quinta-feira, 7 de julho de 2011

ROBERTO ROSSI 1/10

PARTE 1/10
Análise compreensiva da realidade mato-grossense
Roberto Rossi


Aos esfarrapados do mundo e aos que neles se descobrem e, assim, descobrindo-se, com eles sofrem, mas, sobretudo, com eles lutam (Paulo Freire)


Sebastião Salgado (escola de Somália)
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Análise compreensiva da realidade mato-grossense
Roberto Rossi

O caminho da vida pode ser o da liberdade e da beleza, porém, desviamo-nos dele. A cobiça envenenou a alma dos homens, levantou no mundo as muralhas do ódio e tem-nos feito marchar a passo de ganso para a miséria e os morticínios. Criamos a época da [máquina e da] produção veloz, mas nos sentimos enclausurados dentro dela. (...) Mais do que máquinas, precisamos de humanidade; mais do que de inteligência, precisamos de afeição e doçura! Sem essas virtudes, a vida será de violência e tudo estará perdido”.
(Charles Chaplin, em discurso proferido no final do filme “O grande ditador”)


Nota preliminar
A análise da realidade na qual vivemos não é nem pode ser uma obra neutra, pois a escolha das variáveis de análise pressupõe uma escolha diante da realidade. Dessa forma, todo olhar ou leitura da realidade é feita de forma situada e/ou contextualizada. Além disso, é preciso a clareza de que a realidade é multifacetada e pode ser olhada a partir de prismas diferentes (ponto de vista), sobretudo, numa sociedade composta por grupos que possuem interesses antagônicos e se constata, entre eles, relações assimétricas de poder.

Sendo assim, poder-se-ia afirmar que é possível fazer diferentes leituras da realidade, considerando o lugar concreto onde estamos vivendo e as escolhas que fazemos. A parábola de “A Águia e a Galinha”[1] ilustra brilhantemente o que queremos dizer. Segundo Boff, cada um lê com os olhos que tem e a partir de sua visão de mundo. E interpreta a partir de onde os pés pisam. Ou seja, as pessoas pensam sempre a partir de onde os pés pisam e como vivem, com quem convivem e que experiências tem, em que trabalham, que desejos alimentam, que esperanças as animam. Isso faz da análise da realidade sempre uma interpretação. Porque cada um lê e relê com os olhos que tem. Com estes pressupostos vamos apresentar uma leitura possível da realidade em que vivemos.

Esta análise, portanto, é feita do lugar onde atuam os movimentos sociais e populares. Em última instância, a partir do lugar, se assim quisermos - geográfico, epistemológico, político, social - dos pobres da terra. São eles, na perspectiva do teólogo Jon Sobrino, as vítimas da história e dos ídolos da morte.

Enfim, parafraseando Paulo Freire, esta análise se dirige respeitosamente aos esfarrapados do mundo e aos que neles se descobrem e, assim, descobrindo-se, com eles sofrem, mas, sobretudo, com eles lutam” (Pedagogia do Oprimido, 1968).

I. Introdução
Sabemos não ser fácil compreender a realidade. Ela é sempre mais complexa do que podemos imaginar. Nela existem luzes e sombras, alegrias e preocupações. Daí a atitude de diálogo, de evangélica visão crítica, na busca de elementos que permitam, em meio à diversidade de compreensões, estabelecer fundamentos para a ação transformadora.

Nesse sentido, a análise compreensiva da realidade é o esforço de querer e buscar entender o mundo no qual estamos inseridos. Ora, a leitura deste mundo é significativa se nos compreendermos como parte dele. Somos e estamos no mundo com os outros, numa perspectiva relacional. Jamais sozinhos ou isolados.

Para garantir nossa sobrevivência (comer, beber, proteger-se contra as intempéries da natureza) neste mundo, nele intervimos. Graças ao nosso trabalho conseguimos transformar as riquezas da natureza, colocando-as a serviço da satisfação de nossas necessidades. Desse modo, alteramos ou transformamos o mundo, para nele sobreviver.

Modificamos a natureza de acordo com nossas possibilidades e necessidades. Isso é possível porque temos a capacidade de definir os instrumentos necessários que possibilitam alcançar esse objetivo. Desde as rudimentares ferramentas dos primórdios da humanidade até as novas tecnologias atuais.

Chegamos, pois, ao século XXI convencidos de que podemos tudo. O planeta é visto como uma posse dos homens a quem caberiam “dominar e subjugar” com as bênçãos de Deus (Gn, 1, 26-28). O meio ambiente passou, portanto, a ser visto como um objeto de exploração sem limites. Mas, se continuarmos desse jeito, não temos futuro. O futuro da terra e da nossa espécie depende de uma evolução sociocultural nova: a transformação de uma intervenção destrutiva em uma intervenção sustentável, respeitosa.



[1] Leonardo Boff. A águia e a galinha. Petrópolis: Vozes, 2002.

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