CARTA MAIOR
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Internacional| 25/06/2012 | Copyleft
Lugo não reconhece novo governo e anuncia resistência
Em entrevista ao Página/12, Fernando Lugo diz que foi vítima de um golpe parlamentar e resumiu seu plano deste modo: “Resistência pacífica e não reconhecimento da presidência que se instalou depois do golpe de Estado”. Lugo pareceu mais animado do que estava na quinta, quando seu então vice, Federico Franco, o substituiu na Presidência. Ele afirmou que a sua postura pacífica de sexta teve o objetivo de evitar violência nas ruas e mortes. "No Paraguai há muita violência. Na sexta, os mercadores da morte estavam rondando". A reportagem é de Martín Granovsky.
Martín Granovsky - Página/12
Assunção - Os seus colaboradores já encontraram um título para ele. “É o presidente dos paraguaios”, dizem, para diferenciá-lo do cargo de presidente do Paraguai que Fernando Lugo perdeu com a destituição de sexta-feira pelas mãos do Congresso. Domingo à noite, em entrevista ao Página/12, Lugo resumiu seu plano deste modo: “Resistência pacífica e não reconhecimento da presidência que se instalou depois do golpe de Estado”. Lugo parece mais animado do que estava na quinta, quando seu então vice, Federico Franco, o substituiu na Presidência. Parte de sua estratégia é interna e parte parece consistir em sua instalação internacional para fortalecer-se também entre os paraguaios.
Franco também procura agir nestes dois planos, a ponto de dizer ontem que Lugo é a única pessoa que pode evitar o conflito internacional. É uma forma de se referir aos problemas que experimenta o governo pelas crescentes medidas de castigo, começando pela já decidida suspensão do Mercosul. “Te cospem na cara e, ao mesmo tempo, te chamam de lindo”, disse Lugo ao Página/12, comentando a declaração de Franco.
Você percebe que Franco o torna responsável de qualquer represália que o Paraguai receba?
Não são castigos ao Paraguai. Estamos frente a um grande movimento de solidariedade internacional do qual participa teu país. A Argentina é um país irmão, vizinho e muito próximo, que conhecem muito bem a realidade paraguaia.
Retirou Rafael Romá, o embaixador.
Fez o que dentro de sua soberania considerou que seria útil para a liberdade e a soberania de um país que quer a democracia como o Paraguai.
E se a solidariedade se converter em problemas cotidianos, como você reagirá?
Infelizmente, muitos inocentes poderão sofrer as consequências. Eu quero o melhor para o Paraguai. Por isso, rechaçamos o regime.
Na madrugada de domingo, frente ao edifício da televisão pública, você falou de resistência pacífica. Essa será a tática?
Sim. Já começamos a resistência pacífica e não reconhecemos a presidência que se instalou depois do golpe de Estado parlamentar. E começam a surgir as manifestações de cidadãos e cidadãs. Elas crescem, são pacíficas e se expressam contra o que o parlamento decidiu naquela sexta-feira sombria. Também vamos realizar uma reunião de gabinete.
Quando?
Às seis da manhã (de segunda). Participarão dela todos os colaboradores do meu gabinete, quando estávamos no palácio de governo.
Ao se despedir dos chanceleres da Unasul, você disse que voltaria a seu trabalho político junto às bases. Foi o que relatou o chanceler Héctor Timerman ao Página/12.
E já começamos a fazer isso. Vamos unir forças com os movimentos sociais e sindicais.
Sempre dentro da ideia de não-violência?
Sim. Sempre.
Por isso, na sexta, quando o destituíram, teve uma atitude pacífica?
Sim. Nos submetemos ao julgamento político parlamentar e aceitamos o veredito para evitar derramamento de sangue. Somos contra todo tipo de violência e esse dia pressagiava violência e repressão. Hoje, já com o espírito sereno, as manifestações cidadãs são exemplares, o que ser visto nas ruas ou nas transmissões do Canal 13 do Paraguai e como o faz a televisão pública.
É uma forma de ação política que será repetida no interior do Paraguai?
Exato. E estamos serenos para essa tarefa. Esse é o motivo pelo qual a nossa atitude de sexta-feira foi ponderada por muita gente. No Paraguai há muita violência. Na sexta, os mercadores da morte estavam rondando. O julgamento era injusto, descabido e sem argumento, mas era preciso reagir como fizemos. Era a melhor coisa a fazer.
