sábado, 29 de outubro de 2011

XINGU VIVO PARA SEMPRE

fonte: XINGU VIVO PARA SEMPRE
http://www.xinguvivo.org.br/2011/10/28/nota-publica-sobre-a-ocupacao-do-canteiro-de-obras-de-belo-monte/


Nota pública sobre a ocupação do canteiro de obras de Belo Monte

Publicado em 28 de outubro de 2011
Por Xingu Vivo
O canteiro da Usina Hidrelétrica de Belo Monte foi ocupado no início da manhã desta quinta-feira por cerca de 400 indígenas, pescadores, ribeirinhos e agricultores contrários à construção da obra devido aos graves impactos ambientais e violações de direitos humanos que marcam o processo de licenciamento do empreendimento. A decisão de ocupar o canteiro de obras foi aprovada coletivamente, em assembleia, por 700 representantes de comunidades locais que participaram de um seminário contra Belo Monte realizado esta semana na cidade de Altamira, no Pará.
Os manifestantes notificaram, através de carta e contato pessoal, representantes do Palácio do Planalto e outras autoridades do governo federal sobre a ocupação da usina. Segundo o documento enviado, “diante da intransigência do governo em dialogar e da insistência em nos desrespeitar, ocupamos o canteiro de obras de Belo Monte e trancamos seu acesso pela rodovia Transamazônica. Exigimos que o governo envie para cá um representante com mandado para assinar um termo de paralisação e desistência definitiva da construção de Belo Monte”.
Após 15 horas, o canteiro de obras da usina hidrelétrica de Belo Monte foi desocupado com a chegada de dois oficiais de Justiça e três advogados do consórcio Norte Energia, acompanhados de um destacamento da Policia Militar, munidos de um interdito proibitório ajuizado pela empresa.  Após informar os manifestantes sobre a ordem judicial, que tinha poderes de reintegração de posse, os oficiais de Justiça destacaram que a Tropa de Choque estava nos arredores, pronta para agir.  É vergonhoso que a mesma Justiça, que tem se mostrado cada vez mais morosa e suscetível a pressões políticas no julgamento das 12 Ações Civis Públicas movidas pelo Ministério Público Federal (MPF) contra as ilegalidades e violações de direitos humanos no processo de licenciamento ambiental de Belo Monte, tenha expedido o interdito proibitório favorável à empresa em apenas algumas horas.
A ação inédita de ocupação do canteiro de obras de Belo Monte partiu de uma decisão soberana e autônoma de pescadores e indígenas da Bacia do Xingu, e foi considerada por estes o marco de uma nova aliança na luta contra a hidrelétrica. O reconhecimento mútuo e o acordo firmado esta semana entre os segmentos que mais sofrerão com a destruição do Xingu foi visto como uma nova etapa, mais forte e ampla, da luta contra Belo Monte.  A parceria entre indígenas e pescadores, inédita, mostrou que os povos do Xingu estão unidos em defesa do rio, da natureza e do seu modo de vida tradicional.
A nossa resistência contra este projeto de destruição chamado Belo Monte permanece inabalável. A ocupação foi um recado claro para o governo Dilma Rousseff de que a luta pela proteção do Xingu está mais viva do que nunca. Se o governo federal insistir em continuar violando os nossos direitos, dos povos indígenas e comunidades tradicionais, outras ações de resistência virão.
Altamira (PA), 28 de outubro de 2011.
Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira – COIAB
Comissão Pastoral da Terra – CPT
Conselho Indigenista Missionário – CIMI
Movimento Xingu Vivo para Sempre – MXVPS

zumbi no MS

fonte: revista sina
http://www.revistasina.com.br/portal/movimentos-sociais/item/3269-tribunal-de-justi%C3%A7a-derruba-feriado-pelo-dia-da-consci%C3%AAncia-negra-em-ms


Qui, 20 de Outubro de 2011 09:27

Tribunal de Justiça derruba feriado pelo Dia da Consciência Negra em MS

Por  Silvia Frias, do G1 MS
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TJ/MS acatou ação de inconstitucionalidade da federação do comércio. Procuradoria Geral do Estado disse que não irá recorrer da decisão.


Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul (TJ/MS) considerou inconstitucional a lei que determinou o dia 20 de novembro feriado pelo Dia da Consciência Negra no estado. A ação direta de inconstitucionalidade (Adi) foi julgada nesta quarta-feira (19) pelos desembargadores do Órgão Especial.

A Lei nº 3958, de 31 de agosto de 2010 foi aprovada na Assembleia Legislativa e promulgada pelo presidente, Jerson Domingos. O dia 20 de novembro, foi escolhida por ter sido a data de da morte de Zumbi, líder do Quilombo dos Palmares.

A ação julgada pelo TJ/MS foi impetrada pela assessoria jurídica da Federação do Comércio de Mato Grosso do Sul (Fecomércio). Segundo assessoria do TJ/MS, a argumentação é que a lei estadual que criou o feriado interfere nas relações trabalhistas, que é competência da União.

O relator da ação, desembargador Paschoal Carmello Leandro, julgou procedendo a argumentação e o voto dele foi seguido, por unanimidade, pelos desembargadores que compõem o Órgão Especial, 12 no total.

