https://g1.globo.com/politica/noticia/2019/01/08/em-comunicado-a-diplomatas-governo-bolsonaro-confirma-saida-de-pacto-de-migracao-da-onu.ghtml
BBC News: em comunicado a diplomatas, governo Bolsonaro confirma saída de pacto de migração da ONU
Em telegrama enviado a missões no exterior, Itamaraty diz que país não participará de acordo assinado em dezembro e que define diretrizes para acolhimento de imigrantes; para ONG, decisão é 'extremamente lamentável' e não leva em conta situação de brasileiros que vivem no exterior.
Em telegrama emitido nesta terça-feira (8), o Ministério das Relações
Exteriores pediu a diplomatas brasileiros que comuniquem à Organização
das Nações Unidas (ONU) que o Brasil saiu do Pacto Global para a
Migração, ao qual o país tinha aderido em dezembro, no fim do governo
Michel Temer.
A BBC News Brasil teve acesso ao documento em que o Ministério solicita
às missões do Brasil na ONU e em Genebra a "informar, por nota,
respectivamente ao Secretário-Geral das Nações Unidas e ao Diretor-Geral
da Organização Iternacional de Migração, ademais de quaisquer outros
interlocutores considerados relevantes, que o Brasil se dissocia do
Pacto Global para Migração Segura, Ordenada e Regular".
O documento diz, ainda, que o Brasil não deverá "participar de qualquer
atividade relacionada ao pacto ou à sua implementação".
Procurado, o Itamaraty não confirmou a informação até a publicação
desta reportagem. Porém, diplomatas afirmaram à BBC News Brasil em
condição de anonimato que o telegrama está circulando no sistema do
Ministério e chegou aos destinatários.
Nas últimas semanas, o presidente Jair Bolsonaro e o ministro das
Relações Exteriores, Ernesto Araújo, já haviam anunciado no Twitter que o
país deixaria o pacto. Araújo o classificou como um "instrumento
inadequado para lidar com o problema (migratório)", defendendo que
"imigração não deve ser tratada como questão global, mas sim de acordo
com a realidade e a soberania de cada país".
Direitos humanos para migrantes
Negociado desde 2017, o pacto estabeleceu diretrizes para o acolhimento
de imigrantes. Entre os pontos definidos estão a noção de que países
devem dar uma resposta coordenada aos fluxos migratórios, de que a
garantia de direitos humanos não deve estar atrelada a nacionalidades e
de que restrições à imigração devem ser adotadas como um último recurso.
O documento foi chancelado por cerca de dois terços dos 193 países
membros da ONU. Algumas nações poderosas - caso dos EUA, Itália,
Austrália e Israel, entre outros - ficaram de fora por avaliar que o
pacto violava a soberania dos Estados.
O ex-chanceler Aloysio Nunes Ferreira, que representou o Brasil nas
negociações, já havia criticado a ideia de abandonar o pacto.
"A questão (migratória) é sim uma questão global. Todas as regiões do
mundo são afetadas pelos fluxos migratórios, ora como pólo emissor, ora
como lugar de trânsito, ora como destino. Daí a necessidade de respostas
de âmbito global", ele escreveu no Twitter.
Aloysio afirmou ainda que o pacto não "autoriza migração
indiscriminada" e "busca apenas servir de referência para o ordenamento
dos fluxos migratórios, sem a menor interferência com a definição
soberana por cada país de sua política migratória".
Movimentos conservadores simpáticos à candidatura de Bolsonaro eram críticos ao acordo.
Em Bruxelas (Bélgica), um protesto contra o pacto convocado por grupos
de extrema-direita reuniu cerca de 5 mil pessoas e terminou com
confrontos entre manifestantes e forças de segurança, em dezembro.
Migrantes brasileiros no exterior
Para Camila Asano, coordenadora de Política Externa da ONG Conectas, o
abandono do acordo pelo Brasil é "extremamente lamentável".
"Mostra que o governo não está olhando para a totalidade das pessoas
que precisam de proteção", ela afirmou, assinalando que há mais
migrantes brasileiros vivendo no exterior do que estrangeiros no Brasil.
Segundo Asano, ao deixar o acordo, o governo brasileiro não considera
os "muitos brasileiros que vivem em outros países e sofrem pela negação
de direitos básicos".
Ela diz que o pacto exprime um "consenso muito mínimo, mas ainda assim
muito valioso, sobre quais seriam boas práticas para o acolhimento dos
fluxos".
"O Brasil vai minando uma das suas principais credenciais
internacionais: ser um país formado por migrantes e com uma política
migratória vista como referência, o que vinha dando voz potente ao
Brasil nas discussões internacionais sobre o tema", lamentou.
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