equipamentos de proteção individual e coletiva e falta de manutenção nos alojamentos.

A 6ª Vara do Trabalho de Porto Velho, acatando pedido do Ministério Público do Trabalho, dia 22/01/2014, condenou as empresas Energia Sustentável do Brasil (ESB) e Construções e Comércio Camargo Corrêa a pagar R$ 5 milhões por dano moral coletivo. Pela sentença, as empresas deveriam cumprir imediatamente 42 obrigações relativas à saúde e segurança no trabalho na Usina Hidrelétrica de Jirau, sob a pena do pagamento de outras multas. Porém, as empreiteiras têm poder de mando sobre o governo e o Judiciário; o pagamento das multas é postergado e a super-exploração, as condições degradantes e mortes continuam nos canteiros de obras do PAC.

Dia 1º de março de 2012, o governo lançava, em Brasília, o chamado “Compromisso Nacional para Aperfeiçoar as Condições de Trabalho na Indústria da Construção”. Nesta cerimônia, o acordo proclamado foi festejado como “histórico” e “um novo paradigma nas relações entre trabalhadores, empresários e governo, na área da construção civil”. Só que as mortes e acidentes continuam acontecendo de forma crescente e o “compromisso” só serviu para encobrir o massacre que os trabalhadores sofrem nos canteiros de obras.

Segundo Ministério da Previdência, mais de 700 mil casos de acidentes de trabalho são registrados em média no Brasil, todos os anos, sem contar os casos não notificados oficialmente. O Brasil é o quarto país em número de acidentes fatais no trabalho. Muitos dos acidentes e mortes são “invisíveis”, já que estão completamente fora dos bancos de dados governamentais.

As obras das usinas de Jirau e Santo Antônio provocaram grande desastre ambiental e drama social para milhares de famílias que viram suas casas e comércios invadidos pelas cheias no rio Madeira, como no final de 2013 e início de 2014. Cerca de 4 mil famílias ficaram desabrigadas. Mas para especialistas que acompanharam o licenciamento das hidrelétricas de Jirau e Santo Antônio, ambas no rio Madeira, era previsível que o barramento criado pelas duas usinas prejudicaria a vazão do rio,

Na Bolívia, os efeitos da cheia foram devastadores. Segundo números divulgados pelo jornal La Prensa, cerca de 60 mil famílias foram afetadas em todo país e milhares de cabeças de gados foram mortas pelas enchentes. As ensecadeiras, as turbinas, poluição e outros desajustes provocados pelas UHEs Jirau e Santo Antônio já causaram a morte de milhares de peixes, com toneladas deles aparecendo mortos nos vertedouros das usinas.

Julio Cesar de Castro presta assessoria técnica em Construção Civil.

Quilombolas do Maranhão bloqueiam ferrovia da Vale

repórter br
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Quilombolas do Maranhão bloqueiam ferrovia da Vale