O dinamismo de sua atividade aumentará?
Estamos saindo nos comunicando com a cidadania. Hoje tivemos uma série de reuniões com líderes sociais e políticos. O rechaço crescerá. Estou seguro disso. Haverá uma consolidação do rechaço à presidência que surgiu da destituição.
Franco insiste que o Congresso só aplicou um artigo da Constituição, que fala de procedimentos e não de prazos para o julgamento político do presidente.
Sobre isso, gostaria de destacar o que disse o presidente da Colômbia, Juan Manuel Santos. A ferramenta do julgamento político é válida do ponto de vista jurídico e constitucional, mas os congressistas exageraram na forma.
Os congressistas poderiam dizer que votaram com maioria qualificada.
É um simples acordo de cúpulas feito pelo pelos dirigentes dos partidos tradicionais.
Em sua primeira aparição pública após ter sido destituído, você disse que havia setores políticos vinculados ao narcotráfico. A quem estava se referindo?
Há muitos parlamentares acusados de ter uma grande participação em negócios ilícitos. O narcotráfico está dentro de alguns setores da política. Há investigações que foram publicadas, denúncias...
Os próximos passos
Nosso projeto é reforçar a presença política de Fernando Lugo, disse ao Página/12, após a entrevista, um colaborador que pediu para não ser identificado. A análise otimista dos partidários de Lugo indica que Franco não conseguirá impor a ideia de que o responsável pelo eventual isolamento do Paraguai é o presidente derrubado. “Temos isso muito claro, não vemos um perigo nesse tema”, é a opinião geral. Outro ponto considerado pelos dirigentes próximos ao ex-presidente é que, como disse um deles, “virão tempos difíceis para o setor importador e também para o setor exportador”. “Os setores fáticos ficarão em má situação, cada vez pior”, disse. No Paraguai, assim como na Espanha, quando alguém fala dos “poderes fáticos”, está usando a expressão no mesmo sentido que “establishment” é usado na Argentina.
O núncio apostólico foi o primeiro representante diplomático estrangeiro a se reunir com Franco. Em outro setor da Igreja Católica, porém, o monsenhor Melanio Medina, bispo de Missiones e Ñeembucú, ironizou ontem em sua homilia o novo presidente: “Pobre Franco, em que confusão está metido, porque a estrutura parlamentar e capitalista não vai permitir que ele faça nada”. Disse ainda que a destituição foi “um golpe do Parlamento” e que Lugo foi afastado por “querer lutar a favor dos pobres”.
Medina também incursionou na análise diplomática. “No melhor dos casos, mais adiante se acerta a relação bilateral, mas se cortarão o gás e os combustíveis que o país compra da Argentina”, disse. Além disso, atribuiu o assassinato de onze camponeses e seis policiais em Curuguaty à cobiça dos proprietários de terras. Citou Blas Riquelme, dono de mais de 40 mil hectares.
A fronteira da soja se expande frequentemente no Paraguai, assim como ocorre em Santa Fé ou Santiago del Estero (na Argentina), com disparos para amedrontar ou atacar diretamente os pequenos proprietários de terra. Segundo Medina, tanto no Paraguai como na América Latina inteira há dois modelos: “O que busca a igualdade social e o capitalismo que só quer acumular fortunas e que não tem nenhuma preocupação com a situação dos pobres”.
As declarações de Lugo ao Página/12, os comentários de seus colaboradores e o testemunho do bispo Medina parecem marcar a busca, por parte de Lugo, da popularidade que teve em seu primeiro ano de governo, em 2008, e que foi perdendo, apesar das políticas sociais e do aumento do gasto em saúde.
Desde que começou a série de discursos, a maioria de militantes de base, na frente do edifício da televisão pública, a questão da saúde foi uma das mais repetidas entre os argumentos em defesa de Lugo, Neste mesmo lugar, na madrugada de domingo, o próprio Lugo apareceu e ali mesmo houve um indício da política que quer afastar Franco. Também pela madrugada apareceu uma pessoa de uns 35 anos, sorridente, que manifestou desejo de participar das sessões de microfone aberto. Afirmou chamar-se Cristian Saguier e comunicou que era o chefe da nova direção da televisão pública. Anunciou que o governo não suprimiria o programa Microfone Aberto e que estava ali para “celebrar a discussão pública”.
