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Justiça nega censura de matéria da Repórter Brasil sobre trabalho escravo
Empregador autuado por trabalho escravo pediu retirada de matérias do site; juíza afirmou que reportagens “se limitaram a atestar os acontecimentos daquela época”
A Repórter Brasil ganhou ação na Justiça que garantiu a permanência, no site, de duas reportagens publicadas em 2010 sobre a operação de auditores fiscais do trabalho que acabou colocando o empregador na ‘lista suja’ do trabalho escravo. Na decisão, a juíza Leonor Severo, do Tribunal de Justiça do Paraná, afirma que “as reportagens se limitaram a atestar os acontecimentos daquela época, cujo conteúdo, aliás, tem inegável caráter público e, portanto, jornalístico”.
O autor da ação, Wilson Dissenha, é diretor-presidente da Madepar Indústria e Comércio, cujas fazendas no interior do Paraná foram fiscalizadas em 2010 e onde foram encontrados 67 trabalhadores condições análogas à escravidão. Entre as vítimas, cinco eram adolescentes com menos de 18 anos. Barracões de madeiras e até um contêiner improvisado abrigavam parte dos empregados. Não havia camas ou colchões suficientes para todos e alguns trabalhadores dividiam a mesma cama.
No ano seguinte à fiscalização, em 2011, o nome da empresa e do diretor-presidente foram incluídos na ‘lista suja’ do trabalho escravo. Ambos recorreram à Justiça do Trabalho para sair do cadastro e foram retirados da lista em novembro de 2012 por determinação da Justiça.
Com a retirada de seu nome da ‘lista suja’, Dissenha recorreu mais uma vez ao Judiciário, desta vez pedindo que a Repórter Brasil retirasse de seu site as duas reportagens. O autor afirmava que os textos continham “menções depreciativas e inverídicas”, além de gerar “incomensuráveis prejuízos, pois ostentam a pecha de maus empregadores e praticantes de delitos, quando nenhuma mácula pende”. O empresário também afirma, na ação, que as reportagens ferem o direito à privacidade, à personalidade e ao “esquecimento”.
A juíza, no entanto, ao proferir decisão contrária ao empresário, argumentou que a retirada de menção a ele na ‘lista suja’ não quer dizer que o seu nome nunca tenha entrado no cadastro. “A exclusão da empresa autora da lista em questão não afasta o fato de que naquele período tinha sido incluída.” Além disso, a juíza acatou argumentos da Repórter Brasil de que a Constituição não permite censura de “reportagens que, ao dispor de informações públicas e verdadeiras, incomodem” e que retirar conteúdo on-line é o equivalente a mandar destruir arquivos físicos de veículos de mídia impressa.
“A sentença foi muito importante para garantir a visibilidade do tema e para que o passado não seja apagado e esquecido”, afirma o advogado André Ferreira, do Coletivo de Advocacia em Direitos Humanos (CADhu).
Resgate de trabalhadores
A ‘lista suja’ do trabalho escravo é uma base pública de dados criada pelo governo federal em novembro de 2003 e atualizada a cada seis meses desde então. O cadastro expõe empregadores responsabilizados por condições análogas à escravidão a partir de resgates de trabalhadores. Antes de entrar no cadastro, empregadores têm direito de se defenderem em duas instâncias administrativas no Ministério da Economia. Permanecem por, no mínimo, dois anos, a menos que se comprometam a cumprir uma série de compromissos através de um acordo com o governo – nesse caso, ficam em uma lista de observação por um ano.
É comum, entretanto, que empresas recorram à Justiça do Trabalho para pedirem a retirada do nome da ‘lista suja’. E tentem na Justiça comum a censura da matérias jornalísticas.
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