Trabalhadores de 35 comunidades negras do estado exigem do governo federal medidas que garantam o direito sobre seus territórios e criticam duplicação da estrada de ferro
Por Igor Ojeda | Categoria(s): Notícias
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Trabalhadores rurais de 35 comunidades quilombolas do Maranhão ocupam desde terça-feira, 23, a Estrada de Ferro Carajás, operada pela mineradora Vale. De acordo com informações de Diogo Cabral, advogado da Comissão Pastoral da Terra (CPT), que acompanha o protesto, o bloqueio é feito por cerca de 500 pessoas na altura do quilombo de Santa Rosa dos Pretos, no município de Itapecuru-Mirim. Os manifestantes exigem do governo federal uma série de medidas que garantam o direito dos quilombolas maranhenses a seus territórios. Além disso, questionam o processo de consulta em relação à duplicação da ferrovia – eles pedem transparência e respeito à autonomia das comunidades. (Veja aqui a pauta de reivindicações enviada ao governo federal)
Com o bloqueio, os trens de carga e de passageiros da Vale estão impedidos de seguir viagem, paralisando o embarque de minérios no porto de Ponta da Madeira, na capital São Luís, de onde seriam exportados. À Repórter Brasil, a empresa confirmou a informação de que ingressará com ação de reintegração de posse contra as famílias.
As operações de transporte de carga e de passageiros da ferrovia está paralisada. Foto: CPT-Divulgação
As operações de transporte de carga e de passageiros da ferrovia está paralisada. Foto: CPT/Divulgação
Na pauta de reivindicações enviada ao governo federal, os manifestantes dizem estar em curso “um processo de extermínio” contra as comunidades negras do Maranhão. “Diversos foram os despejos de comunidades quilombolas, bem como o assassinato de suas lideranças. Ademais, grandes projetos agropecuários e da mineração atingem violentamente comunidades quilombolas. Mais recentemente, um trabalhador rural quilombola foi atropelado pelo trem da Vale, no quilombo Jaibara dos Nogueiras, em Itapecuru-Mirim. Na comunidade de Mata de São Benedito, a empresa Florestas Brasileira polui o único açude da comunidade, despejando resíduos industriais no mesmo.”
O documento critica também o Poder Judiciário maranhense, o “sucateamento” do Instituto de Colonização e Terras do Maranhão (Iterma) e do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) – órgãos estadual e federal responsáveis pela reforma agrária no estado –, e a “omissão” e “falta de comprometimento” dos governos estadual e federal “com as normas constitucionais que determinam a titulação das terras ocupadas por comunidades quilombolas”.
Em nota, a mineradora diz que o protesto não está direcionado a ela. “A Vale ratifica sua intenção de manter o canal de comunicação aberto com as comunidades, contudo acredita que qualquer ato público ou manifestação deve respeitar o Estado Democrático de Direito e o direito constitucional de ir e vir.”
Duplicação da Estrada de Ferro Carajás vem causando diversos impactos socioambientais
Duplicação da Estrada de Ferro Carajás vem causando diversos impactos socioambientais
Nos últimos anos, uma série de protestos vem questionando a duplicação da Estrada de Ferro Carajás, que segundo seus críticos pode causar diversos impactos socioambientais. No final de 2011, o Ministério Público Federal do Maranhão (MPF/MA) propôs ação civil pública com pedido de liminar para que a Vale e o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) reelaborassem o estudo ambiental das obras de duplicação em Itapecuru-Mirim.
Denúncias encaminhadas ao MPF/MA pelo Incra e pela Fundação Cultural Palmares apontavam que tais obras estavam sendo feitas sem qualquer ação compensatória ou mitigatória por parte da empresa, causando impactos diretos a várias comunidades quilombolas na região. Também vem sendo frequentes manifestações para que a Vale garanta a segurança ao longo dos trilhos da ferrovia. Atropelamentos de pessoas e animais têm sido comuns.
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Proposta do governo pode fragilizar fiscalização e aumentar corrupção, dizem entidades

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Proposta do governo pode fragilizar fiscalização e aumentar corrupção, dizem entidades

