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Operários mortos e desaparecidos em obras das usinas de Jirau e Santo Antônio
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Operários mortos e desaparecidos em obras das usinas de Jirau e Santo Antônio
ESCRITO POR JULIO CESAR DE CASTRO |
SEXTA, 26 DE SETEMBRO DE 2014 |
Nos canteiros de obras das usinas de Jirau e Santo Antônio, no Rio Madeira, em Rondônia, e na obra de instalação do linhão de transmissão de energia elétrica (Porto Velho-Araraquara), 41 operários tiveram suas vidas ceifadas no período de 2010 a 2014, e dez operários estão desaparecidos desde a brutal repressão à greve de abril de 2012. Ressalte-se que essas 41 mortes são as que foram noticiadas. Os operários denunciam a ocorrência de muitos outros casos de acidentes, desaparecimentos, mutilações e mortes que são encobertas nas obras das usinas do Madeira e do linhão. Relatam também que muitas mortes por malária não vieram a público.
Os 10 trabalhadores da obra de Jirau que estão desaparecidos desde abril de 2012 constam na denúncia do promotor Rodrigo Leventi Guimarães – (ação penal nº 0004388.89-2012-822-0501 – TJRO) – como “recolhidos no Pandinha” (presídio em Porto Velho) e integram uma lista de 24 operários injustamente acusados, após a greve, dos supostos crimes de “incêndio”, “dano”, “extorsão”, “constrangimento ilegal” e até de “formação de quadrilha ou bando” e de “furto qualificado”.
Audiência de instrução e julgamento ocorreu no dia 25 de setembro de 2014 na 1ª Vara Criminal do Fórum de Porto Velho, às 11h:30m, enquanto permanecem desaparecidos (e sem qualquer esclarecimento por parte do Estado) os operários: José Ribamar dos Santos, Leonilson Macedo Farais, Herbert da Conceição Nilo, Sebastião da Silva Lima, Antônio da Silva Almeida, Lucivaldo Batista Moraes Castro, Ismael Carlos Silva Freitas, Antônio Luis Soares Silva, Cícero Furtado da Silva e João de Lima Fontinele.
No tendencioso processo que visa transformar vítimas em réus e criminalizar a justa greve dos operários, o Judiciário de Rondônia cerceia a convocação e audiência de testemunhas de defesa, enquanto aceita todo tipo de gestão da Camargo Corrêa para enquadrar os operários como “vândalos e criminosos”.
A Camargo Corrêa e o consórcio ESBR são quem deveriam ser investigados pela autoria e execução do incêndio que, estranhamente, só destruiu os alojamentos e pertences dos operários. A Camargo Corrêa tinha interesse no incêndio para acabar com a greve, açular a polícia contra os operários, caracterizá-los como “bandidos e vândalos” para assim retirar o cunho trabalhista dos eventos, justificar a repressão e também agregar argumentos na demanda judicial, que trava pelo pagamento de seguro em cortes internacionais. A Camargo Corrêa pede R$ 400 milhões, mais perdas alegadas pelo atraso da obra, que podem totalizar cerca de R$ 1 bilhão; e só caracterizando a situação como de origem criminosa que teria direito ao recebimento dos valores.
O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) é o maior financiador dessas obras das UHEs de Jirau, Santo Antônio e do linhão, combinando financiamento direto com repasses através de outras instituições financeiras, sobretudo Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal.
O proprietário da UHE de Jirau é o consórcio “Energia Sustentável do Brasil (ESBR)”, formado majoritariamente pelas empresas transnacionais, a francesa GDF SUEZ (40%) e a japonesa Mitsui (20%), mais as brasileiras Eletrosul (20%) e a Companhia Hidroelétrica do São Francisco – Chesf (20%). A construção está a cargo das empresas Construções e Comércio Camargo Correa S/A, Enesa Engenharia S/A, J. Maclucelli e várias subcontratadas. O custo de R$ 8,7 bilhões, previsto inicialmente, já ultrapassou R$ 17,4 bilhões.
O proprietário da UHE de Santo Antônio é o consórcio “Santo Antônio Energia”, formado pelas empresas Furnas Centrais Elétricas (39%), Caixa FIP Amazônia Energia (20%), Odebrecht Energia do Brasil (18,6%), SAAG Investimentos (12,4%) e Cemig Geração e Transmissão (10%). A construção está a cargo das construtoras Odebrecht, Andrade Gutierrez e outras mais de 50 subcontratadas. O custo saltou de R$ 9,5 bilhões, previsto inicialmente, para R$ 19,2 bilhões em fevereiro de 2014.
Os acidentes, desaparecimentos e mortes ocorridas nas obras das usinas hidrelétricas do Rio Madeira são tratados com total falta de transparência pelas empresas dos consórcios construtores e pelo governo. Denúncias de torturas, tráfico de pessoas, maus tratos e mortes já foram levadas à Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados, CPI do Tráfico de Pessoas e a Secretaria Nacional de Direitos Humanos do governo federal. A Liga Operária acompanhou um dos operários torturados, Raimundo Braga, que fez contundente revelação sobre tortura, tráfico de pessoas e trabalho escravo, em depoimento à CPI do Tráfico de Pessoas e a Comissão de Direitos Humanos da Câmara Federal.
