terça-feira, 25 de março de 2014

50 anos do golpe militar no Brasil: a resistência

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http://site.adital.com.br/site/noticia.php?boletim=1&lang=PT&cod=79910


[REPORTAGEM] 50 anos do golpe militar no Brasil: a resistência

Mateus Ramos
Adital

Foto: Reprodução"Nós passamos a ter com mais frequência, os chamados discursos relâmpagos, que eram uma ação bem característica do PCBR, a gente fazia assim, determinado local que tinha aglomeração, que havia um esquema armado, um esquema de segurança, uma pessoa que tivesse mais facilidade de oratória, chegava e tinha de 30 a 45 segundos para falar para aquela aglomeração, e dizia o que estava acontecendo no país, que o país estava numa ditadura civil militar, inclusive uma ditadura que também teve a colaboração do governo americano [estadunidense], do Imperialismo americano. A gente tinha que falar isso tudo sinteticamente e dar uma conclusão no máximo em 45 segundos, porque a repressão não brincava...”

Foto: Adital
Quem dá esse relato a Adital é o professor Walter Pinheiro, outro ex-preso político, que, assim como tantos outros, lutou contra a ditadura militar no Brasil. Em sua entrevista, Pinheiro relata, além das torturas, algumas ações que os resistentes praticavam para combater o regime ditatorial brasileiro.Diferente do que ocorreu na ação do golpe militar, o regime em si, teve ampla resistência por parte de diversos grupos em todo o país. Partidos políticos como o PC do B, PCBR (Partido Comunista Brasileiro Revolucionário), PCB (Partido Comunista Brasileiro) e outros grupos formados por estudantes, como a própria UNE (União Nacional dos Estudantes) e a JEC (Juventude Estudantil Católica), fizeram a resistência ideológica e armada contra a ditadura.
De fato, é possível afirmar, segundo o historiador Guilherme Diógenes, da UFC (Universidade Federal do Ceará), que os estudantes tiveram grande parcela de responsabilidade no confronto ideológico contra o regime, muitos deles entravam nos movimentos bastante cedo e por simples curiosidade. "Na época eu era adolescente, estava fazendo o que se chamava de ginasial no Liceu do Ceará. Acredito que era a sétima serie. Eu não tinha nesse período, nesse começo, em 64, eu não tinha assim uma vivencia política. Eu estudava no liceu e me envolvi em algumas atividades, porque na época o Liceu era assim um colégio que puxava manifestações, então eu ia pra essas manifestações, mais pela movimentação, pela curiosidade (...) minha participação mais ativa, já com uma compreensão do que realmente significava aquele golpe e de partir para o combate de militância foi quando entrei na faculdade...”, revela o professor Pinheiro.
Além da resistência ideológica, realizada em grande parte pelos movimentos estudantis, outros grupos também protagonizavam a resistência contra os militares, dentre eles destacam-se o MR8 (Movimento Revolucionário 8 de outubro), os movimentos sindicais, as ligas camponesas etc.
O movimento estudantil

"Os rapazes entravam armados no nosso colégio, nessa época homens e mulheres estudavam em colégios separados, então eles entravam, faziam os discursos deles e na saída nós íamos escoltando eles, como escudos humanos mesmo...” (Maria do Carmo Serra Azul, Cacau)
O movimento estudantil realmente foi o maior contraponto ideológico na época da ditadura. Mesmo após ser proibida, no dia 27 de outubro de 1964, a UNE, atuando na clandestinidade, promovia manifestações, ações de panfletagem e comícios em todas as grandes cidades do país.
"(...). Eu me engajei num grupo que havia na Faculdade chamado Guarda Vermelha, que, apesar do nome, não tinha nada a ver com a Guarda Vermelha da China (...). Com o passar do tempo vieram militantes mais experientes, com uma formação política mais sólida, e esse grupo passou a se denominar MCI (Movimento Comunista Internacional), então ai nossa atividade não foi mais de simples estudos e preparação teórica, a gente já se preocupava com a publicação de obras, atividades de panfletagens em porta de fábrica e, inclusive, a questão da publicação de obras, de autores marxistas, na época havia um número muito reduzido de livrarias que vendia obras de autores marxistas”, relata Pinheiro.
O auge dos protestos se deu após a morte do estudante Edson Luís de Lima Souto, assassinado pela Polícia Militar, no dia 28 de março de 1968, durante um confronto no Centro do Rio de Janeiro. Edson Luís entrou para a história de forma trágica, foi o primeiro estudante morto oficialmente pela ditadura militar.
A morte do rapaz marcou o início de um ano turbulento e de fortes mobilizações contra o regime ditatorial. Centenas de cartazes foram colados na Cinelândia, com frases como "Bala mata fome?", "Os velhos no poder, os jovens no caixão" e "Mataram um estudante. E se fosse seu filho?".
No dia 26 de junho do mesmo ano, ocorreu o manifesto que ficou conhecido como a Passeata dos 100 mil, em alusão ao número superior a 100 mil pessoas que participou do protesto, realizado também na Cinelândia, Centro do Rio de Janeiro. A Passeata, que se deu em consequência da morte de Édson Luis, tornou-se um dos mais significativos protestos no período ditatorial brasileiro.
Foto: ReproduçãoA luta armada

