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Entrevista – Código Florestal é só ponta do iceberg, avalia João Andrade
João Andrade, coordenador do Programa Governança Florestal do Instituto Centro de Vida (ICV), acredita que o Código Florestal seja apenas um aspecto da luta política que se trava entre ambientalistas e ruralistas pela ocupação e exploração da região amazônica. Segundo ele, essa luta devia acontecer entre ruralistas e todo o povo brasileiro que, infelizmente, assiste de longe e nem sabe direito o que está sendo disputado.
O Código é de 1965. Ele nasceu de uma iniciativa já existente, que era uma regulamentação sobre águas. Nesse ano, no Governo de Getúlio Vargas, um grupo de cientistas e pesquisadores, atendendo a uma demanda política, elaborou uma proposta do código no sentido de que precisava ter uma reserva de madeira, dentro das propriedades. Quem morava na mata atlântica viu como a mata foi destruída rapidamente e isso gerou o início do movimento.
Mas não se falava em ambientalistas ainda, certo?
Já se falava sim, porque alguns desses cientistas vinham da área das ciências biológicas e incorporaram a preocupação ambiental já no código.
Desde 65 até então é esse o Código que vale?
Sim, mas passou por várias modificações.
Influenciado por quê?
Pela necessidade de adaptação.
Sempre no sentido de flexibilizar?
No sentido de torná-lo aplicável. O Código, na verdade, sempre foi muito difícil de ser aplicado.
Por que?
Primeiro por insuficiência do Estado de fiscalizar. Segundo porque precisaria mudar muitos pontos para ser operacional. Além disso, nunca foi aplicado corretamente porque havia, na década de 70, por exemplo, o entendimento do Governo Federal que era preciso derrubar florestas para plantar principalmente nas áreas de fronteira. Então o Governo sempre se fez vistas grossas porque essa é também uma questão de soberania nacional, para ocupar o território.
E o código voltou para a pauta do Congresso de que forma?
Começa a voltar na década de 90 e, nessa época, há um enrijecimento da lei e não uma flexibilização, porque o movimento ambiental vai crescendo e se fortalecendo.
O movimento ambientalista então melhorou o Código?
Melhorou, principalmente depois da Rio 92, em que a pauta ambiental fica muito forte, surgem muitos recursos para a sociedade civil, surgem várias ONGs ambientais. Daí o movimento ambientalista consegue aumentar de 50% para 80% a área de reserva legal, na Amazônia Legal. Como era uma lei que ninguém dava bola, o pessoal estava meio esquecido dessa lei e um grupo de ambientalista resolveu trabalhar nela e no final eles ganharam. O Código sofreu uma série de medidas provisórias ao longo do tempo.
Nunca havia sido reformado em mais de 40 anos?
Sim, ambientalistas vão colocando mudanças em pauta, vão vencendo dentro do Congresso, agindo de forma estratégica.
E quando ficou patente que o Código precisava ser reformado? Isso foi levanto por ambientalistas ou ruralistas, já que essa é a dicotomia mais óbvia?
Houve várias Medidas Provisórias, mais de 50, incluídas no código, até 22 de julho de 2008, que eu considero um grande divisor de águas. Nessa data, é publicada a lei de crimes ambientais, que dá um prazo para que cada propriedade fizesse a regularização ambiental: quem não se regularizasse, em dois anos, ia ter que pagar uma multa diária. Aí é que os ruralistas falam: a gente tem que dar um jeito nessa história, vamos reformar esse negócio, vamos acabar com essa palhaçada.
Aí não ficou melhor para eles nem as vistas grossas do Governo.
Justamente porque tinha uma lei que determinava multa, aí afeta o bolso, a multa não era barata, era por hectares, isso que foi o despertar da onça. Em 2009, 2010, o (Aldo) Rabelo (relator do Projeto de Lei que muda o Código) pega para ele com muito empenho.
Por que ele assumiu isso, qual a ligação dele com seu tema?
Articulação política. ideologicamente ele é uma pessoa muito mais preocupada com a questão familiar do que em atender grandes ruralistas, mas o Código só está sendo reformado por um incômodo dos ruralistas, é para atender grandes ruralistas, isso é claro. As demandas da agricultura familiar não são por mais áreas para plantar mas sim assistência, apoio do Governo, possibilidade de comercialização, ter um preço diferenciado, são essas reivindicações, que em nenhum momento aparecem. Mesmo nessa última versão, não parece uma política definida para agricultura familiar.
Tem como comparar a dinâmica de aprovação do Código com a do zoneamento?