No ano passado, depois que entrou em vigor, os comerciários tiveram que fechar acordo coletivo para que as lojas pudessem entrar em funcionamento. O presidente do sindicato dos Empregados no Comércio de Campo Grande, Idelmar da Mota Lima, disse que a entidade não irá se manifestar e irá acatar a decisão judicial.

O procurador do estado, Márcio Arruda, explica que a Procuradoria Geral do Estado (PGE) já havia se manifestado pela inconstitucionalidade da proposta, quando o projeto de lei foi apresentado pela primeira vez, na Assembleia Legislativa, em 2009.

Naquele período, Arruda lembra que a Comissão de Constituição de Justiça e Redação (CCJR) da assembleia opinou pelo arquivamento da proposta. O projeto voltou a ser apresentado em 2010 e, desta vez, foi aprovado. A lei não foi sancionada pelo governador André Puccinelli , mas promulgada pela assembleia, entrando em vigor.

Márcio Arruda disse que a PGE não tem intenção de recorrer da decisão, por ter o mesmo entendimento do TJ/MS.

quilombolas da amazônia

fonte - revista sina
http://www.revistasina.com.br/portal/movimentos-sociais/item/3392-amea%C3%A7ados-quilombolas-da-amaz%C3%B4nia-ganham-voz


Sex, 28 de Outubro de 2011 15:51

Ameaçados, quilombolas da Amazônia ganham voz

Por  Jaime Gesisky/Fórum Amazônia Sustentável
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ão bastou terem sido reconhecidas legalmente na Constituição de 1988. As comunidades quilombolas existentes no Brasil padecem ainda hoje da falta de políticas públicas que lhes garantam o modo de vida tradicional. Devido ao seu estilo de vida, ligados à terra, essas comunidades ajudam a preservar parte da florestas brasileiras, sobretudo na Amazônia, onde existem 77 terras quilombolas tituladas. Ali, no meio da floresta, essas comunidades,  invisíveis ao resto do país, sofrem com o avanço de empreendimentos hidrelétricos e minerários. Um livro que acaba de ser lançado pela Comissão Pró-Índio (CPI-SP) rompe o silêncio e ajuda os quilombolas da Amazônia a vocalizar em defesa de seus direitos. A autora da pesquisa que deu origem ao livro Terras Quilombolas em Oriximiná: Pressões e Ameaças, Lúcia de Andrade, coordenadora executiva da CPI-SP, faz aqui uma análise da situação dessas comunidades amazônicas. Boa Leitura!



A impressão, no senso comum, é de que quando se fala de povos tradicionais na região amazônica, falamos apenas de indígenas, ribeirinhos, extrativistas. Qual é o quadro geral dos quilombolas na região? Por que eles padecem de tanta invisibilidade?

De fato, a realidade das comunidades quilombolas no Brasil, e na Amazônia particularmente, ainda é pouco conhecida.  Não contamos sequer com um censo da população quilombola no Brasil. Trabalhamos com estimativas que indicam a existência de cerca de 3.000 comunidades no país. Pode-se dizer que parte dessa invisibilidade e falta de reconhecimento de direitos advenha de ideia comum na nossa sociedade que os quilombos teriam acabado com o fim da escravidão. O que não foi absolutamente o caso: os quilombolas continuaram resistindo e mantendo o seu modo de vida nas terras conquistadas em todas as regiões do Brasil. É bom lembrar que o reconhecimento dos direitos territoriais das comunidades quilombolas é relativamente recente uma vez que se deu apenas na Constituição de 1988. Até essa data, as comunidades quilombolas simplesmente não existiam na nossa legislação e perante o poder público.  Um dos objetivos do livro que a CPI-SP lança agora é justamente é contribuir para dar maior visibilidade às comunidades quilombolas e evidenciar a sua contribuição para a proteção das florestas.

Qual a participação desses povos remanescentes de quilombos na conservação da floresta? 

Na região da Amazônia Legal, encontram-se 77 terras quilombolas já tituladas, o que representa 71% de todas as terras quilombolas já regularizadas no Brasil. São cerca de 630 mil hectares já titulados na Amazônia onde vivem 144 comunidades quilombolas.  As comunidades com terras regularizadas, no entanto, são ainda a minoria. Para ser ter uma ideia, na região da Amazônia Legal temos mais de 400 comunidades com processo para titulação de suas terras tramitando no Incra. O que o estudo indicou foi o alto grau de conservação das florestas nas terras quilombolas. Considerando os oito territórios estudados, verificamos que a área desmatada corresponde a 1% da sua extensão total. Os estudos com imagens de satélite evidenciaram também que as terras quilombolas nesse município da Amazônia formam uma “barreira” ao desmatamento que avança em sua direção.

O estudo revela que as terras desses povos encontram-se sob ameaça. Qual a situação que a senhora encontrou ao fazer a pesquisa?