Nas obras das usinas hidrelétricas de Jirau, construídas no Rio Madeira, em Rondônia, e de Belo Monte, no Rio Xingu, no Pará, os operários trabalham como mão de obra cativa sob vigilância e ameaça velada dos fuzis da Força Nacional de Segurança Pública (FNSP). Um contingente da FNSP ocupa estes dois canteiros de obras desde as grandes revoltas operárias que irromperam em 2012. Operativos da Polícia Militar, frequentemente, também se deslocam para essas e outras obras do PAC, acionados pelas direções dos consórcios de empreiteiras, para auxiliar na coação e repressão aos trabalhadores.
O Exército também participa na coação aos operários realizando exercícios dentro dos canteiros de obras como forma de intimidar os trabalhadores, visando impedir greves e manifestações de protestos operários. Cerca de 270 homens do 6º Batalhão de Infantaria de Selva, subordinados à 17ª Brigada de Infantaria de Selva, realizaram nos dias 4, 5 e 6 de junho de 2014 o exercício militar denominado “tomada e proteção” das Usinas Hidrelétricas de Jirau e Santo Antônio.
O processo criminal em andamento contra 24 operários visa cercear e criminalizar o legítimo direito de greve. Ele não inclui a morte do operário Francisco Sousa Lima, 63 anos, pedreiro, natural do estado do Amazonas, funcionário da Camargo Corrêa, que foi morto dia 03/04/2012, após truculenta invasão policial ao canteiro de obras da UHE Jirau, e o incêndio que irrompeu nos alojamentos dos operários. Segundo testemunho de trabalhadores da obra, o operário Francisco Lima foi muito espancado por policiais da Força Nacional de Segurança.
Em julho de 2012, o Ministério Público do Trabalho de Rondônia autuou 198 vezes as empresas que atuam na construção da Usina de Jirau e 143 vezes as empresas que atuam na Usina de Santo Antônio. São irregularidades como jornadas de trabalho excessivas, ausência do descanso obrigatório, falta de equipamentos de proteção individual e coletiva e falta de manutenção nos alojamentos.
A 6ª Vara do Trabalho de Porto Velho, acatando pedido do Ministério Público do Trabalho, dia 22/01/2014, condenou as empresas Energia Sustentável do Brasil (ESB) e Construções e Comércio Camargo Corrêa a pagar R$ 5 milhões por dano moral coletivo. Pela sentença, as empresas deveriam cumprir imediatamente 42 obrigações relativas à saúde e segurança no trabalho na Usina Hidrelétrica de Jirau, sob a pena do pagamento de outras multas. Porém, as empreiteiras têm poder de mando sobre o governo e o Judiciário; o pagamento das multas é postergado e a super-exploração, as condições degradantes e mortes continuam nos canteiros de obras do PAC.
Dia 1º de março de 2012, o governo lançava, em Brasília, o chamado “Compromisso Nacional para Aperfeiçoar as Condições de Trabalho na Indústria da Construção”. Nesta cerimônia, o acordo proclamado foi festejado como “histórico” e “um novo paradigma nas relações entre trabalhadores, empresários e governo, na área da construção civil”. Só que as mortes e acidentes continuam acontecendo de forma crescente e o “compromisso” só serviu para encobrir o massacre que os trabalhadores sofrem nos canteiros de obras.
Segundo Ministério da Previdência, mais de 700 mil casos de acidentes de trabalho são registrados em média no Brasil, todos os anos, sem contar os casos não notificados oficialmente. O Brasil é o quarto país em número de acidentes fatais no trabalho. Muitos dos acidentes e mortes são “invisíveis”, já que estão completamente fora dos bancos de dados governamentais.
As obras das usinas de Jirau e Santo Antônio provocaram grande desastre ambiental e drama social para milhares de famílias que viram suas casas e comércios invadidos pelas cheias no rio Madeira, como no final de 2013 e início de 2014. Cerca de 4 mil famílias ficaram desabrigadas. Mas para especialistas que acompanharam o licenciamento das hidrelétricas de Jirau e Santo Antônio, ambas no rio Madeira, era previsível que o barramento criado pelas duas usinas prejudicaria a vazão do rio,
Na Bolívia, os efeitos da cheia foram devastadores. Segundo números divulgados pelo jornal La Prensa, cerca de 60 mil famílias foram afetadas em todo país e milhares de cabeças de gados foram mortas pelas enchentes. As ensecadeiras, as turbinas, poluição e outros desajustes provocados pelas UHEs Jirau e Santo Antônio já causaram a morte de milhares de peixes, com toneladas deles aparecendo mortos nos vertedouros das usinas.
Fonte: Liga Operária - http://www.ligaoperaria.org.br/1/?p=7473
Julio Cesar de Castro presta assessoria técnica em Construção Civil.
E-mail: jota.castro(0)yahoo.com.br
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