Esse lugar pode ser um dos pontos de observação da política paraguaia. Por um lado, e para além do nível de audiência, mais baixo que o dos canais privados, Franco quer preservar a imagem de um Paraguai democrático, de um país que não incorreu na ruptura da ordem constitucional. Por outro, está embretado pela mesma realidade: mesmo com audiência menor, o programa é uma referência. O resto depende do que Lugo e os setores que o apoiam consigam fazer daqui até as eleições de 2013.
Tradução: Marco Aurélio Weissheimer
Franco também procura agir nestes dois planos, a ponto de dizer ontem que Lugo é a única pessoa que pode evitar o conflito internacional. É uma forma de se referir aos problemas que experimenta o governo pelas crescentes medidas de castigo, começando pela já decidida suspensão do Mercosul. “Te cospem na cara e, ao mesmo tempo, te chamam de lindo”, disse Lugo ao Página/12, comentando a declaração de Franco.
Você percebe que Franco o torna responsável de qualquer represália que o Paraguai receba?
Não são castigos ao Paraguai. Estamos frente a um grande movimento de solidariedade internacional do qual participa teu país. A Argentina é um país irmão, vizinho e muito próximo, que conhecem muito bem a realidade paraguaia.
Retirou Rafael Romá, o embaixador.
Fez o que dentro de sua soberania considerou que seria útil para a liberdade e a soberania de um país que quer a democracia como o Paraguai.
E se a solidariedade se converter em problemas cotidianos, como você reagirá?
Infelizmente, muitos inocentes poderão sofrer as consequências. Eu quero o melhor para o Paraguai. Por isso, rechaçamos o regime.
Na madrugada de domingo, frente ao edifício da televisão pública, você falou de resistência pacífica. Essa será a tática?
Sim. Já começamos a resistência pacífica e não reconhecemos a presidência que se instalou depois do golpe de Estado parlamentar. E começam a surgir as manifestações de cidadãos e cidadãs. Elas crescem, são pacíficas e se expressam contra o que o parlamento decidiu naquela sexta-feira sombria. Também vamos realizar uma reunião de gabinete.
Quando?
Às seis da manhã (de segunda). Participarão dela todos os colaboradores do meu gabinete, quando estávamos no palácio de governo.
Ao se despedir dos chanceleres da Unasul, você disse que voltaria a seu trabalho político junto às bases. Foi o que relatou o chanceler Héctor Timerman ao Página/12.
E já começamos a fazer isso. Vamos unir forças com os movimentos sociais e sindicais.
Sempre dentro da ideia de não-violência?
Sim. Sempre.
Por isso, na sexta, quando o destituíram, teve uma atitude pacífica?
Sim. Nos submetemos ao julgamento político parlamentar e aceitamos o veredito para evitar derramamento de sangue. Somos contra todo tipo de violência e esse dia pressagiava violência e repressão. Hoje, já com o espírito sereno, as manifestações cidadãs são exemplares, o que ser visto nas ruas ou nas transmissões do Canal 13 do Paraguai e como o faz a televisão pública.
É uma forma de ação política que será repetida no interior do Paraguai?
Exato. E estamos serenos para essa tarefa. Esse é o motivo pelo qual a nossa atitude de sexta-feira foi ponderada por muita gente. No Paraguai há muita violência. Na sexta, os mercadores da morte estavam rondando. O julgamento era injusto, descabido e sem argumento, mas era preciso reagir como fizemos. Era a melhor coisa a fazer.
O dinamismo de sua atividade aumentará?
Estamos saindo nos comunicando com a cidadania. Hoje tivemos uma série de reuniões com líderes sociais e políticos. O rechaço crescerá. Estou seguro disso. Haverá uma consolidação do rechaço à presidência que surgiu da destituição.
Franco insiste que o Congresso só aplicou um artigo da Constituição, que fala de procedimentos e não de prazos para o julgamento político do presidente.
Sobre isso, gostaria de destacar o que disse o presidente da Colômbia, Juan Manuel Santos. A ferramenta do julgamento político é válida do ponto de vista jurídico e constitucional, mas os congressistas exageraram na forma.