A pesquisa identificou diferentes ameaças entre elas os interesses minerários: são 94 processos minerários incidentes nas terras quilombolas entre solicitações e processos autorizados. Quatro dos territórios quilombolas têm mais de 70% de sua extensão sob interesses minerários. Nesse momento, não há exploração mineral dentro das terras quilombolas, mas os quilombolas já sofrem os impactos da exploração da bauxita que é realizada em áreas vizinhas aos seus territórios. Outro exemplo de ameaça são os estudos para a construção de 15 empreendimentos hidroelétricos em rios que cortam os territórios quilombolas: 13 deles contam com estudos de inventário; um com estudo de viabilidade e um com projeto básico. Segundo o “Plano Nacional de Energia 2030”, a área total a ser inundada por tais hidroelétricas soma 5.530 quilômetros quadrados abrangendo terras quilombolas, terras indígenas e unidades de conservação.

A ausência de consulta prévia a essas comunidades tradicionais é similar ao que se vê com outros povos da floresta?

Infelizmente essa é a realidade para os quilombolas também. O livro mostra diversas situações em que as comunidades não foram consultadas sobre projetos que lhes afetavam diretamente. Identificamos também consultas que não podem ser caracterizadas como consulta livre, prévia e informada, uma vez que não se garantiu o acesso a toda a informação nem tampouco o tempo necessário para que a comunidade pudesse amadurecer a sua decisão. O governo leva anos para realizar seus estudos e tomar as suas decisões e espera que os quilombolas tomem as suas decisões em uma reunião de poucas horas de duração.

Como é a situação das políticas públicas para os quilombolas da Amazônia – se é que existem efetivamente?

Em nossa opinião não existem políticas públicas para os quilombolas na Amazônia, pensando em políticas mais amplas e duradoras. O que existem iniciativas pontuais que estão longe de atender a demanda dos quilombolas.  O objetivo do nosso estudo foi justamente chamar a atenção para essa lacuna e a importância de se pensar, criar e implantar tais políticas.

Qual a mensagem que o estudo deixa para o Brasil?

Esperamos que o estudo ajude a consolidar o entendimento que a  garantia das terras quilombolas além de ser fundamental para essa população, é também uma estratégia de promoção da conservação dos recursos naturais e da biodiversidade da Amazônia.

Serviço

Para ter acesso ao livro, acesse:
http://www.cpisp.org.br/pdf/Oriximina_PressoesAmea%C3%A7as.pdf

sexta-feira, 28 de outubro de 2011

Código Florestal

fonte - ihu


http://www.ihu.unisinos.br/index.php?option=com_noticias&Itemid=18&task=detalhe&id=48827

28/10/2011
Código Florestal. Análise do relatório do senador Luiz Henrique

O relatório do senador Luiz Henrique, apresentado nessa terça (25/10) na comissão de Ciência e Tecnologia e de Agricultura e Reforma Agrária, mantém o mesmo eixo do projeto aprovado na Câmara dos Deputados, de autoria do deputado Aldo Rebelo.

A avaliação da equipe da Secretaria Operativa da Via Campesina Brasil, 27-10-2011.

Houve algumas modificações na estrutura, deixando o texto mais fácil para vetos presidenciais. Separou-se as questões conceituais das questões de regularização. Mas ficou apenas nisso. Os principais pontos problemáticos continuam no texto:

Anistia

· Serão isentas de recuperação todas as áreas consolidadas até 2008. Nenhuma pena ou exigencia, para quem agrediu o meio ambiente ate 2008. Ou seja, quem está plantando soja transgênica na beira do rio poderá continuar a plantar. É a continuidade da emenda que os ruralistas aprovaram na Câmara, piorando ainda mais o texto do deputado Aldo Rebelo (Artigo 53)

· Garante a manutenção de pastagem em topos de morro e bordas de chapada. (Artigo 54 §1º) A pastagem é um monocultivo que praticado em areas de risco, como topos de montanha e beira de rios, traz muitas consequencias ao meio ambiente.

· Acesso por parte dos grandes proprietários de fundos públicos para recuperar os desmatamentos que fizeram ilegalmente (Artigo 41, inciso VII)

Data para regularização

· O texto aceita o conceito de áreas consolidadas para todo o desmatamento feito até julho de 2008. É inaceitável que os desmatamentos feitos já no século XXI sejam considerados como legítimos! O mínimo aceitável seria considerar a data da última alteração do Código Florestal, que ocorreu em 2001. Não há qualquer justificativa, nem legal, nem científica, para que o ano de 2008 seja colocado como data de corte.

Agricultura Familiar

· Continua tratando igual agricultura familiar e propriedades com 04 módulos rurais. Não trabalhou com um capítulo específico. Nesse sentido, há um acordo construido por todas os movimentos sociais do campo e o movimento sindical, ou seja da Contag, Fetraf e Via Campesina, para apresentarmos uma emenda substitutiva no senado, que cria um capitulo específico, apenas para a agricultura familiar. Esperamos que passe nas próximas comissões.

