carta maior
http://www.cartamaior.com.br/?/Editoria/Economia/Desigualdade-de-renda-Uma-segunda-analise-sobre-olhares-e-numeros/7/29753
José Carlos Peliano
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Desigualdade de renda: Uma segunda análise sobre olhares e números
Campanhas para generalização da participação dos trabalhadores nos lucros das empresas, entre outras medidas, reduzem desigualdade. Por José Carlos Peliano
Texto anterior sobre desigualdade de renda foi finalizado com a observação: “... as diferenças de rendimentos entre os indivíduos e as suas posições na escala de rendimentos são definidas nos locais de trabalho de acordo com as estratégias das organizações. Assim, a redução da desigualdade tem de partir do capital para o trabalho e ao mesmo tempo do trabalho melhor posicionado para os demais”.
No capitalismo a repartição mais justa da renda tem de partir e ser obtida no próprio processo de acumulação do capital. O expediente das crises periódicas do sistema é utilizado para recompor a acumulação entre os capitais mais fortes e monopolistas eliminando os mais fracos e dependentes ao mesmo tempo em que volta a concentrar a força de trabalho nas franjas do desemprego, atividades de subsistência e marginalidade. O velho exército de reserva de trabalhadores persiste em suas formas modernas de manifestação.
O raciocínio teórico e o argumento político são os mesmos: a população tem de fazer sacrifícios de consumo presente e futuro para poupar esforço e dinheiro possibilitando sobrevida ao sistema (“à economia”, “ao capital”) na sua retomada de expansão continuada. Seja pela redução das compras para não pressionar a inflação, seja por reservar os trocados que sobrarem em planos de poupança dos mais variados tipos para garantir recursos a financiamentos de investimentos das empresas através da rede bancária ou do mercado financeiro. Todos têm de trabalhar para recuperar o sistema e mantê-lo vivo em especial à custa de sacrifícios pessoais e familiares (aqui também incluídas as pequenas empresas individuais e familiares)
O que os olhos não veem, o coração não sente, um dito popular que cabe bem aqui. Trombados pela má distribuição da renda de um lado e pelas crises periódicas do capital do outro, somos joguetes nas mãos do sistema. A máquina capitalista usa e abusa de todos nós ao longo de nossas vidas como trabalhadores, desempregados, marginais e convocados obrigatórios para sacrifícios de consumo e investimento pessoais em prol do controle e retomada do desenvolvimento. As crises são provocadas pelo sistema, mas somos nós trabalhadores e consumidores que sofremos as consequências.
Ou nos acostumamos aos salários oferecidos e reajustes insuficientes em tempos de vacas gordas, ou nos conformamos com a falta de ocupação, bicos ou atividades esporádicas em tempos de vacas magras. Se o olho do dono é o que engorda o boi, então temos de reclamar e lutar por melhores condições de salário, trabalho, educação e saúde. Dirão que esse discurso é velho conhecido, que a história está repleta de convocações como essa. Digo que concordo, mas a história está igualmente repleta de alternativas infrutíferas.
Qual solução? Uma frente de luta é conhecer melhor a realidade que nos cerca. Ir desvelando os números e as tabelas disponíveis para enxerga-la com olhos bem abertos e com foco certo. Vimos no texto anterior que a distribuição de renda pode ser não só apresentada em tabela como ela é também tabelada para todos os tipos de grupos, e o conjunto deles, sejam eles empregados, trabalhadores por conta própria, profissionais liberais e empresários. Senão vejamos bem. Os empregados têm seus salários escalonados (“tabelados”) por níveis, os trabalhadores por conta própria têm seus serviços referenciados (“tabelados”) pelos de outros semelhantes no mercado, os profissionais liberais idem além de terem referências oficiais patrocinadas por suas associações profissionais e, finalmente, os empregadores têm seus lucros também referenciados pelos de outros semelhantes, muitas das vezes previstos (“tabelados”) pelos seus planos de negócios.