Os congressistas poderiam dizer que votaram com maioria qualificada.
É um simples acordo de cúpulas feito pelo pelos dirigentes dos partidos tradicionais.
Em sua primeira aparição pública após ter sido destituído, você disse que havia setores políticos vinculados ao narcotráfico. A quem estava se referindo?
Há muitos parlamentares acusados de ter uma grande participação em negócios ilícitos. O narcotráfico está dentro de alguns setores da política. Há investigações que foram publicadas, denúncias...
Os próximos passos
Nosso projeto é reforçar a presença política de Fernando Lugo, disse ao Página/12, após a entrevista, um colaborador que pediu para não ser identificado. A análise otimista dos partidários de Lugo indica que Franco não conseguirá impor a ideia de que o responsável pelo eventual isolamento do Paraguai é o presidente derrubado. “Temos isso muito claro, não vemos um perigo nesse tema”, é a opinião geral. Outro ponto considerado pelos dirigentes próximos ao ex-presidente é que, como disse um deles, “virão tempos difíceis para o setor importador e também para o setor exportador”. “Os setores fáticos ficarão em má situação, cada vez pior”, disse. No Paraguai, assim como na Espanha, quando alguém fala dos “poderes fáticos”, está usando a expressão no mesmo sentido que “establishment” é usado na Argentina.
O núncio apostólico foi o primeiro representante diplomático estrangeiro a se reunir com Franco. Em outro setor da Igreja Católica, porém, o monsenhor Melanio Medina, bispo de Missiones e Ñeembucú, ironizou ontem em sua homilia o novo presidente: “Pobre Franco, em que confusão está metido, porque a estrutura parlamentar e capitalista não vai permitir que ele faça nada”. Disse ainda que a destituição foi “um golpe do Parlamento” e que Lugo foi afastado por “querer lutar a favor dos pobres”.
Medina também incursionou na análise diplomática. “No melhor dos casos, mais adiante se acerta a relação bilateral, mas se cortarão o gás e os combustíveis que o país compra da Argentina”, disse. Além disso, atribuiu o assassinato de onze camponeses e seis policiais em Curuguaty à cobiça dos proprietários de terras. Citou Blas Riquelme, dono de mais de 40 mil hectares.
A fronteira da soja se expande frequentemente no Paraguai, assim como ocorre em Santa Fé ou Santiago del Estero (na Argentina), com disparos para amedrontar ou atacar diretamente os pequenos proprietários de terra. Segundo Medina, tanto no Paraguai como na América Latina inteira há dois modelos: “O que busca a igualdade social e o capitalismo que só quer acumular fortunas e que não tem nenhuma preocupação com a situação dos pobres”.
As declarações de Lugo ao Página/12, os comentários de seus colaboradores e o testemunho do bispo Medina parecem marcar a busca, por parte de Lugo, da popularidade que teve em seu primeiro ano de governo, em 2008, e que foi perdendo, apesar das políticas sociais e do aumento do gasto em saúde.
Desde que começou a série de discursos, a maioria de militantes de base, na frente do edifício da televisão pública, a questão da saúde foi uma das mais repetidas entre os argumentos em defesa de Lugo, Neste mesmo lugar, na madrugada de domingo, o próprio Lugo apareceu e ali mesmo houve um indício da política que quer afastar Franco. Também pela madrugada apareceu uma pessoa de uns 35 anos, sorridente, que manifestou desejo de participar das sessões de microfone aberto. Afirmou chamar-se Cristian Saguier e comunicou que era o chefe da nova direção da televisão pública. Anunciou que o governo não suprimiria o programa Microfone Aberto e que estava ali para “celebrar a discussão pública”.
Esse lugar pode ser um dos pontos de observação da política paraguaia. Por um lado, e para além do nível de audiência, mais baixo que o dos canais privados, Franco quer preservar a imagem de um Paraguai democrático, de um país que não incorreu na ruptura da ordem constitucional. Por outro, está embretado pela mesma realidade: mesmo com audiência menor, o programa é uma referência. O resto depende do que Lugo e os setores que o apoiam consigam fazer daqui até as eleições de 2013.
Tradução: Marco Aurélio Weissheimer
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