Latifúndio improdutivo

· O texto considera como área consolidada aquelas que estão paradas, improdutivas, há 10 anos ou menos. Ou seja, além de legitimar o latifúndio improdutivo, o texto possibilita novos desmatamentos, já que com 10 anos a vegetação regenerada já é abundante. (Artigo 3, incisos V e IX)

Copa do Mundo

· O texto libera o desmatamento em Áreas de Preservação Permanente para eventos internacionais e para construção de estádios, aumentando os grandes impactos da Copa do Mundo e das Olimpíadas. (Artigo 3, inciso VIII, alínea b; Artigo 8, §1º)

Áreas de Preservação Permanente

· O texto autoriza o plantio de árvores produtoras de frutos ou outros produtos em áreas de APP, abrindo espaço para a citricultura, as borracheiras etc (Artigo 3, inciso X, alínea i)

· O texto excluí os apicuns e salgados da categoria de APP, justamente as partes dos Mangues onde se desenvolve a predatória indústria da carcinocultura, ecossistema fundamental para a reprodução de inúmeros animais. Regulariza também todas as industrias da carcinocultura que já estejam instaladas. (Artigo 4, §3º; Artigo 53 §1º)

· Novas supressões poderão ser feitas para implantar lavouras, como soja, cana (Artigo 8).

· Reduz a APP de 30 para 15 metros para recuperação nos casos que não forem consolidados. (Artigo 54 §1º)

Reserva Legal

· Permite compensar a reserva legal desmatada dentro do mesmo bioma, possibilitando a criação de desertos verdes imensos, como no caso do estado de São Paulo (tenderá a ser um imenso canavial). Ou seja, o sujeito tem duas propriedades no mesmo bioma, da mata atlantica, por exemplo. Num deles proprio para agricultura ele pode desmatar tudo, e diz que esta conservando o segundo que fica numa encosta, num outro estado.

O texto permite também que terras compradas de agricultores familiares e tenham reservas, sejam usadas para essa compensação. (Artigo 59)

· Mantém a possibilidade de que médias e grandes propriedades possam se subdividir em propriedades de 04 módulos e, com isso, ficarem livres de recompor a Reserva Legal desmatada. Ou seja, mantem a gravidade de que ate 4 modulos (que na amazonia da 500 hectares, nao precisa respeitar a reserva legal de 80% e nem no Cerrado de 40%.;

· Continua permitindo a recuperação da Reserva Legal com 50% de espécies exóticas. Ou seja, as grandes empresas de celulose, podem considerar o monocultivo de eucalipto, como parte da reserva legal... Isso vai abrir brecha para entrada rapida do eucalipto na pre-amazonia e de maranhao, e nos cerrados do Piaui..

Cadastro Ambiental Rural

· Para se regularizar, os grandes proprietários precisarão apresentar apenas um ponto georreferenciado, ficando isento de apresentar o perímetro exato da propriedade. (Artigo 18, §1º)

Mercantilização da Natureza

· Possibilita que grandes proprietários recebam pagamentos por serviços ambientais para manterem a sua obrigação de preservar APP e RL, invertendo totalmente o conceito de função social da propriedade. (Artigo 42)

· Cria a Cota de Reserva Ambiental (CRA), que transforma cada hectare de floresta em títulos que deverão, obrigatoriamente, ser registrados na bolsa de valores. Assim, o capital financeiro transformará nossas florestas em título especulativo! Além do mais, os desmatadores poderão “compensar” as florestas que eram obrigados a proteger comprando na bolsa de valores! (Artigo 46)

· Uma vez comercializada a CRA, o agricultor que se arrepender não poderá retirar sua floresta do sistema financeiro, a não ser que o comprador garanta a aquisição de outra área (ou outra cota). (Artigo 49, §1º)

Silvicultura

· Silvicultura é reconhecida, para fins da Política Agrícola Nacional, igual a agricultura (Artigo 69).

Concluindo, o relatorio do senador Luiz Henrique (PMDB-SC) foi coerente com sua classe, a dos grandes proprietarios de terra. E manteve na essência, o que ja veio da camara dos deputados. Esperamos que agora as comissões de meio ambiente e de agricultura do Senado, mudem essa logica. E na pior das hipoteses, a Presidenta Vete, os artigos mais estafurdios que colocam em risco o meio ambiente do territorio brasileiro, com graves consequencias para toda sociedade, que vive no meio rural e nas cidades.