Como todos os grupos têm seus rendimentos tabelados assim como todos os tipos de contratos comerciais, financeiros e profissionais, as diferenças desses rendimentos entre todos deverão prosseguir. Algumas vezes mais outras menos, mas em torno do padrão predominante. Em período curto de tempo a desigualdade pode então aumentar ou diminuir, enquanto em tempo maior ela tenderá a voltar ao redor do padrão histórico de referência. Se a economia é tabelada, os rendimentos também e por seu turno a desigualdade.
O que não significa que não haja eventualmente saídas pontuais dessa armadilha. Por exemplo, o bem sucedido Programa Bolsa Família conseguiu trazer para o mercado milhões de consumidores que antes não ganhavam nada ou quase, passando a receber rendimentos suficientes para aumentarem o consumo de suas respectivas famílias, vilas e cidades. Em decorrência, a desigualdade reduziu substancialmente – de 2001 a 2011 de acordo com a Pesquisa Nacional por Amostras de Domicílios (PNAD) e o IPEA a medida da desigualdade obtida pelo índice de Gini veio de 0,59 para 0,52. Esse foi um resultado digno de nota da política econômica, nunca se viu queda tão acentuada da medida de desigualdade desde os anos 60 quando se começou oficialmente a medir o fenômeno no país.
Fora isso, salvo outra iniciativa exitosa do tipo, a perspectiva é a desigualdade não recuar de forma substantiva. A não ser que seja desmontada a tabela da economia geral para se modificá-la e reconstruí-la. A não ser que as lutas trabalhistas e sindicais comecem a se insurgir contra as diferenças desproporcionais de rendimentos entre os grupos, especialmente dos maiores ganhos para os demais. Como a ultrapassagem dos níveis dos mais baixos aos mais altos não é reservada a todos, a aproximação dos ganhos sim. Aproximando-os, o tabelamento dos rendimentos na economia vai se afrouxar não só melhorando os rendimentos dos que estão na base da tabela, mas também aliviando a pressão sobre a desigualdade. A situação de renda estampada nos números pode por fim ser melhorada.
Do mesmo modo, campanhas para generalização da participação dos trabalhadores nos lucros das empresas, tributação de capitais improdutivos, incluindo confisco de terras para reforma agrária, iniciativas de economia solidária, e incentivo e formação de sociedades de trabalhadores na condução de empresas, por exemplo, são elementos à disposição da pauta democrática para revolucionar a economia e reduzir a desigualdade social. Economia menos desigual sustenta o trabalho, o capital, o consumo, o investimento e o desenvolvimento de forma mais duradoura, participativa e consistente.
No capitalismo a repartição mais justa da renda tem de partir e ser obtida no próprio processo de acumulação do capital. O expediente das crises periódicas do sistema é utilizado para recompor a acumulação entre os capitais mais fortes e monopolistas eliminando os mais fracos e dependentes ao mesmo tempo em que volta a concentrar a força de trabalho nas franjas do desemprego, atividades de subsistência e marginalidade. O velho exército de reserva de trabalhadores persiste em suas formas modernas de manifestação.
O raciocínio teórico e o argumento político são os mesmos: a população tem de fazer sacrifícios de consumo presente e futuro para poupar esforço e dinheiro possibilitando sobrevida ao sistema (“à economia”, “ao capital”) na sua retomada de expansão continuada. Seja pela redução das compras para não pressionar a inflação, seja por reservar os trocados que sobrarem em planos de poupança dos mais variados tipos para garantir recursos a financiamentos de investimentos das empresas através da rede bancária ou do mercado financeiro. Todos têm de trabalhar para recuperar o sistema e mantê-lo vivo em especial à custa de sacrifícios pessoais e familiares (aqui também incluídas as pequenas empresas individuais e familiares)
O que os olhos não veem, o coração não sente, um dito popular que cabe bem aqui. Trombados pela má distribuição da renda de um lado e pelas crises periódicas do capital do outro, somos joguetes nas mãos do sistema. A máquina capitalista usa e abusa de todos nós ao longo de nossas vidas como trabalhadores, desempregados, marginais e convocados obrigatórios para sacrifícios de consumo e investimento pessoais em prol do controle e retomada do desenvolvimento. As crises são provocadas pelo sistema, mas somos nós trabalhadores e consumidores que sofremos as consequências.