Projeto de lei do Ministério do Trabalho que cria o Sistema Único do Trabalho abre a empregadores e trabalhadores poder de decisão sobre políticas de inspeção no país
Por Stefano Wrobleski | Categoria(s): Notícias
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O Sistema Único do Trabalho (SUT) deve tornar as condições dos auditores fiscais do trabalho mais precárias, fragilizar as políticas públicas de emprego e facilitar a corrupção nas verbas do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT). É o que afirmam cinco entidades que atuam com questões trabalhistas e judiciárias em manifesto divulgado nesta quarta-feira, 24.
A minuta do projeto, em gestação no Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), que o enviará ao Congresso em forma de lei, prevê a criação de uma série de instâncias de decisão nas esferas federal, estaduais e municipais. Pela proposta, o funcionamento descentralizado teria moldes semelhantes aos do atual Sistema Único de Saúde (SUS). As instâncias hierárquicas seriam compostas por conselhos paritários, nos quais governo e entidades representativas dos trabalhadores e empregadores teriam o mesmo peso de voz e voto. A última palavra, ainda segundo o projeto, caberia ao Conselho Nacional do Trabalho (CNT), organizado da mesma maneira que as demais instâncias.
Proposta produzida pelo MTE que deve reformular funcionamento da pasta  é duramente criticada por entidades (Foto: Divulgação)
Proposta produzida pelo MTE, que deve reformular funcionamento da pasta, é duramente criticada por entidades (Foto: Divulgação)
O problema, segundo as organizações que assinam o manifesto, é que decisões em torno das políticas de fiscalização trabalhista também seriam tomadas por esses conselhos. “O foco da fiscalização são as empresas que descumprem a legislação. Então, é quase antiético você colocar representantes das empresas dentro de um conselho cuja atribuição principal é definir as políticas de fiscalização”, defende o procurador do trabalho Ilan Fonseca. “É muito incoerente.”
Atualmente, as políticas de fiscalização do trabalho são definidas pelo MTE em conjunto com o Ministério do Planejamento por técnicos e coordenadores de cada área. São diretrizes como as áreas que serão priorizadas a cada ano pelas equipes de fiscais do governo em cada estado. Os planos contam com a participação de representantes dos trabalhadores e empregadores através de conselhos, que são somente consultivos. “Quando você colocar representantes patronais para definir as políticas de fiscalização, por certo haverá uma grande dificuldade para fazer cumprir a legislação trabalhista”, diz Ilan.
É quase antiético você colocar representantes das empresas dentro de um conselho cuja atribuição principal é definir as políticas de fiscalização. É muito incoerente
CorrupçãoAs entidades apontam também um possível aumento do risco de desvio de verbas do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) com o modelo proposto pelo MTE.
Os recursos do FAT são usados, por exemplo, para pagamentos de seguro-desemprego, abono salarial e despesas com programas de geração de emprego e renda. Essas ações, que em 2015 consumirão R$ 82,4 bilhões do orçamento da União, são executadas pelo Sistema Nacional de Emprego (Sine), que também auxilia empregadores e trabalhadores a disponibilizarem ou encontrarem postos de trabalho.
Atualmente, a destinação dos valores é definida pelo Conselho Deliberativo do FAT (Codefat), um organismo do MTE composto pelo governo e por representantes de trabalhadores e empregadores com votos de mesmo peso. Já no projeto que está sendo elaborado pelo MTE, o FAT passaria a se chamar Fundo Nacional do Trabalho (FNT) e seus recursos seriam distribuídos pela União aos estados e municípios, que criariam fundos próprios para receber e administrar os valores recebidos.
De acordo com o manifesto, a forma de destinação dos recursos prevista pelo projeto do SUT “amplia as possibilidades de desvio de recursos e de práticas de improbidade administrativa, em face às transferências de recursos no modelo de ‘fundo a fundo’, com a criação de fundos do trabalho próprios em cada município, e de milhares de conselhos municipais do trabalho que dificultarão sobremaneira a fiscalização das destinações a serem realizadas”. O projeto ainda libera, por até doze meses enquanto os fundos estaduais e municipais estiverem sendo criados, o repasse de recursos “sem a necessidade de convênio, acordo, contrato, ajuste ou instrumento congênere, mediante depósito em conta corrente específica”, conforme minuta obtida pela reportagem.
Renato Bignami, auditor do trabalho em São Paulo e coordenador do grupo de prevenção ao trabalho escravo no estado, considera que o atual modelo já é falho: “O MTE faz repasses bilionários aos estados para fazer o Sine funcionar, e ele não funciona”. O auditor considera que falta controle no uso de verbas do sistema financiado pelo FAT, que atualmente não pode ser fiscalizado por auditores do trabalho.
O MTE faz repasses bilionários aos estados para fazer o Sine funcionar, e ele não funciona
Renato avalia que, com um Sine melhor estruturado, a prevenção a casos de desrespeito aos direitos trabalhistas e ao trabalho em condições análogas às de escravos seria mais eficiente. “Melhor estruturado, o Sine teria completo controle sobre as quantidades de vagas de emprego existentes e poderia realizar estudos ainda mais avançados sobre empregabilidade e outras necessidades. Seria possível, ainda, apresentar as propostas reais de contrato aos trabalhadores e se antecipar ao aliciador”, diz.
