sexta-feira, 15 de agosto de 2014

Povo Karajá se reúne para pensar sobre sua cultura

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Povo Karajá se reúne para pensar sobre sua cultura

Durante dois dias, indígenas Karajá estiveram reunidos para proporem ações para o Plano de Salvaguarda das Ritxòkò, suas bonecas de cerâmica.

Por Lilian Brandt Calçavara/AXA
Nos dias 11 e 12 de agosto estiveram reunidos em São Félix do Araguaia (MT) cerca de 60 indígenas da etnia Karajá (autodenominados Iny) para a 1ª Reunião de Articulação para Salvaguarda dos Bens Culturais Registrados do Povo Karajá. A reunião foi promovida em parceria pelo IPHAN (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) e o Museu Antropológico, da UFG (Universidade Federal de Goiás) e contou com a presença de ceramistas, artesãs e lideranças Iny dos estados do Mato Grosso, Tocantins, Goiás e Pará.
Os modos de fazer e as formas de expressão que envolvem a produção das bonecas de cerâmica Karajá foram registrados como um bem cultural nacional em janeiro de 2012. As famosas bonecas de cerâmica, chamadas ritxòkò (na fala feminina) e ritxòò (na fala masculina) são uma importante fonte de renda das famílias Karajá.  Somente as mulheres as fazem, utilizando técnicas tradicionais transmitidas de geração a geração.
Ao reconhecer um patrimônio, o IPHAN se compromete também a apoiar sua continuidade de modo sustentável, utilizando para isso o termo “salvaguarda”. Embora as bonecas de cerâmica tenham sido a referência para o registro do bem cultural, o objetivo da salvaguarda é contribuir para o fortalecimento da cultura Karajá como um todo, como sua língua, suas expressões artísticas e sua cosmologia.
A UFG, que vem trabalhando junto aos Karajá desde 2008, apresentou uma proposta preliminar de salvaguarda das bonecas de cerâmica Karajá, e esteve aberta às sugestões dos participantes da reunião.
O projeto se divide em 4 grandes metas, sendo a primeira voltada à divulgação das ações do projeto nas aldeias e cidades da região, visando a sensibilização das populações do entorno e o envolvimento do povo Iny. A segunda meta trará cursos de extensão ofertados pela UFG. Os temas ainda não foram definidos, mas a comunidade levantou demandas relacionadas à elaboração, gestão e prestação de contas de projetos e associações, além de formação audiovisual. A terceira etapa será de oficinas de valorização e fortalecimento da cultura, incluindo também intercâmbios entre as aldeias. A quarta meta será a publicação de um ou mais livros produzidos pelos Iny.
Representantes da comunidade receberão formação e treinamento para atuarem como parte da equipe executora no projeto, que deverá iniciar em janeiro de 2015, e terá duração de 24 meses.  Para realizar as ações, as 22 aldeias Karajá serão divididas em 6 pólos considerando a proximidade geográfica, havendo ainda um pólo Javaé e um pólo Xambioá, povos que também são Iny.
As ceramistas contribuíram com a reunião contando sobre a dificuldade que têm para realizarem os seus trabalhos. Elas pediram ajuda aos órgãos presentes para que sejam melhoradas as condições de coleta das matérias-primas, produção e transporte da cerâmica.
Para Paulo Moura Peters, do Departamento de Patrimônio Imaterial do IPHAN, esse é apenas um primeiro passo. “A gente tem no Brasil uma riqueza cultural enorme e poucos bens são reconhecidos como Patrimônio Nacional. É muito bom para o povo Iny que as Ritxòkò sejam reconhecidas pelo Estado brasileiro. Isso deve ajudar o povo Iny a conseguir apoios e fortalecer sua cultura”.
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Além da importância políti ca da reunião, esta foi uma oportunidade única de troca entre os Iny de diferentes regiões. Amigos e familiares que não se encontravam há anos ou que até mesmo não se conheciam puderam conversar sobre suas vidas, as situações das aldeias e trocar ideias sobre projetos.

Cultura Karajá: patrimônio nacional

 As pesquisas para identificar e documentar o ofício, os modos de fazer e as formas de expressão que envolvem a produção das Bonecas Karajá foram realizadas nas aldeias Buridina e Bdé-Buré, em Aruanã – GO, e na aldeia Santa Isabel do Morro, ou Hawalò, na Ilha do Bananal – TO. Durante o trabalho de quase dois anos, foram identificadas as matérias-primas, técnicas e etapas de confecção, além dos mitos e histórias narradas pelos Karajá que expressam a rica relação entre seu povo e o rio, a fauna e a flora, as relações sociais e familiares e a organização social.
Aonde um tori (palavra usada pelos iny para designar os não-indígenas) vê um objeto decorativo, o povo Iny vê representações culturais com significados profundos. Tradicionalmente utilizadas como brinquedo pelas meninas, as ritxòkò assumem o papel de reproduzirem o modo de ser Iny, o modo de se pintar, o modo de lidar com diferentes gerações, a estrutura social e familiar. Enquanto brincam com as bonecas ou observam a sua feitura, as meninas recebem importantes ensinamentos e aprendem também as técnicas e saberes associados à sua confecção e usos.
As Ritxòkò têm como inspiração cenas do cotidiano (como mulheres fazendo cerâmica e homens pescando), cenas de rituais (como a iniciação dos rapazes), seres mitológicos, e animais (como tamanduá, veado e tartaruga). Hoje integram o acervo de vários museus no país, são procuradas como objetos de decoração e comercializadas por lojas de artesanato locais, regionais e nacionais.
Imagem em destaque: Ahima
Imagem no texto: Vladimir Kosak (extraído de ISA)

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