Dá para a gente traçar um paralelo do Código com o Zoneamento na medida que ambos têm peso técnico muito grande, porque estão determinando como vai ser a ocupação daqui par afrente, a gestão dos recursos naturais. Isso exige o aval de biólogos, analistas de solo, economistas. No código, o debate técnico ficou de lado. Quando a SBPC ( Sociedade Brasileira de Progresso para a Ciência) se pronunciou quanto ao tamanho das áreas de mata ciliar e as AAPPS mesmo o Senado que é um coletivo mais aberto a esse tipo de discussão não incorporou o tom da discussão. Então, o embate sempre foi político e para atender os grandes ruralistas e dá para perceber isso muito bem. Você tem um grupo de deputados que representam o lobby ruralista, que é muito forte dentro do Congresso. Tanto é que agora fizeram um marco legal em causa própria e não pensando na comunidade e na sociedade. O debate técnico ficou de lado nos dois casos, tanto zoneamento tanto código, para que uma classe – os ruralistas – fosse atendida.
Mas por que é que o Brasil, sendo compreendido internacionalmente como uma reserva ambiental muito importante, não se comporta como tal?
No Brasil você tem esse link entre o poder político e o econômico, é o que a gente chama de cooptação do poder político pelo econômico, que tem propriedade de terras. Na questão do Código, essas forças estavam combinadas.
O que nós perdemos?
Perdemos em vários pontos (Saiba quais são os 12 vetos aqui). Primeiramente, a Dilma tomou uma decisão política, ela optou por agradar o grupo dos ruralistas.
Mas o que se fala é que ela desagradou os dois lados…
Os ruralistas estão fazendo um pouco de cena. Alguns absurdos ela tirou porque ela é a presidente, que tem que ter uma visão de estadista, pensar em várias coisas, viu que tinha uma pressão popular, 2 milhões de assinaturas, ela viu que tem um evento internacional em que o Brasil vai estar muito exposto (Rio + 20 e Cúpula dos Povos).
A intervenção popular pressionou?
Sim, com certeza, a intervenção popular sempre interfere, porque na verdade o capital do presidente são os eleitores. Já dos deputados não são os eleitores, mas sim os grupos econômicos que financiam campanhas. Tem uma diferença grande. Então, ela tem que olhar para esse indicador.
Mas o que a Dilma vetou?
A isenção das multas, mas tem uma brecha na lei, no próprio Código, para quem afirmar que vai recuperar em cinco anos e começa, fica isento do pagamento da multa, ou seja, dá um certo perdão. Na questão de desmatamento, principalmente nas áreas de APPs, para quem desmatou, a pessoa não precisa mais recuperar, então também houve um perdão. Uma coisa boa é que agora a terra tem que ter algum tipo de vínculo no cadastro ambiental rural se quiser ter crédito agrícola. Isso vai deixar o monitoramento mais eficaz. É um ponto positivo. Já as áreas de topos de morro ficaram de fora e isso foi muito ruim. Uma coisa que tem que ficar clara é que os ruralistas não estão interessados nesse discurso de que o mundo precisa de alimentos e eles são responsáveis. Eles são empresários agrícolas, visam lucro. Mas a gente nem devia pensar em expandir as terras para plantar e sim pensar em tecnologias para plantar com mais eficiência porque terras em abundância já temos. Pensar em aumentar a produtividade com a área.
E agora, como vai tramitar a matéria?
Volta para o Legislativo porque os vetos podem ser derrubados por quem propôs. É a Câmara. Tem uma série de MP que indicam que o Código só vai valer daqui um ano dois anos…O que ela vetou são MPs. Por isso ela não conseguiu atender nem ruralistas nem ambientalistas porque para os ambientalistas ela fez uma lei capenga e para os ruralistas ela vetou os absurdos, que na cabeça deles fazia muito sentido. Por isso talvez de novo o Código não seja operacional.
Esse tramite demora quanto tempo?
Depende do presidente da Câmara ele bota na a pauta ou não.
O que se fala?
Que se quer ganhar tempo até a Rio + 20.
Houve pressão internacional encima da Dilma?
Houve, porque se você pegar o abaixo assinado, 1 milhão e 700 são estrangeiros, e só 300 são brasileiros isso é ruim.
Isso é um sinal de que essa discussão está concentrada dentro de um limite de pessoas?
O grosso populacional está nas cidades. O Código atinge a área amazônica, uma área isolada. O cara que está lá em São Paulo comendo um bife num tá nem aí se a carne é ilegal não tem essa consciência de que aquela carne pode ser ilegal.
Essa discussão ambiental é irreversível, né? Isso vai hegemonizar 3 e o Brasil vai ter que entrar nessa parada né?
A força da população é muito grande é papel das ONgs trazer o povo para essa discussão.
A disputa é internacional?
Sim porque a escassez é grande.
Com certeza, quando a gente vê as grandes obras e o futuro da Amazônia a pressão vai aumentar muito mais e o Código é a ponta do Iceberg. É uma briga entre ruralistas e ambientalistas porque deveria ser uma briga entre ruralistas e o resto da sociedade, as hidrelétricas você tem governo bancos e empreiteiras juntos, é uma foça muito maior e você tem outro lado uma população muito bem domesticada para consumir. Nos próximos anos a ocupação na Amazônia, e as forças muito bem articuladas.
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