O professor de Direito do Trabalho da Universidade de São Paulo (USP) Jorge Luiz Souto Maior considera que, com o SUT, pode haver um enfraquecimento do Sine. “As coisas são jogadas para a negociação coletiva [no âmbito das comissões tripartites], fora da perspectiva institucional. Há também um afastamento da Justiça do Trabalho para a resolução de conflitos trabalhistas”, afirma.
Infrações à OITO manifesto divulgado hoje também considera que a proposta do SUT em discussão no MTE infringe duas convenções da Organização Internacional do Trabalho (OIT) ratificadas pelo governo brasileiro. Quando ratifica uma convenção, o país deve adotar as medidas necessárias para sua aplicação. Caso não adote ou descumpra as definições do acordo, o país pode sofrer sanções e constrangimento internacional perante a entidade.
Renato explica que a Convenção 81, que dispõe sobre a inspeção trabalhista, “trata textualmente da obrigatoriedade de uma autoridade central para o comando da fiscalização do trabalho, e não de uma autoridade tripartite”. Ele considera que “o tripartismo é essencial à inspeção, mas precisa ser somente consultivo”.
Segundo o manifesto, se entrasse em vigor hoje, o projeto do SUT também colocaria o país contra a Convenção 88 – outro compromisso firmado com a OIT – que trata da organização de um sistema público e gratuito de emprego, o que, no Brasil, se materializa no Sine. O auditor também é cético quanto ao funcionamento dos conselhos: “Nos estados e municípios em que as representações patronais e dos trabalhadores não são fortes, quem participaria desses conselhos?”.
TerceirizaçãoA proposta também é questionada por Jorge, que vê, no texto atual, o risco de uma “terceirização sem limites”: “Um dos dispositivos trata da regularização e fiscalização da intermediação privada da mão de obra, o que pressupõe a possibilidade da terceirização da mão de obra. É pior do que a súmula 331 do Tribunal Superior do Trabalho (TST)”. A súmula 331 do TST é, hoje, o principal mecanismo legal para regular a terceirização, proibindo que aconteça para funcionários que realizem a mesma atividade-fim da empresa.
A avaliação do professor da USP é de que o projeto “arrisca demais”: “Ele coloca em grave risco os direitos e a organização da classe trabalhadora sob um falso pressuposto de que a classe trabalhadora está em pé de igualdade com os empregadores”.
Entidades, como o sindicato dos auditores do trabalho, se mobilizam em campanha contra o projeto
Entidades, como o sindicato dos auditores do trabalho, se mobilizam em campanha contra o projeto
‘Juízo de valor’Em nota, o Ministério do Trabalho e Emprego não respondeu aos questionamentos da Repórter Brasil sobre os riscos, no projeto, de fragilização da inspeção do trabalho, a possibilidade de desvios dos recursos do FAT ou sobre os meios empregados para fiscalizar o Sistema Único do Trabalho. No posicionamento, o MTE informa que “será formado um Grupo de Trabalho tripartite e paritário, composto pelas centrais sindicais, confederações de empregadores e governo, com o objetivo de avaliar as sugestões apresentadas e elaborar Minuta de Projeto que possa ir à consulta pública. Portanto, não cabe emitir juízo de valor sobre algo que ainda será analisado”. Depois de ser colocado em consulta pública, o texto deve ser encaminhado para votação pelo Congresso Nacional.
A pasta informou ainda que a inspeção do trabalho tem atuação “assegurada na Constituição Brasileira, e não se pretende acatar nenhuma sugestão, nessa ou em qualquer outra área, que possa resultar em mudança da Carta Magna”. A declaração surge depois de uma nota escrita pela Secretaria de Inspeção do Trabalho – divisão do MTE responsável pela fiscalização trabalhista no país – ter sido entregue ao gabinete do ministro informando das violações à Constituição e à Convenção 81 da OIT que serão cometidas caso a atual redação da proposta seja mantida.
nota, obtida pela Repórter Brasil, diz ainda que, se for mantido na sua redação atual, o texto “poderá resultar em questionamentos quanto à sua validade e complicações desnecessárias para a inspeção do trabalho”. A secretaria pede, ainda, o retorno do projeto à sua redação original. “Claramente, no que se refere à Inspeção do Trabalho houve alteração do texto definido de comum acordo pelos secretários de Inspeção do Trabalho e de Políticas Públicas de Emprego em reunião”, diz.
Legislação abertaA minuta do projeto de lei que cria o SUT pode ser baixada aqui. O texto trata de sua estruturação deliberativa e da inspeção do trabalho nos artigos 4, 11 e nos incisos 1 e 2 do 13º artigo. Já o financiamento do sistema e forma de funcionamento do FNT pode ser conferido no artigo 31 e entre os artigos 33 e 40. A intermediação privada da mão de obra é tratada brevemente no 15º inciso do artigo 19. A Constituição Federal trata da fiscalização trabalhista em seu artigo 22, inciso 24.
Confira a íntegra do manifesto aqui. O texto foi assinado pelas entidades Associação Latino-Americana de Advogados Trabalhistas (Alal), Associação Latino-Americana de Juízes do Trabalho (ALJT), Associação Luso-Brasileira de Juristas do Trabalho (Jutra), Confederação Iberoamericana de Inspetores do Trabalho (Ciit) e Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho (Sinait).
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