Para Carlos Marighella, um dos organizadores da resistência ao regime militar, chegando a ser considerado o inimigo número 1 da ditadura, as ações urbanas serviam para causar uma tensão política. No livro ‘Manual do Guerrilheiro urbano e outros textos’ ele afirma que essa tensão seria alcançada "levando a insegurança e a incerteza às classes dominantes, desgastando e desmoralizando as forças militares dos gorilas”.
Após a proibição da UNE, muitas lideranças estudantis migraram para outros grupos e partidos políticos. Alguns desses grupos faziam parte de setores mais radicais da esquerda política, e foi daí que surgiu o combate armado, mesmo que de forma clandestina.
As ações se deram tanto nas cidades como no campo. A parte urbana fazia ações, como assaltos a bancos, sequestros de diplomatas e atentados contra autoridades e unidades militares.
O sequestro do embaixador americano
Foto: Jornal do Brasil
Umas das ações mais bem sucedidas foi o sequestro do embaixador americano, Charles Burke Elbrick, realizado pelo MR8 em parceria da ANL (Aliança Nacional Libertadora). O objetivo do grupo, ao qual participou Fernando Gabeira, escritor, jornalista e ex-deputado federal pelo Rio de Janeiro, era exigir a libertação de 15 presos políticos e sua anistia para o México. A ação, que virou um livro e posteriormente um filme, foi bem sucedida, conseguindo a libertação de todos os presos solicitados.

Ações no campo
De todas as ações ocorridas no campo, a mais conhecida foi a Guerrilha do Araguaia. Apesar de o nome ser ‘Guerrilha’, não foi apenas uma, mas uma série de guerrilhas ocorridas na década de 1970.
O movimento, organizado pelo PC do B, pretendia combater o governo militar e implementar o comunismo no Brasil, iniciando o movimento pelo campo. Em sua maioria estudantes, professores e profissionais liberais, os guerrilheiros se estabeleceram em uma região de fronteira entre os Estados de Goiás, Pará e Maranhão, às margens do rio Araguaia-Tocantins.
Os integrantes da Guerrilha discutiam as reivindicações de interesse dos moradores locais, estimulando a consciência política da população e buscando apoio. Além disso, também promoviam treinamentos de guerrilha.
Foto: ReproduçãoEm 1971, o Exército brasileiro descobriu a localização do núcleo guerrilheiro, fazendo a partir daí três investidas contra os rebeldes. Pegos de surpresa, muitos se refugiaram armados na floresta, oferecendo resistência até março de 1974.
Estima-se que participaram em torno de 78 guerrilheiros, sendo que, destes, a maior parte se dirigiu àquela região em torno de 1970. Entre eles estava o ex-presidente do Partido dos Trabalhadores (PT), José Genoíno.
Combate cultural

Hoje você é quem manda
Falou, tá falado
Não tem discussão
A minha gente hoje anda
Falando de lado
E olhando pro chão, viu
Você que inventou esse estado
E inventou de inventar
Toda a escuridão
Você que inventou o pecado
Esqueceu-se de inventar
O perdão
(...)
Quando chegar o momento
Esse meu sofrimento
Vou cobrar com juros, juro
Todo esse amor reprimido
Esse grito contido
Este samba no escuro
Você que inventou a tristeza
Ora, tenha a fineza
De desinventar
Você vai pagar e é dobrado
Cada lágrima rolada
Nesse meu penar
(...)
[Apesar de você – Chico Buarque de Holanda]
Durante a ditadura militar no Brasil, artistas, jornalistas e outros setores da cultura nacional sofreram com a censura aplicada pelos militares. Apesar disso, muitos enfrentavam as consequências e publicavam obras que iam de encontro aos interesses dos militares.
Foto: bahiaempautaGrande parte dos que enfrentaram a censura foi presa ou exilada, e suas produções sumariamente censuradas. Contudo, com muita criatividade, alguns desses artistas conseguiam publicar seus trabalhos, repletos de duplos sentidos, que passavam despercebidos pelos censores, como no caso da música destacada nesta reportagem, de Chico Buarque. Além disso, muitos deles, já conhecidos pelo regime, utilizavam heterônimos, ou seja, publicavam com o nome de outras pessoas para fugir de uma fiscalização mais rígida.

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