domingo, 12 de outubro de 2014

A barbárie nas mídias sociais

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A barbárie nas mídias sociais

Por Walter Pincus em 07/09/2014 na edição 819
Reproduzido do Estado de S.Paulo, 4/10/2014,, tradução de Augusto Calil; título original “A barbárie do Estado Islâmico nas mídias sociais”
 
O Estado Islâmico pratica a barbárie medieval na Síria e no Iraque, mas suas operações globais de mídia são dignas do século 21. O grupo é ativo nas mídias sociais, tem panfletos, revistas semanais ilustradas, outdoors, camisetas, bonés e até escritórios de propaganda na Síria e no Iraque. O Estado Islâmico também expandiu a máquina de mensagens, particularmente depois que os Estados Unidos começaram seus ataques aéreos contra as forças do grupo terrorista no Iraque em 8 de agosto.
A recente produção de vídeos por parte do Estado Islâmico tem sido prodigiosa. As quatro decapitações filmadas com profissionalismo mostrando a morte de dois jornalistas americanos e de um agente humanitário britânico chocaram o mundo. Independentemente do propósito original – supostamente impedir os bombardeios americanos –, elas tiveram como resultado a demanda do público americano por uma resposta imediata contra o Estado Islâmico e o aumento do apoio internacional à decisão do presidente Barack Obama de estender os bombardeios à Síria.
Os vídeos mostrando reféns do EI, com o jornalista britânico John Cantlie, adotam uma abordagem diferente. Neles, o prisioneiro questiona as operações militares do Ocidente contra os muçulmanos. Em dois vídeos de seis minutos, Cantlie descreve a si mesmo como um cidadão britânico abandonado por seu governo e há muito prisioneiro do EI. No primeiro vídeo, Cantlie comenta que o Estado Islâmico negociou a libertação de outros prisioneiros europeus – sem mencionar o pagamento de resgates – enquanto britânicos e americanos se recusaram a fazer acordos. Cantlie critica a intenção dos Estados Unidos e da Grã-Bretanha de atacar o EI, citando o Vietnã e as recentes críticas à invasão do Iraque promovida pelo primeiro governo de George W. Bush.
O vídeo mais recente é encerrado com Cantlie citando o ex-analista da CIA, Michael Scheuer, que foi diretor da primeira unidade da agência para o combate à Al-Qaeda: os radicais islâmicos “estão mobilizados para o combate desde 1979 e seu movimento nunca foi maior, mais popular e mais bem armado do que hoje”.
Campanha
A produção de vídeos do Estado Islâmico desde junho tem sido muito maior do que essas imagens de prisioneiros que ganham atenção. Há vídeos de recrutamento como “Não há vida sem a jihad”, estrelados por combatentes que falam inglês e pedem às pessoas que se juntem ao movimento, e “Rompendo a fronteira”, mostrando equipamentos e prisioneiros capturados na fronteira entre Iraque e Síria, controlada pelo grupo.
Um documentário de 55 minutos intitulado “Chamas da guerra”, alterna entre a sanguinolência horripilante – soldados do Exército sírio obrigados a cavar as próprias sepulturas e fuzilados em seguida – e imagens de um combatente com sotaque americano explicando por que se juntou ao Estado Islâmico. Há também uma cena na qual um jihadista é morto por uma explosão, recebendo elogios do narrador em inglês, dizendo que os que morrem no campo de batalha “e não afastam o rosto até estarem mortos” são os melhores mártires. Um trailer promove um novo jogo de videogame jihadista no qual o objetivo é atirar nas forças americanas e iraquianas.
O Estado Islâmico parece ter aquilo que um analista de espionagem descreveu recentemente como campanha “fantasticamente” bem pensada para conquistar corações e mentes – e recrutas. A equipe de relações públicas do Estado Islâmico leva grande vantagem na guerra de propaganda, de acordo com analistas de espionagem.
A região é bastante receptiva às mensagens contra o Ocidente e, especialmente, anti-EUA. Em meio ao conflito sectário, à desordem política e anos de desigualdades sociais, eles têm se apresentado habilidosamente como portadores de soluções.
Em um discurso do dia 21 feito pelo principal porta-voz do EI, Abu Muhammad al-Adnani, transmitido em árabe e traduzido em muitos idiomas, Obama é chamado de “mula dos judeus”, e o secretário de Estado John Kerry é chamado de “velhote não circuncisado”. Dirigindo-se aos americanos, Adnani diz: “O EI não declarou guerra contra vocês, ao contrário do que seus governos e sua mídia querem fazê-los acreditar”. Ele acrescenta que os EUA vão “pagar o preço” quando sua economia entrar em colapso e “vocês pagarão o preço quando seus filhos forem enviados para guerrear contra nós e voltarem para vocês como inválidos, dentro de caixões ou traumatizados para sempre”.
“Os americanos “vão pagar o preço ao andarem por nossas ruas, olhando para a esquerda e a direita, temendo os muçulmanos. Não poderão se sentir seguros nem mesmo em seus quartos. Vão pagar o preço quando sua cruzada ruir e nós os atacarmos em sua pátria para que nunca mais possam fazer mal a ninguém.” Ele tem mensagens para o Egito, para os sunitas na Líbia, Tunísia e Iêmen, para australianos e canadenses.
As tentativas dos EUA de responder às mensagens desse tipo enfrentam a mesma dificuldade que Washington encontrou na tentativa de criar parceiros democráticos nos governos da região. O novo governo de Bagdá precisa encontrar uma forma de superar as medidas contra os sunitas e curdos do governo anterior para reconquistar o apoio do povo iraquiano. Na Síria, o desafio é ainda maior.
O presidente Obama disse repetidas vezes que cabe aos iraquianos e sírios vencer a batalha militar em seus territórios. O mesmo vale para a guerra de propaganda.
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Walter Pincus é jornalista do Washington Post

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