A Comissão Pastoral da Terra, CPT- MT vem através desta denunciar e cobrar providências
frente à violência sem limites praticada pelos grileiro de terras Marcelo Bassan contra 100 famílias,
produtoras rurais, no município de Novo Mundo, Gleba Nhandú, terras públicas da União e a
omissão do Estado, frente a esta realidade.
No dia 01 de outubro, do corrente ano, as 100 famílias que buscam serem assentadas há mais
de oito (8) anos obedeceram a ordem de despejo e se retiraram da área em litígio, Fazenda Araúna,
ficando acampadas na beira da estrada, deixando suas plantações e casas.
No último dia 04, logo cedo, as famílias avistaram do acampamento sinais de fumaça,
dirigindo-se à área constataram que 80 casas de madeira, de onde foram despejadas, haviam sido
queimadas e a igreja demolida, e conseguiramflagrar um jagunço ateando fogo. Em flagrante, o
conduziram até a delegacia de Guarantã do Norte para que o crime fosse apurado. Nesse momento o
fazendeiro Marcelo Bassan, mandante do crime, chegou até a delegacia, intimidando seu funcionário
para dizer que tinha sido sequestrado. Representantes das famílias foram ouvidos pelo delegado
Hércules, de Itaúba, assim como o fazendeiro e seu jagunço, contudo, sem nenhuma justificativa o
delegado se negou a repassar o Boletim de Ocorrência para as famílias, atitude suspeita e totalmente
arbitrária.Com isso, até o momento as famílias não sabem, se de fato o B.O foi lavrado e o que foi
escrito.
As casas foram queimadas antes do término de cumprimento da decisão liminar concedida
pela juíza da Vara Agrária, na qual consta que “NÃO PODE HAVER
DEMOLIÇÃO/DESTRUIÇÃO”, ou seja, a decisão judicial proíbe que as casas, plantações e demais
benfeitorias sejam destruídas.
E a violência sofrida pelas famílias não para por aí. No último dia 9 - sexta feira -, algumas
lideranças do grupo estavam transitando na estrada ao lado da fazenda e foram abordados e
ameaçados por oito (8) homens fortemente armados com carabinas calibre 12, bem como com
revolveres 38 e pistolas, que se identificaram como Policiais Civis, dizendo que estavam fazendo a
segurança da fazendo por ordem judicial e que se os mesmos entrassem na fazenda a ordem era de
‘atirar’.
No caminho da cidade de Guarantã do Norte, essas lideranças encontraram uma viatura da
Polícia Civil com 2 policiais, sendo uma mulher. Perguntaram se os mesmos estavam indo para a
Fazenda Araúna (local do conflito) e os mesmos disseram que sim. Com isso o grupo relatou o
ocorrido, relatando aos policias das armas e calibres que os homens estavam portando. Contudo,
segundo relato dos acampados, os policiais conversaram com os homens armados, na entrada da
fazenda e nada fizeram.
A policial que estava na viatura a caminho da área do conflito, frente à notícia de que o grupo
iria à delegacia para lavrar o boletim de ocorrência da ameaça de morte, os orientou a não ir porque o
delegado estava ‘por aqui’ com sem terra e que o mesmo não ia lavrar nenhum boletim sobre a
Fazenda Araúna.Mesmo assim o grupo foi até a delegacia de Guarantã, e de fato, o delegado se
negou a registrar o boletim de ocorrência do crime de ameaça de morte.
Frente à negativa dirigiram-se então a 2ª Cia da Polícia Militar e lavraram o BO nº.
2015.301617, relatando os fatos ocorridos. Com isso, na tarde do dia 10, 2 policiais militares
chegaram ao acampamento das famílias dizendo que tinham ido ver como estava a situação, os
acampados e acampadas relataram que todos os dias eles ouvem disparos de armas e que os jagunços
rondam o acampamento. Os policiais mostraram as fotos de alguns suspeitos, das quais os presentes
reconheceram que pelo menos dois (2) estavam fazendo pistolagem na fazenda. Mesmo frente a estas
informações os policiais voltaram para a cidade sem nada fazer.
A violência praticada por este grileiro contra as 100 famílias, bem como a omissão do Estado,
inclusive ao se negar a registrar os Boletins de Ocorrência que comprovam a violência sofrida pelas
famílias, foi denunciada no relatório Estadual de Direitos Humanos 2015 (p. 57/59), relatório este
feito todos os anos pelo Fórum Estadual de Direitos Humanos e da Terra de MT – FDHT.
A violência continua intensa no local. Agentes pastorais ao visitarem estas famílias por dois
dias ouviram disparos de tiros a todo instante, além de verem os jagunços rondando o acampamento
fortemente armados, tanto de dia, quanto a noite, inclusive na manhã do último domingo, enquanto
celebravam com as famílias, tiros eram ouvidos, deixando todos e todas em situação de desespero e
pavor.
A área em litígio é requerida pela Advocacia Geral da União, AGU, posto que o referido
grileiro se apossou ilegalmente de mais de 14 mil hectares da denominada Fazenda Araúna. E como
já é proprietário de terras no estado de Mato Grosso do Sul, a AGU demonstra que tal
detentor/grileiro não tem direito de regularização fundiária.
Essa violência sofrida cotidianamente pelas famílias e ao estado de direito, e que se
intensificou de uma forma bárbara nos últimos dias, poderia ser resolvida com a decisão no processo
que tramita na Justiça Federal de Sinop, de retomada da área para a União,que está na mesa do Juiz
Murilo Mendes, contudo o mesmo, após ter ficado com o processo concluso por 40 dias para
sentença, o devolve no dia 13 do corrente ano, sem nenhuma decisão. Com isso o conflito tende a se
intensificar ainda mais.
Com bastante preocupação expomos dois sérios problemas:
A violência tem sido o modus operandi dos fazendeiros para garantir a grilagem das terras e a
expropriação das famílias. Não sem motivo o Mato Grosso é um dos Estados mais violento do
país, estando o Estado direta ou indiretamente responsável por tais situações;
As demandas na Justiça Federal, onde já foi comprovado que as terras são da União, com
ação da AGU para a retomada das terras públicas, de nada vale frente à determinação do
judiciário local que, insistentemente, tem favorecido os fazendeiros e emitidos diversas
liminares de despejos em áreas da União.
Diante disso, perguntamos: A Quem as Famílias devem recorrer? Essas liminares de despejo
levam em consideração a Função Social da Terra? Ou aos interesses do crime organizado e armado
de grileiros?
Mais uma vez afirmamos a responsabilidade do Estado e do poder judiciário, tanto na
esfera Estadual como na Federal,na perpetuação dessa violência e esperamos, URGENTEMENTE,
que medidas sejam tomadas para garantir a vida dessas 100 famílias, expostas há anos à barbárie de
um fazendeiro e à omissão do Estado.