escravidão

fonte: carta capital


28/10/2011 - 09h41

Escravidão no cerne do capitalismo de ponta


por Clara Roman, da Carta Capital
716 Escravidão no cerne do capitalismo de ponta
Pesquisadora que participou do estudo da OIT sobre o trabalho escravo afirma que esse modo de produção tem ganhado espaço na era da globalização. Foto: Cícero R. C. Omena
O trabalho escravo rural no Brasil é uma das peças que constituem o desenvolvimento do capitalismo de ponta no país. Divulgado na terça-feira 26, um relatório da Organização Internacional do Trabalho (OIT) traçou um perfil dos trabalhadores e empregadores desse processo. Adonia Prado, pesquisadora Grupo de Estudo e Pesquisa Trabalho Escravo Contemporâneo da Universidade Federal do Rio de Janeiro e que participou do estudo, alerta que esse tipo de trabalho, abolido em 1888, faz parte da estrutura do capitalismo avançado e da produção de commoditties atuais.
“Ele é funcional a esse modo de produção globalizado altamente concetrador de renda”, explica Prado. Segundo a pesquisadora, essa exploração vem ganhando espaço no mundo todo e existe, em graus diferentes, em quase todos os países. São empreendimentos de ponta, diz ela, que produzem para exportação. Na cidade, o trabalho escravo também está ligado a grandes marcas, como foi o caso recente com a loja Zara, que comprava roupas de confecções ilegais e escravagistas. “Não é resquício de outros tempos”, diz ela.
O estudo da OIT mostrou que a maior parte dos trabalhadores era negra (18,2%) e parda (62%) e veio do nordeste para as regiões norte e centro-oste, onde acabaram “presos” em fazendas escravagistas. O endividamento e falta de localização – as fazendas são afastadas de centros urbanos e pontos de referência e em regiões estranhas aos empregados – são as principais razões para que os trabalhadores não consigam sair dessa condição. Apesar de não ter visto nenhum capataz nas visitas de fiscalização para a produção do estudo, Prado aponta que documentos de seu grupo de estudos constataram a presença dessa figura, que utiliza a violência como forma de coerção para manter a prisão, em outras visitas feitas.
Na maioria dos casos, o trabalhador é obrigado a comprar comida e equipamento do patrão. Ao final do mês, ele deve mais do que ganhou. “Na maioria dos casos o trabalhador pobre tem um senso moral muito aguçado”, comenta Prado. “E fica
com a consciência culpada; acha que deve ao patrão”, diz ela.
“Vale a pena para os empregadores manter essa condição sub-humana”, diz ela. O empregador, cujo perfil é do homem branco e nascido na região sudeste, considera que o custo final do produto é menor que o do trabalhador que tenha seus direitos protegidos. A pesquisadora explica que até hoje nenhum empregador foi para a prisão por ter propriedades com trabalho escravo, apesar de inúmero julgamentos que já ocorreram. “No máximo pegam pena de prestação de seviços comunitários”, conta ela.
Prado indica que há um movimento de rechaçamento deste tipo de prática. O Ministério do Trabalho disponibilizou em sua página uma lista com 245 empregadores que devem ser evitados tanto na hora de pedir emprego quanto pelos compradores de seus produtos. “Essa indicação faz com que esses empredores percam mercado porque muitas empresas inclusive fora do Brasil deixam de se interessar”, diz ela, que aponta para a criação de dificuldades econômicas para os empreendores como uma das maneiras de se erradicar esse modo de produção desumana.
* Publicado originalmente no site da revista Carta Capital.
(Carta Capital)
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IMPORTANTE!!!! cadastro de empregadores:

http://portal.mte.gov.br/data/files/8A7C816A32B088220132D0A524A87C0C/cadastro_empregadores.pdf

trabalho escravo

fonte: carta maior
http://www.cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=16362&editoria_id=5


Direitos Humanos| 28/01/2010 | Copyleft 

Trabalho escravo está presente em toda cadeia produtiva brasileira

Apesar de o Brasil ser considerado, no âmbito internacional, a vanguarda do combate ao trabalho escravo, a prática está inserida em toda a cadeia produtiva do país. Elemento inerente à reprodução do sistema capitalista, o trabalho escravo é uma das maiores violações de direitos humanos do mundo contemporâneo. Atividade no Fórum Social Mundial discutiu o que falta fazer para erradicar a prática em nosso território.

“Tudo começa com um moço chamado gato, que é um homem que vai a uma cidade com pessoas vulneráveis e chega lá com boas promessas. A pessoa se anima. Eles dizem que o patrão paga a passagem. Quando chega lá, a escravidão já começou. Quando começa o pagamento, vem o desconto da passagem, das ferramentas, do que você precisa comer. Já está tudo no caderno, anotado, e você tem que pagar. Os vigias passam armados na frente do da gente e deixam claro que o ambiente não é tranqüilo.”

O relato acima é de Francisco José dos Santos Oliveira, da Associação dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Prevenção do Trabalho Escravo em Monsenhor Gil, no Piauí. Escravo liberto, Francisco hoje vive no assentamento Nova Conquista, junto com outras 40 famílias de agricultores. Teve sorte de sobreviver a uma das maiores violações de direitos humanos do mundo contemporâneo, e esteve nesta quarta-feira (27) no Fórum Social Mundial para contar sua experiência, numa atividade que buscou fazer do balanço do caminho que o país ainda precisa percorrer para erradicar o trabalho escravo de sua cadeia produtiva.

Segundo levantamento da ONG Repórter Brasil, que integra a Comissão Nacional pela Erradicação do Trabalho Escravo, a produção de gado bovino é a campeã em número de propriedades que utilizam mão de obra escrava no Brasil. Metade das fazendas onde a prática foi registrada por operações do Ministério do Trabalho e Emprego era de gado. Já em relação ao número de trabalhadores libertos nessas operações, a produção da cana ocupa o triste primeiro lugar. Muitas vezes, mais de mil trabalhadores são libertos de uma só vez nas ações dos grupos móveis de repressão.

Hoje, cada uma dessas hipóteses corresponde ao trabalho análogo ao escravo no Brasil: o trabalho forçado, onde a pessoa é obrigada a trabalhar pela força das armas; a servidão por dívida; a jornada exaustiva, quando de alguém, para além da jornada legal, é exigida uma produtividade que o corpo não agüenta; e o trabalho degradante, quando são suprimidas as condições básicas de saúde e segurança. Todas elas são encontradas nas cadeias produtivas brasileiras, e seus produtos chegam a toda a rede de varejo nacional. 