Ou nos acostumamos aos salários oferecidos e reajustes insuficientes em tempos de vacas gordas, ou nos conformamos com a falta de ocupação, bicos ou atividades esporádicas em tempos de vacas magras. Se o olho do dono é o que engorda o boi, então temos de reclamar e lutar por melhores condições de salário, trabalho, educação e saúde. Dirão que esse discurso é velho conhecido, que a história está repleta de convocações como essa. Digo que concordo, mas a história está igualmente repleta de alternativas infrutíferas.
Qual solução? Uma frente de luta é conhecer melhor a realidade que nos cerca. Ir desvelando os números e as tabelas disponíveis para enxerga-la com olhos bem abertos e com foco certo. Vimos no texto anterior que a distribuição de renda pode ser não só apresentada em tabela como ela é também tabelada para todos os tipos de grupos, e o conjunto deles, sejam eles empregados, trabalhadores por conta própria, profissionais liberais e empresários. Senão vejamos bem. Os empregados têm seus salários escalonados (“tabelados”) por níveis, os trabalhadores por conta própria têm seus serviços referenciados (“tabelados”) pelos de outros semelhantes no mercado, os profissionais liberais idem além de terem referências oficiais patrocinadas por suas associações profissionais e, finalmente, os empregadores têm seus lucros também referenciados pelos de outros semelhantes, muitas das vezes previstos (“tabelados”) pelos seus planos de negócios.
Como todos os grupos têm seus rendimentos tabelados assim como todos os tipos de contratos comerciais, financeiros e profissionais, as diferenças desses rendimentos entre todos deverão prosseguir. Algumas vezes mais outras menos, mas em torno do padrão predominante. Em período curto de tempo a desigualdade pode então aumentar ou diminuir, enquanto em tempo maior ela tenderá a voltar ao redor do padrão histórico de referência. Se a economia é tabelada, os rendimentos também e por seu turno a desigualdade.
O que não significa que não haja eventualmente saídas pontuais dessa armadilha. Por exemplo, o bem sucedido Programa Bolsa Família conseguiu trazer para o mercado milhões de consumidores que antes não ganhavam nada ou quase, passando a receber rendimentos suficientes para aumentarem o consumo de suas respectivas famílias, vilas e cidades. Em decorrência, a desigualdade reduziu substancialmente – de 2001 a 2011 de acordo com a Pesquisa Nacional por Amostras de Domicílios (PNAD) e o IPEA a medida da desigualdade obtida pelo índice de Gini veio de 0,59 para 0,52. Esse foi um resultado digno de nota da política econômica, nunca se viu queda tão acentuada da medida de desigualdade desde os anos 60 quando se começou oficialmente a medir o fenômeno no país.
Fora isso, salvo outra iniciativa exitosa do tipo, a perspectiva é a desigualdade não recuar de forma substantiva. A não ser que seja desmontada a tabela da economia geral para se modificá-la e reconstruí-la. A não ser que as lutas trabalhistas e sindicais comecem a se insurgir contra as diferenças desproporcionais de rendimentos entre os grupos, especialmente dos maiores ganhos para os demais. Como a ultrapassagem dos níveis dos mais baixos aos mais altos não é reservada a todos, a aproximação dos ganhos sim. Aproximando-os, o tabelamento dos rendimentos na economia vai se afrouxar não só melhorando os rendimentos dos que estão na base da tabela, mas também aliviando a pressão sobre a desigualdade. A situação de renda estampada nos números pode por fim ser melhorada.
Do mesmo modo, campanhas para generalização da participação dos trabalhadores nos lucros das empresas, tributação de capitais improdutivos, incluindo confisco de terras para reforma agrária, iniciativas de economia solidária, e incentivo e formação de sociedades de trabalhadores na condução de empresas, por exemplo, são elementos à disposição da pauta democrática para revolucionar a economia e reduzir a desigualdade social. Economia menos desigual sustenta o trabalho, o capital, o consumo, o investimento e o desenvolvimento de forma mais duradoura, participativa e consistente.
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