quinta-feira, 7 de julho de 2011

ROBERTO ROSSI 8/10

PARTE 8/10
Análise compreensiva da realidade mato-grossense
Roberto Rossi


Sonhar não é apenas um ato político necessário, mas também uma conotação da forma histórico-social de estar sendo de mulheres e homens. Faz parte da natureza humana que, dentro da história, se acha em permanente processo de tornar-se. (...) não há mudança sem sonho como não há sonho sem esperança (Paulo Freire)


Sebastião Salgado (feira de Bombaim, India)
*


VIII. Cultura[1]
Vivemos num mundo que naturaliza tudo, banalizando e desvirtuando as relações humanas e a própria vida. A naturalização do ser humano é processo ideológico que impede a possibilidade de um sistema democrático e que os seres humanos reivindiquem sua liberdade.
Em nossos dias, além das comunidades estabelecidas, deparamo-nos com comunidades transterritoriais, ambientais e afetivas e o rápido crescimento das comunidades virtuais, tão presentes na cultura juvenil.
Duas mudanças se destacam
O relativismo, próprio de quem, não enraizado, oscila entre as inúmeras possibilidades oferecidas.
Os fundamentalismos fechados em determinados aspectos, não considerando a pluralidade e o caráter histórico da realidade como um todo.

A cidadania está comprometida
As leis do mercado, do lucro e dos bens materiais regulam também as relações humanas, familiares e sociais, incluindo certas atitudes religiosas. Crescem as propostas de felicidade, realização e sucesso pessoal, em detrimento do bem comum e da solidariedade.
O individualismo contemporâneo
Segundo Lipovetsky[2], a sociedade contemporânea é caracterizada pela exacerbação do individualismo que desagrega a convivência social. Além disso, o consumo de massa, a apatia, a indiferença, o hedonismo, a supervalorização do presente e do tempo instantâneo, são traços característicos dos tempos atuais.
Bauman[3], por sua vez, distingue a sociedade moderna em dois períodos: a modernidade sólida e a modernidade líquida. Conforme, MOCELLIM[4]a modernidade sólida, para Bauman, é caracterizada, principalmente, através da ideia de projeto moderno. O projeto moderno seria o projeto de controle do mundo pela razão. Esse projeto consistia em tornar o mundo o “melhor possível dos mundos” através do ordenamento racional e técnico”.
Para a modernidade líquida o projeto moderno perde credibilidade. “No mundo líquido a diferença se torna exigência: todos devem ser indivíduos particulares. No mundo sólido as formas de vida comunitárias ainda podiam existir – mesmo que reduzidas e isoladas – graças a certa exigência de unidade de conduta e modos de vida, que era núcleo da ideia de povo e de nação; já no mundo líquido a comunidade é tornada mito. Com a individualização radicalizada, todas as formas de sociabilidade que sugerem dependência mútua passam a ser vistas com desconfiança[5].
O individualismo não assume as formas coletivas de participação. Mesmo quando os indivíduos saem dos seus casulos e se engajam em ações coletivas, o fazem pela lógica individualista. Interesses particulares prevalecem sobre os sociais e coletivos. Nesse sentido, percebe-se que muitas mobilizações são, não raro, despolitizadas, desideoligizadas, sustentadas por reivindicações individualistas de melhoria do poder de compra, voltadas para a defesa de interesses particulares, longe das grandes utopias históricas.

A transformação do sujeito em objeto
A transformação do ser-sujeito em ser-objeto é feita no interior do sistema capitalista, fazendo com que a conversão do sujeito em objeto seja aceita como algo natural, ou seja, que se reproduz naturalmente. Como se houvesse uma força da natureza que nos impulsionasse a agirmos dessa forma. Resulta disso todo tipo de violência contra o ser humano e aos seus direitos fundamentais.
Tudo e todos se tornam objetos e mercadoria consumível. Até o conceito de felicidade é perversamente associado ao conceito de autorrealização materializado pelo verbo TER, sempre individual. A moral torna-se a moral do ter e do consumir.
Os ideólogos da sociedade de consumo difundem a ideia de que o ser humano se constitui pelo “ter”. Para a concretização dessa concepção, faz-se necessário uma nova ética. A ética capitalista tem como prevalência o “ter” sobre o “ser”, o “indivíduo” sobre o “coletivo”. E a partir dessa ética a acumulação de coisas vai ser entendida como constitutiva da humanidade, e, portanto, é inquestionável. Essa visão mercantilista reduz o homem a um objeto manuseado pelo mercado, que determina o seu ser. O seu ser não é o que ele é, mas o que ele tem, e principalmente pelo que ele tem obtido nas vitórias contra o outro, que tem que ser continuamente vencido, derrotado.
Nessa visão de mundo, os pobres são considerados supérfluos e descartáveis. Isso compromete o equilíbrio entre os povos, a preservação da natureza, o acesso à terra para trabalho e renda.



[1] A reflexão sobre a realidade cultural é baseada nas Diretrizes Gerais da Ação Evangelizadora (2011-2015).
[2] LIPOVETSKY, Gilles. A Era do Vazio: Ensaios Sobre o Individualismo Contemporâneo. Barueri: Manole, 2005.
[3] BAUMAN, Zygmunt. A modernidade líquida. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2001.
[4] MOCELLIM, Alan. Simmel e Bauman: modernidade e individualização. Tese - Revista Eletrônica dos Pós-Graduandos em Sociologia Política da UFSC Vol. 4 n. 1 (1), agosto-dezembro/2007. Disponível em: < www.emtese.ufsc.br/vol4_art6.pdf >
[5] BAUMAN, op. Cit, p. 6.

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