“O trabalho escravo tem crescido no contexto da globalização. Hoje há mais de 12 milhões de pessoas em situação de trabalho forçado no mundo. Na América Latina, são 1,3 milhão. O lucro obtido por esta forma de trabalho ao ano passa de 30 bilhões de dólares, e o custo para os trabalhadores que estão submetidos a esta situação é de mais de 21 bilhões de dólares. Ou seja, apesar de muito poucos Estados nacionais reconhecerem oficialmente a existência do tema, este é um fenômeno mundial, presente na cadeia produtiva de grandes e modernas empresas multinacionais”, afirma Laís Abramo, diretora da Organização Internacional do Trabalho (OIT) no Brasil. 

“A sociedade brasileira está acordando para o fato de que o trabalho escravo contemporâneo não é restrito à atividade rudimentar nos rincões do país. Trata-se de uma atividade sistemática, que perpassa toda a cadeia produtiva e está na mesa de todos os brasileiros. É algo central da organização do próprio mercado de trabalho”, explica Marcus Barberino, juiz do trabalho da 15ª região e coordenador das oficinas jurídicas da Comissão Nacional pela Erradicação do Trabalho Escravo. “Ao contrário do que pensam, o trabalho escravo não é exceção. É termômetro do mercado de trabalho brasileiro, que continua a explorar o trabalhador de uma forma bastante excessiva”, acrescenta.

Referência internacional
De acordo com a OIT, o Brasil é uma referência internacional positiva em relação à luta contra este crime, estando na ponta dos esforços mundiais de erradicação. Há 15 anos o Estado desenvolve políticas de combate à prática. De acordo com os números da Secretaria Especial de Direitos Humanos, durante o governo Fernando Henrique Cardoso, foram seis mil trabalhadores resgatados. No governo Lula, foram 30 mil, como resultado do aumento do enfrentamento.

No entanto, muito ainda precisa ser feito para eliminar em definitivo tal violação de direitos. Um dos maiores desafios no campo legislativo é a aprovação da Emenda Constitucional 438/01, que prevê a expropriação de terras, sem direito a indenizações, onde for encontrada mão de obra escrava. Em 2001, a PEC foi aprovada em pelo Senado, mas até hoje espera a aprovação em segundo turno na Câmara dos Deputados, onde se encontram diversos parlamentares que já figuraram na chamada lista suja do trabalho escravo. 

“Há anos lutamos pela aprovação prioritária da PEC. Mas apesar dos compromissos manifestados, não conseguimos avançar”, relata o senador José Nery, do PSOL/PA, presidente da subcomissão de combate ao trabalho escravo da Comissão de Direitos Humanos do Senado. “O trabalho escravo nada mais é do que um elemento inerente à reprodução do sistema capitalista vigente em nosso país e as forças degradantes de trabalho são algo que se reproduz historicamente desde a colonização. Aprovar a PEC e garantir o confisco de terras sem indenização aos escravagistas contemporâneos corresponde para nós a uma segunda lei áurea”, acredita.

No dia 13 de maio deste ano, um abaixo assinado que já conta com mais de 200 mil assinaturas será entregue ao presidente da Câmara dos Deputados reivindicando a votação da PEC em segundo turno na Casa. O objetivo é aprovar a emenda constitucional ainda no primeiro semestre de 2010. Em fevereiro, será lançada uma Frente Parlamentar de combate ao trabalho escravo no Congresso Nacional. 

No campo jurídico, além de ações de formação e treinamento de juízes, o Ministério Público do Trabalho tem ampliado sua atuação no combate ao crime. Em vez de trabalhar a partir do recebimento de denúncias, como era feito anteriormente, os procuradores agora desenvolvem um trabalho menos reativo, de busca de dados e maior abrangência das ações movidas na Justiça.

“É preciso ir além de uma atuação pontual, em que algumas empresas são acionadas e outras não, já que a violação permeia todo um setor produtivo”, explica Sebastião Caixeta, procurador do trabalho à frente da Coordenação Nacional do Combate ao Trabalho Escravo do Ministério Público do Trabalho. “Também estamos movendo ações de dano moral coletivo, na construção de uma teoria que vem se firmando, com acolhimento da Justiça do Trabalho, que é a imposição de um pagamento pelo dano genérico já causado por essa violação, com os valores sendo revertidos para a classe trabalhadora. Hoje o trabalho escravo não ataca apenas a liberdade individual, mas também a dignidade da pessoa humana. Por isso, merece a repressão criminal, administrativa, trabalhista e civil do sistema de Justiça”, afirma. 

Neste 28 de janeiro, Dia Nacional de combate ao trabalho escravo, a esperança dos ativistas e militantes que participam da décima edição do Fórum Social Mundial em Porto Alegre é acabar com a sensação de impunidade que ainda paira sobre aqueles que praticam o crime, e construir mecanismos que, de fato, erradiquem o trabalho escravo no país. 

