terça-feira, 15 de outubro de 2013

Entre Dilma e Marina, escolha não ser machista

ihu
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Entre Dilma e Marina, escolha não ser machista

"Quando um homem mostra sua personalidade nas suas decisões profissionais (sobretudo políticos), isso é tratado como sendo apenas sua personalidade, e não um problema. Quando as mulheres mostram sua personalidade, ela é sempre um grande problema, sejam elas autoritárias, boazinhas, ou tendo qualquer outro traço". O comentário é de Marília Moschkovich em artigo publicado pelo sítio Outras Palavras, 14-10-2013.
Eis o artigo.
Nas eleições presidenciais de 2010, pela primeira vez uma mulher era candidata e tinha chances reais de ser eleita (e foi). O desespero das diversas fatias da oposição deu impulso a uma onda misógina e machista durante a campanha. Foi para debater o assunto e rebater tanto sexismo que o grupo Blogueiras Feministas, por exemplo, foi criado. Havia quem não apoiasse Dilma, entre elas. Isso jamais significou, porém, que valia tudo e qualquer coisa para atacá-la.
A mais ou menos um ano da próxima eleição presidencial e, desta vez, com duas figuras femininas de base forte disputando cargos no executivo, precisamos tomar o triplo do cuidado.
Os ânimos se exaltam e é fácil agirmos sem pensar. Criticar Marina Silva pela estética (“feiosa”) e pelo tipo de roupa (“carola”) não é nada diferente de dizer que Dilma parece um Ewok (aqueles ursinhos fofos da saga Star Wars, lembra?), ou de publicar em jornais que – absurdo! é o fim! – a presidenta desfilará sozinha, sem “sua família”, na ocasião da posse. “Não há nada tão parecido com um machista de direita quanto um machista de esquerda”, dizem por aí. Serve o mesmo aqui: “Não há nada tão parecido com uma crítica machista à Dilma quanto uma crítica machista à Marina”.
Os ataques machistas vêm, como o machismo, em diversas fontes, cores, tamanhos e vozes. Uma palavra aqui, uma maneira de classificar ali, um adjetivo usado pra desqualificar acolá. A questão central é quais são as críticas que escolhemos fazer a nossas adversárias políticas, em primeiro lugar. Em segundo, de que maneira as faremos. Esses são os dois aspectos centrais do “machismo-de-campanha” que assistimos todos os anos pela tevê e nos jornalhões, mas também nos blogs e microblogs de jornalistas independentes (sem falar nos comentários… ah, os comentários!).
Ao escolher um aspecto de qualquer candidata mulher para criticar, reflita se você escolheria criticar a mesma coisa num candidato homem. Não parece meio imbecil gostar ou desgostar de Serra “porque ele é careca”? Então por que a estética serviria para gostar ou desgostar de uma candidata mulher? Outro tipo de crítica comum às mulheres é sua vida pessoal. Na única vez em que eu vi um candidato homem ser desonestamente criticado por isso (foi o Kassab, na prefeitura de São Paulo), toda a esquerda e a direita tomaram-lhe as dores e o apoio a sua candidatura cresceu. A história foi bem diferente quando disseram que Marta Suplicy era uma vadia por se separar de Eduardo.
Como regra geral, vale o bom-senso. Se você não observaria essa mesma coisa num candidato homem, há 99,9% de chances de sua escolha estar baseada em machismo – ainda que você, individualmente, não seja machista “convicto/a”.
Então tem isso, que é o que escolhemos criticar. Mas tem também a maneira como escolhemos criticar. Quer dizer, se escolhermos criticar a trajetória política de Marina Silva, por exemplo. É possível abordar essa trajetória de diversas maneiras, assim como a trajetória de Dilma Roussef. Uma das coisas que mais tenho lido por aí (e ainda falta um ano!) é que Marina Silva é “autoritária”, por um lado, e “se faz de boazinha”, por outro.
Se saírmos da política e perguntarmos às mulheres que conhecemos, profissionais de diferentes áreas em posição de liderança, que críticas elas mais ouvem no trabalho, podem apostar: “autoritária” (e derivados) e “boazinha” / “falsa” (e derivados da combinação) certamente estarão entre eles. Quando um homem mostra sua personalidade nas suas decisões profissionais (sobretudo políticos), isso é tratado como sendo apenas sua personalidade, e não um problema. Quando as mulheres mostram sua personalidade, ela é sempre um grande problema, sejam elas autoritárias, boazinhas, ou tendo qualquer outro traço. É uma armadilha fácil de cair, para qualquer pessoa, mesmo aquelas fortemente preocupadas com as diversas opressões de nossa sociedade.
Sempre se pergunte: eu diria exatemente isso de um homem, desta exata maneira (como se fosse um problema/vantagem)? Se a sua resposta for não, novamente há 99,9% de chances de sua escolha estar baseada em machismo.
Por isso, muito, muito, muito cuidado.
A largada para a “corrida presidencial” foi dada. Colecionemos as críticas às trajetórias, propostas e ideias de candidatos e candidatas. Troquemos informações. Façamos blogs. Utilizemos a internet ao máximo. Mas, sobretudo, recusemos as velhas formas de pensar, que nos aprisionam quem quer que seja a presidenta – ou o presidente.
Avancemos, enfim

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