segunda-feira, 26 de agosto de 2013

Síria: sinais de uma nova intervenção ocidental

carta maior
http://www.cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=22561

Internacional| 25/08/2013 | Copyleft 

Síria: sinais de uma nova intervenção ocidental

O esquema atual do conflito na Síria pressagia uma nova intervenção ocidental. O deslocamento de navios norte-americanos e a posição da França antecipam uma participação talvez mais direta do que aquela que se conhece até hoje, ou seja, o fornecimento de armamentos aos rebeldes e treinamento militar. Resta saber a posição que adotará a Rússia frente às sirenes cada vez mais próximas de uma nova cruzada ocidental. Por Eduardo Febbro, de Paris

Paris – Sem acusar a uma das partes em conflito na Síria, a ong francesa Médicos sem Fronteiras (MSF) forneceu hoje a primeira prova independente sobre o emprego de armas químicas nos arredores de Damasco. Sem que tenha sido comprovado até agora por uma fonte neutra, a oposição síria denunciou na última quarta-feira que o regime de Bachar Al-Assad realizou um ataque de grande envergadura com armas químicas na região de Damasco com um saldo de 1.300 mortos.

A Médicos sem Fronteiras apresentou neste sábado um quadro preciso das pessoas que atendeu neste dia.. Segundo a ong, “355 pacientes com sintomas neurotóxicos” morreram nos hospitais onde trabalho o pessoal da MSF. A organização afirmou que “três hospitais situados na administração de Damasco ajudados por Médicos Sem Fronteiras receberam no dia 21 de agosto e em menos de três horas cerca de 3.600 pacientes com sintomas neurotóxicos”. Entre os 355 mortos, há 54 crianças e 82 mulheres.

A MSF não se pronunciou sobre os responsáveis, só constatou os efeitos dos gases. Bart Janssens, diretor de operações da organização, disse que “os sintomas apresentados como o excesso de saliva, pupilas contraídas, visão borrada, dificuldades respiratórias e o esquema epidemiológico, caracterizado pela afluência massiva de pacientes em um curto lapso de tempo, a proveniência dos pacientes e a contaminação dos socorristas e do pessoal que prestou os primeiros socorros, tudo isso sugere a exposição massiva a um agente neurotóxico”.

O ministro francês de Relações Exteriores, Laurent Fabius, incriminou diretamente as autoridades sírias: “todas as informações que dispomos convergem para dizer que houve uma matança química perto de Damasco e que ela foi patrocinada pelo regime de Bachar Al-Assad”.

A oposição síria denuncia há vários meses o uso de armas químicas na guerra, uma acusação que o governo sírio rechaça com o contra-argumento de que são os rebeldes que estão utilizando tais armas. Em março passado, dois jornalistas do Le Monde trouxeram da Síria as primeiras provas tangíveis da existência dessas armas no conflito. Essas provas foram analisados por laboratórios independentes que confirmaram a presença de elementos tóxicos mortais. Depois, em duas outras ocasiões, pode-se constatar o recurso aos gases tóxicos. Na última quarta-feira, o exército sírio lançou uma ofensiva na região de Ghuta oriental e em Muadamiyat al-Cham, dois setores localizados na periferia de Damasco e controlados pelos rebeldes. A oposição síria denunciou a morte de 1300 pessoas e o uso de armas tóxicas.

O governo de Damasco desmentiu categoricamente essa informação. Os rebeldes, porém, apresentaram imagens espantosas desse ataque. Desde a semana passada, nenhum representante de alguma entidade independente pode entrar no setor para corroborar as afirmações dos rebeldes sírios. Toda vez que estes acusam o governo de usar armas químicas, as autoridades dirigem as acusações contra eles. Angela Kane, representante da ONU para o desarmamento (Unoda), já está em Damasco negociando com o regime o acesso dos inspetores da ONU às zonas afetadas pelas armas químicas. “É preciso fazer um estudo imediato, exaustivo e imparcial”, disse Kane.

Uma boa parte do problema reside na credibilidade dos argumentos de ambas as partes e na veracidade das imagens distribuídas pelos rebeldes. As que circulam desde o dia 21 de agosto são as mais massivas e eloquentes que existem até agora sobre o uso de armas químicas nessa guerra. Essas imagens mudaram o curso do conflito, de várias maneiras. Em primeiro lugar, o presidente norte-americano, Barack Obama, disse que o ataque com gases tóxicos denunciado pelos rebeldes “requer a atenção dos Estados Unidos”. 

Washington moveu nas últimas horas suas peças militares. A Marinha dos EUA começou a aumentar sua presença no Mediterrâneo mediante o deslocamento de um quarto navio de guerra, o USS Mahan. Esse navio conta com os mísseis de cruzeiro Tomahawak, decisivos para realizar ataques pontuais. Em segundo lugar, e pela primeira vez desde que governo e oposição da Síria trocam denúncias, o Irã, principal aliado de Bachar Al-Assad, reconheceu formalmente o emprego de armas tóxicas no conflito. O presidente iraniano, Hassan Rohani, disse: “Na Síria, muitos inocentes ficaram feridos e sofreram o martírio dos agentes químicos, e isso é lamentável. Condenamos total e firmemente a utilização de armas químicas. A República islâmica aconselha a comunidade internacional a exercer toda sua influência para impedir o uso dessas armas em qualquer lugar do mundo”. O presidente iraniano não acusou os rebeldes, o que foi feito pelo porta-voz da chancelaria iraniana: “há provas de que grupos terroristas realizaram essa ação”, disse Abbas Aragchi.

A guerra na Síria começou com a revolta que estourou em março de 2011, sendo seguida pela repressão e pela militarização da oposição. Segundo a ONU, o conflito já deixou um saldo de 100 mil mortos e provocou o êxodo de vários milhões de sírios. O esquema atual do conflito pressagia uma nova intervenção ocidental. O deslocamento de navios norte-americanos e a posição da França antecipam uma participação talvez mais direta do que aquela que se conhece até hoje, ou seja, o fornecimento de armamentos aos rebeldes e treinamento militar. Resta saber a posição que adotará a Rússia frente as sirenes cada vez mais próximas de uma nova cruzada ocidental.

Tradução: Marco Aurélio Weissheimer

Nenhum comentário:

Postar um comentário