“E isso só vai acontecer quando o Brasil realizar a reforma agrária. É algo que passa por uma mudança no modelo de desenvolvimento no país, um modelo não exploratório, que não utilize pessoas como bucha de canhão para obter lucro”, concluiu Leonardo Sakamoto, coordenador da Repórter Brasil.


Fotos: Eduardo Seidl 

comissão da verdade

fonte: carta maior
http://www.cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=16366&editoria_id=5


Direitos Humanos| 28/01/2010 | Copyleft 

As marcas das ditaduras e a revelação dos sobreviventes

O Projeto Direito à Memória e à Verdade organizou, em Porto Alegre, o Seminário "Sobreviventes: Marcas das Ditaduras nos Direitos Humanos”, como atividade paralela ao FSM. Os sobreviventes convidados foram o jornalista Bernardo Kucinski e a atual secretária de Direitos Humanos da cidade do Recife e fundadora do Movimento Tortura Nunca Mais, Amparo Araújo. Não se trata propriamente de saber quem são os torturadores; o sobrevivente e os sobreviventes o sabem. Trata-se de responsabilizar, apoderar-se do sentido, desvelar o que está, ainda, nas trevas.

"Só assim brilha a Revelação
Numa época que Te rejeitou
Teu nada é a única experiência
Que de Ti é permitida”

Gershom Scholem, em “Com um exemplar do Processo de Kafka”

“Uma sociedade com futuro é uma sociedade com memória. Não por conta do nunca mais, não, que eu não acredito nisso. Mas para que a vida em comunidade faça sentido”, disse Lilian Celiberti, na terça-feira (26), em Porto Alegre, pouco antes de Lula pegar o microfone. Lilian Celiberti, militante feminista uruguaia e uma das poucas sobreviventes da Operação Condor, sabe o que essas palavras significam. 

Mas o que elas querem dizer? O que organiza a exigência da memória na vida política de um povo? Por que essas palavras fazem sentido e como se pode traduzir a clareza na face de Lilian Celiberti, quando as pronunciou, para milhares de participantes do FSM?

O Projeto Direito à Memória e à Verdade – Aos que morreram na luta por um Brasil livre – organizou o Seminário “Sobreviventes: Marcas das Ditaduras nos Direitos Humanos”, na tarde do dia 27, como atividade paralela ao FSM. Os sobreviventes convidados foram o jornalista Bernardo Kucinski e a atual secretária de Direitos Humanos da da cidade do Recife e fundadora do Movimento Tortura Nunca Mais, Amparo Araújo. 

Quando Bernardo começou a ler o texto que preparou para a ocasião ficou dolorosamente evidente o quanto essas interrogações acima não são triviais. E exatamente por isso resplandeceram duas exigências, de natureza moral, anti-jornalísticas: não usar um gravador e não tecer anotações num caderno. A melancolia do sobrevivente é, observou Bernardo, incontornavelmente individual e em certa medida irredutível à linguagem. 

Agostinho de Hipona disse que “a morte era um embaraço para a linguagem”. E o desaparecimento, o extermínio, a tortura, a transmissão perversa da culpa e a perpetuação da suspensão do luto são embaraços para o quê ou para quem? Do que se faz essa impossibilidade de consumar o luto e qual a relação desse luto em suspenso com o silêncio que não se pode traduzir? Qual, enfim, é e qual deve ser o destino da culpa?

Bernardo Kucinski é um dos sobreviventes da ditadura militar brasileira que contabiliza, dentre os seus desaparecidos, sua irmã Ana Rosa Kucinski e seu cunhado, Wilson Silva. Ambos, desaparecidos desde abril de 1974, compõem parte do “nada” de Bernardo de que o poema de Gershom Scholem nos fala, a respeito do texto de Kafka. Compõem uma parte que talvez se pudesse chamar de continuidade, de um luto sem termo inicial claro. Ele falou do silêncio de seu pai, o imigrante judeu polonês Majer Kucinski, a respeito de irmãs mortas, uma, num campo de extermínio e outra, pelas forças de ocupação nazista na França. Desta tia descobriu o nome há pouco, disse, sem saber se era casada e como vivia. 

A sobrevivência parece se confundir, nas palavras que Bernardo vai lendo no microfone, com uma posição histórica. A sua mãe, Ester, também silenciara aos filhos que tinha tido toda a família exterminada pelas tropas nazistas na invasão da Polônia. E que seu tio era, junto a ela, o único sobrevivente daquele núcleo familiar desfeito para sempre. Bernardo conta que Ester morreu aos 50, de câncer, mas que tinha morrido mesmo naquele dia em que todos foram exterminados. Aquele dia em que o embaraço da linguagem se tornou um silêncio de décadas. Sobre essas coisas não se falava na sua casa.

O desaparecimento de sua irmã e de seu cunhado foi um episódio inimaginavelmente doloroso para a sua família. E parece ter sido por ocasião deste evento que Bernardo tenha explicitado o fio condutor da memória silenciada, que não aleatoriamente é o mesmo que liga as ditaduras. A culpa que guarda a pretensão da função de um predicado atemporal e intransitivo do sobrevivente foi exemplarmente apresentada, lembrou Berrnardo, em A Escolha de Sofia (William Styron, 1979). Por que o soldado alemão não matou as duas crianças, em vez de pedir à mãe que ela escolhesse, entre o filho e a filha, qual iria morrer? A despeito de quem seja esse sujeito, há um dispositivo que o ultrapassa e que opera, nessa ordem macabra, a perversidade da transmissão da culpa. A transferência da culpa para a vítima e, assim, a perpetuação do sofrimento. O destino da culpa de Sofia é o suicídio, como se sabe. O livro de Styron é obra de ficção; seu argumento, não.

O que está moralmente em jogo na exigência da verdade a respeito dos desaparecidos é o destino que essa culpa deve ter. Porque a exigência da verdade, da punição e da reparação, ao contrário da melancolia, habitam uma dimensão pública, política jurídica, estatal e histórica. 

Amparo Araújo é irmã do militante, desaparecido em 1971, Luiz Araújo. Ela demonstrou como se passa da melancolia confinada e irremediavelmente confinada, ao seu contrário: a ação pública, inegociável, juridicamente consistente, politicamente honrosa, de lembrar e exigir a reparação do Estado. Amparo poderia falar durante horas e dias sobre a sua trajetória e talvez não demonstrasse com a mesma clareza como se dá essa passagem, como quando disse que tinha voltado a ter pesadelos, por ocasião da reação lacaia à criação da Comissão da Verdade. Amparo pôs a mão no peito e disse mais ou menos: “Eu sempre tive uma dor só minha, aqui no meu colo, sabe?”, disse, com a mão repousando sobre o colo. “Pois agora voltou a doer, assim, fisicamente, de novo”. Essa dor deve ser retribuída, como justiça.

Uma das lições mais elementares do direito penal é a de que a conduta criminosa é singularmente imputável. O fundamento dessa exigência de imputabilidade é o pressuposto de que todo criminoso é, antecedentemente, uma pessoa de direitos. Toda punição no âmbito estritamente penal repousa na imputação legítima de uma culpa, feita pela lei e executada pelo Estado de direito. Essa estrutura da operação punitiva não se estende aos crimes do estado, e menos ainda aos crimes contra a humanidade. A humanidade, diferentemente da vítima a, b, c, não deixa de sê-lo, não desaparece enquanto tal da mesma maneira que os indivíduos, não é singularizável. Essas considerações rudimentares de direito talvez possam ser traduzidas com a afirmação já aceita no nosso STJ, por exemplo, de que direitos inalienáveis não prescrevem, a título de combate à indigente tese de aparência jurídica de que os crimes da ditadura teriam prescrito. 

Bernardo deixou claro que sabe quem são os torturadores, e é muito provável que também Amparo e demais vítimas das atrocidades da ditadura brasileira o saibam. A inversão do destino da culpa e a reparação não se situam no âmbito de uma relação comutativa, trivialmente retributiva, entre torturador e torturado, entre carrasco e cadáver desconhecido. O que faz com que, até hoje, pessoas procurem a família de Bernardo para dar pistas falsas da sua irmã, dizendo que ela está viva, morando no Canadá, por exemplo? Por que há o cuidado de reiterar a dor da perda, de cristalizar a angústia, de insistir em semear a hipótese da fraqueza, da frustração, da derrota? Se é a perversidade que explica essa conduta, e certamente o é, ela não é um traço singular, psicológico, qualquer, mas uma ação política. E histórica. 

“Articular o passado historicamente não significa conhecê-lo 'tal como ele propriamente foi'. Significa apoderar-se de uma lembrança tal como ela lampeja num instante de perigo. (...)...também os mortos não estarão seguros diante do inimigo, se ele for vitorioso. E esse inimigo não tem cessado de vencer”(1)

Não se trata de saber; o sobrevivente e os sobreviventes o sabem. Trata-se de responsabilizar, apoderar-se do sentido, desvelar o que está, ainda, nas trevas. Para que a tortura e a corrupção deixem de ser condição ordinária nos procedimentos investigatórios e no interior das penitenciárias. Para que a vida em sociedade faça sentido. Não é, como disse Lilian, para que nunca mais aconteça, exatamente; mas porque as repetições de tragédias e da barbárie nunca careceram de fiadores entusiasmados e eles seguem insistindo na transmissão e perpetuação do sofrimento. 

É para que aquilo que aconteceu faça sentido hoje, na nossa democracia, na nossa memória, no nosso cotidiano irrefletido. O paradoxo de dissolver a culpa e a responsabilidade no pântano das defesas delirantes “anti-revanchistas” se torna: ninguém tem culpa, porque todos são culpados, como lembrou Bernardo, no fim de seu depoimento. Os que tombaram na luta pela democracia só estarão seguros, enquanto mortos, se a democracia for uma experiência permitida. 

(1) Trechos da Tese VI, das Teses sobre o Conceito de História, de Walter Benjamin. In: Aviso de Incêndio – Uma leitura das Teses “Sobre o Conceito de História”, Michel Löwy. Tradução das Teses: Jeanne Marie Gagnebin e Marcos Lutz Müller, São Paulo, SP, Boitempo Editorial, 2005.


Fotos: Eduardo Seidl